Entre 1914 e 1918, milhões de europeus, asiáticos, africanos, americanos e australianos participaram de uma guerra de enormes proporções. Esse conflito foi chamado pelos estudiosos de Primeira Guerra Mundial. Pela primeira vez uma guerra generalizada envolvia as maiores potências de diversas regiões do planeta, embora o principal cenário de batalhas fosse o continente europeu.
No Brasil, um dos maiores problemas causados pela guerra foi a dificuldade para importar produtos industrializados. Com as batalhas e os bloqueios navais, ficou muito difícil adquirir bens da Europa ou dos Estados Unidos. Assim, a alternativa foi substituir as importações, produzindo no Brasil o que antes era trazido do exterior. Por isso, um dos efeitos da Primeira Guerra Mundial em nosso país foi o estímulo à criação de indústrias.
SITUAÇÃO CONFLITUOSA: AS TENSÕES EUROPEIAS NO COMEÇO DO SÉCULO XX
No início do século XX havia um certo clima de tensão e rivalidade entre os governos e os empresários das grandes potências europeias, como Alemanha, Inglaterra e França. Esse clima vinha das disputas territoriais por colônias - intensificadas no século XIX - e por mercados na Europa, África, Ásia e América Latina.
|
Mapa da partilha da África pelas potências europeias durante a Conferência de Berlim, realizada entre 1884 e 1885. |
Os empresários buscavam novos consumidores para seus produtos, num momento em que novas técnicas de produção permitiam às indústrias fabricar cada vez mais mercadorias em menos tempo. Isso levou o governo dos países industrializados a disputarem colônias na África e na Ásia, onde pretendiam impor aos povos conquistados o consumo de bens europeus industrializados.
Ao mesmo tempo, governo e empresários de cada país industrializado procuravam dificultar a expansão econômica dos países rivais, fechando seu próprio mercado a produtos estrangeiros e tentando impedir a ampliação dos impérios coloniais dos concorrentes na África e na Ásia. Essa disputa econômica foi intensa, principalmente entre franceses, ingleses e alemães, na virada do século XIX para o XX.
|
Os domínios colonias no continente asiático |
Nessa época, a maioria dos exércitos nacionais se profissionalizou, ou seja, os soldados começaram a ser treinados para lutar, a conhecer melhor os armamentos, seguindo a carreira militar por muitos anos. Os generais passaram a exigir que os governos recrutassem cada vez mais soldados, alegando a existência de muitos perigos e ameaças externas. Calcula-se que mais de 65 milhões de soldados tenham sido mobilizados para lutar na Primeira Guerra.
DIVERGÊNCIAS E NACIONALISMOS
Além da grande rivalidade por mercados, franceses e alemães estavam envolvidos em ressentimentos desde 1870, devido à derrota dos franceses na Guerra Franco-Prussiana. Era o chamado revanchismo francês, que pretendia recuperar os territórios da Alsácia-Lorena (ricos em minério de ferro e carvão), os quais haviam sido entregues aos alemães pelos acordos de paz de 1871.
|
Mapas da França e da Alemanha, com destaque para as regiões da Alsácia-Lorena |
Além das disputas por territórios e pelo domínio de mercados consumidores, havia também os movimentos nacionalistas. Os participantes desses movimentos pretendiam agrupar em um mesmo Estado povos de raízes culturais semelhantes, o que levou a um desejo de expansão territorial. Entre os movimentos nacionalistas que se desenvolveram na Europa no início do século XX, destacaram-se o pan-eslavismo e o pangermanismo. Apoiados pelos governos russo e sérvio, os pan-eslavistas queriam unir todos os povos eslavos da Europa Oriental. Já os pangermanistas pretendiam anexar à Alemanha os territórios da Europa Central onde viviam minorias germânicas.
|
Mapa da Europa antes da Primeira Guerra Mundial |
Uma das características dos movimentos nacionalistas desse período era o militarismo. O clima de rivalidade originou uma situação chamada de paz armada, em que, diante do risco de guerra, as potências estimularam a produção de armas e fortaleceram as suas forças armadas. Esse processo representou o início de uma corrida armamentista.
CONFRONTOS NOS BALCÃS
Os governos dos impérios Russo e Austro-Húngaro enfrentaram situação semelhante no início do século XX. Ambos adotavam políticas de produção acelerada de armamentos para manter suas fronteiras e a condição de potências militares diante dos estrangeiros e também das minorias que habitavam seus territórios - como poloneses, tchecos, eslovacos, croatas e sérvios.
|
Mapa étnico do Império Austro-Húngaro |
Os russos preocupavam-se em manter uma saída para seus navios mercantes e de guerra pelo mar Negro. Devido as afinidades culturais - principalmente religiosas - julgavam-se protetores dos povos eslavos e cristãos ortodoxos da península Balcânica, muitos dos quais viviam sob o domínio dos católicos austro-húngaros ou dos muçulmanos turcos.
Com o apoio dos russos, os sérvios pretendiam formar a Grande Sérvia, país que abrangeria, além desse povo, croatas, bósnios e os demais eslavos que viviam nos Balcãs. No entanto, era preciso enfrentar o poder dos austro-húngaros e dos turcos.
|
Mapa do Império Russo até 1914 |
O Império Otomano, que fora uma grande potência até o século XIX, passava por um declínio acentuado no início do século XX. Derrotado pelos italianos, havia perdido territórios no norte da África (a atual Líbia transformada em colônia italiana em 1911). Diante da fraqueza das forças turcas, povos dos Balcãs uniram-se para expulsar os turcos dos territórios que ainda ocupavam na península. Com o apoio do governo russo, búlgaros, sérvios, gregos e montenegrinos formaram a Liga Balcânica e em 1912 entraram na guerra contra os turcos. Vencidos, estes mantiveram sob seu domínio na Europa, apenas alguns territórios em torno de Istambul.
|
Mapa do Império Otomano na Europa |
POLÍTICA DE ALIANÇAS
Os governos das grandes potências fizeram alianças entre si com o objetivo de somar forças para enfrentar os rivais. Depois de muitas negociações, a partir de 1907 a Europa ficou dividida em dois grandes blocos. As forças da Alemanha, Áustria e Itália formaram a Tríplice Aliança ou aliança das potências centrais, apoiadas pelos turcos e búlgaros logo após o início das batalhas. Do outro lado, a Tríplice Entente era formada por França, Inglaterra e Rússia, engrossada por sérvios, belgas, gregos e romenos.
Conforme os interesses, em certos momentos essas alianças sofreram alterações, pois algumas forças mudaram de lado. Exemplo disso foi o governo da Itália, que em 1915 (após o início da guerra) passou para o lado da Entente depois de receber promessas de compensações territoriais
|
Alianças durante a Primeira Guerra Mundial |
As tensões entre os dois blocos foram aumentando. Qualquer incidente detonaria uma guerra generalizada.
COMEÇAM OS CONFLITOS ARMADOS: AS NOVAS FORMAS DE DESTRUIÇÃO
Fortalecido após a vitória contra os turcos, o governo da Sérvia procurava unificar os eslavos na península Balcânica, buscava uma saída para o mar e dificultava os planos austro-húngaros de expansão naquela região. Para isso, os sérvios contavam com um exército de cerca de 200 mil homens e o apoio russo. Diante dessa situação de confronto, uma guerra poderia estourar a qualquer momento.
O estopim da Primeira Guerra Mundial, ocorreu em 28 de junho de 1914, quando o arquiduque Francisco Ferdinando, herdeiro do trono austríaco, foi assassinado em Sarajevo. Essa cidade era a capital da Bósnia e da Herzegovina, províncias que haviam sido anexadas ao Império Austro-Húngaro em 1878, contra as pretensões pan-eslavistas.
|
Francisco Ferdinando e sua esposa, a Condessa Sofia, em Sarajevo momentos antes de serem assassinados. |
O autor do crime foi o estudante Gravrilo Princip, membro da organização Unidade ou Morte, apoiada pelo governo sérvio e ligada ao governo russo. Com o assassinato, os austro-húngaros declararam guerra contra os sérvios. Devido à política de alianças, as forças militares de muitas outras nações também entraram no conflito, começando pelas da Alemanha e da Rússia. Entre julho e agosto de 1914, os governos que compunham a Tríplice Entente e a Tríplice Aliança declararam guerra uns aos outros.
|
Gravrilo Princip - assassino do arquiduque Francisco Ferdinando |
O FASCÍNIO PELA GUERRA E OS NOVOS ARMAMENTOS
No início dos conflitos, em agosto de 1914, parte da população europeia viveu uma espécie de fascínio, um clima de entusiasmo descrito em livros de ficção ou de memórias, filmes e fotografias. Em muitos lugares, multidões se reuniam nas praças e nas estações de trem onde os soldados embarcavam, para demonstrar seu apoio à guerra e às forças armadas de seus países. Em muitos lugares, quem se declarasse contra a guerra era apontado como traidor da pátria. Poucas pessoas pareciam ter consciência do poder de destruição dos novos armamentos e das dificuldades que uma guerra traria para a vida de todos.
As novas armas usadas nos combates terrestres da Primeira Guerra Mundial, como metralhadoras, lança-chamas e projéteis explosivos, provocaram milhões de mortes. Além disso, pela primeira vez aeronaves (aviões e dirigíveis), tanques (veículos blindados fortemente armados) e submarinos foram usados como recursos militares, ampliando as possibilidades de ataque e o poder de destruição.
|
Exército britânico utilizando uma metralhadora Vickers |
Os alemães introduziram a novidade do gás venenoso. Mas o uso indiscriminado desse produto causou tanta indignação que um acordo chegou a ser assinado, anos depois do final da guerra, proibindo esse tipo de arma. Nem por isso a guerra química deixou de existir. Um exemplo disso foi a Guerra do Vietnã, quando soldados norte-americanos lançaram o napalm nas plantações vietnamitas.
PRINCIPAIS FASES DO CONFLITO
A Primeira Guerra Mundial divide-se em três fases:
1. Primeira fase (1914-1915) - marcada pela grande movimentação das forças em confronto. Depois de uma rápida ofensiva dos alemães sobre o território da Bélgica e da França em setembro de 1914, os franceses organizaram uma contraofensiva barrando o avanço de seus inimigos sobre Paris, na Batalha de Marne. A partir daí, nenhum dos lados conseguiu vitórias importantes sobre o outro, mantendo-se um equilíbrio de forças na chamada Frente Ocidental (batalhas terrestres ocorridas na Alemanha, França e Bélgica, e navais, no Atlântico Norte, Canal da Mancha e mar do Norte).
A primeira fase ficou conhecida como guerra de movimento. Nessa fase, a política de alianças já estava praticamente consolidada.
Nessa fase, uma série de batalhas travadas ao longo da fronteira oriental da França e sul da Bélgica, recebeu o nome de Batalha das Fronteiras. A batalha representou a colisão entre as estratégias militares do Plano XVII francês com o Plano Schlieffen alemão. A batalha foi vencida pelos alemães que, atraindo o centro do exército francês pela Lorena e Alsácia, invadiram o norte da França através da Bélgica com a intensão de criar o que consideravam o novo Sedan, envolvendo o exército francês e vencendo de forma definitiva a guerra.
|
Cavalaria francesa desfila em Paris a caminho da Batalha das Fronteiras, em 1914, |
2. Segunda fase (1915-1917) - também conhecida como guerra de posições, a movimentação de tropas na Frente Ocidental deu lugar a uma guerra de trincheiras. Essa fase começa com a saída da Itália da Tríplice Aliança para fazer parte da Tríplice Entente. Cada lado tentava manter suas posições e evitar que os inimigos avançassem. Nessa fase, apenas na Batalha de Verdun (em 1916) morreram um milhão de soldados, dos dois milhões de franceses e alemães que lutavam entre si. A movimentação continuou na Frente Oriental (região empreendida entre a Alemanha, a Áustria-Hungria e a Rússia, incluindo a península Balcânica), onde os alemães ocuparam a Polônia, forçando os exércitos russos a voltarem para seu território.
|
Nas trincheiras, infantaria australiana se protege com máscaras de gás, em Ypres - Bélgica, em 1917. |
3. Terceira Fase (1917-1918) - essa fase é marcada pela entrada definitiva dos Estados Unidos na guerra, além de tropas de outros países, como canadenses, australianos, neozelandeses, japoneses, indianos, chineses e muitos soldados africanos que viviam sob o colonialismo ou outras formas de dominação europeia.
Alegando que navios de países não envolvidos no confronto transportavam alimentos para os inimigos da Tríplice Aliança, a marinha alemã afundou várias embarcações com seus submarinos. Foram afundados, entre muitos outros, o Lusitânia e o Arábia, dos Estados Unidos, além do brasileiro Paraná. Assim, o governo brasileiro também entrou no conflito, declarando guerra ao governo da Alemanha. Em cooperação com os ingleses, os brasilheiros patrulharam o Atlântico Sul e enviaram médicos e aviadores à Europa. Nessa fase, além da entrada das forças estadunidenses no conflito (6 de abril de 1917), ocorreu também a saída dos exércitos russos (em 3 de março de 1918), que enfrentavam uma revolução no seu país, a Revolução Russa.
|
Presidente do Brasil, Venceslau Brás, declara guerra aos poderes centrais. Ao seu lado, o ministro interino das Relações Exteriores, Nilo Peçanha, e o presidente de Minas Gerais, Delfim Moreira (sentado). |
MUDANÇAS PROVOCADAS PELA GUERRA
A guerra provocou grandes transformações, principalmente na vida dos europeus. Além dos combatentes, as populações da cidade e do campo também sofreram as consequências dessa situação e, de alguma forma, quase todos foram envolvidos.
A economia dos países em conflito foi direcionada para aumentar a fabricação de produtos necessários à guerra - armas, munições, veículos de transporte, entre outros. Como milhões de homens participavam dos combates, grande número de mulheres passou a trabalhar nas indústrias, especialmente na Inglaterra, França, Alemanha e Itália. Terminada a guerra, as mulheres não só mantiveram as posições conquistadas durante o conflito, como ampliaram a luta por seus direitos, inclusive o de votar.
Muitas fábricas e plantações também foram destruídas, o que tornou os alimentos mais escassos e fez subir os preços dos gêneros de primeira necessidade, atingindo a população da Europa e de outros continentes. Com isso, os governos impuseram o racionamento de comida, e a fome espalhou-se entre as pessoas, afetando especialmente crianças e idosos pobres.
|
Cidade de Ieper, na Bélgica, completamente destruída em 1918, após a Primeira Guerra Mundial |
O FIM DA GUERRA E OS EFEITOS DA DESTRUIÇÃO
Ao entrar na guerra, o amplo apoio financeiro e material dado pelo governo dos Estados Unidos foi decisivo para a vitória a Entente e seus aliados. Os recursos econômicos da Entente pareciam ilimitados quando comparados aos da Tríplice Aliança.
A partir de 1918, quando as outras forças da Tríplice Aliança já haviam se rendido, os alemães ficaram isolados em suas fronteiras, sem condições de sustentar os combates por mais tempo. Em 11 de novembro de 1918, o governo da Alemanha assinou um acordo de paz (Armistício de Compiègne) em situação bastante desvantajosa. Aceitava, por exemplo, devolver aos adversários materiais de guerra pesados e submarinos apreendidos.
|
Junto ao vagão, após a assinatura do armistício, o comandanta chefe da Tríplice Entente Marechal Ferdinand Foch, ladeado pelos almirantes britânicos Hope e Rosslyn Wemyss. |
Nos locais onde se travaram os combates, era comuns as cenas de destruição de fábricas e plantações, casas e edifícios, pontes e estradas. Uma grave crise econômica atingiu os países já abalados pelas perdas materiais e pelos gastos com a guerra.
Além disso, as perdas humanas foram imensas. Alguns estudiosos calculam que a Primeira Guerra Mundial tenha deixado aproximadamente 9 milhões de pessoas mortas e cerca de 20 milhões de feridos. Devido ao avanço no setor de saúde das forças armadas, as epidemias não causaram tantas mortes entre os soldados, em comparação com as guerras do passado. A maioria das mortes foram causadas por ferimentos provocados pelas novas armas.
|
Tropas austríacas executam prisioneiros sérvios |
Além de mortos e mutilados, a guerra também forçou o deslocamento de milhões de pessoas. Muitas delas tiveram de fugir das áreas de conflitos ou então foram obrigadas a se deslocar quando foram redefinidas as novas fronteiras nacionais, abandonando as terras onde viviam há gerações.
Uma euforia patriótica estimulada pela propaganda goernamental marcara o início da guerra em muitos países. Mas essa euforia transformou-se em desespero ao término do conflito, pois o mesmo progresso que permitiu avanços econômicos e criou tecnologia para construir armas poderosas também levou à perda de milhões de vidas.
FONTE: Cotrim, Gilberto. Saber e fazer história: história geral e do Brasil, 9° ano: mundo contemporâneo e Brasil República / Gilberto Cotrim, Jaime Rodrigues. 6. ed. - São Paulo: Saraiva, 2009.
4 comentários:
Há apenas um engano: o napalm utilizado no Vietnam não é um gás.
Napalm não é um gás.
Ok, obrigado e desculpa pelo erro.
.
Postar um comentário