domingo, 15 de fevereiro de 2015

A FLEXIBILIDADE GEOGRÁFICA DAS EMPRESAS

  Desde o final do século XIX, formaram-se as grandes empresas a partir dos trustes e oligopólios com sede nas metrópoles e filiais em diversos países, chamadas de multinacionais. Esse modelo, em geral, reproduzia tecnologias oriundas da sede, garantia a localização próxima às fontes de obtenção de matérias-primas e assegurava a venda de produtos industrializados. Mais recentemente, essas empresas ficaram conhecidas como transnacionais, termo mais apropriado, pois adotaram novos procedimentos, como a especialização das filiais em fases específicas do processo de produção, mudança da sede ou divisão dela por diversos países, deslocamento de unidades produtivas em busca de rentabilidade e a criação de centros de pesquisas e desenvolvimento de tecnologias inovadoras nas filiais.
Processo de produção numa fábrica
  As empresas transnacionais são corporações industriais, comerciais e de prestação de serviços que possuem matriz em um determinado país e atua em diversos territórios distintos dispersos pelo mundo, ultrapassando os limites territoriais dos países de origem das empresas com a instalação de filiais em outros países em busca de mercado consumidor, energia, matéria-prima e mão de obra baratas.
  As primeiras empresas transnacionais surgiram no final do século XIX, atingindo o seu auge no pós Segunda Guerra Mundial. No Brasil, essas empresas começaram a ganhar importância no governo de Juscelino Kubitschek, quando o país procurou atrair montadoras estrangeiras de veículos, como a Toyota, Volkswagen, Willys (montadora norte-americana que produzia o popular Jeep), entre outras. As montadoras norte-americanas Ford e GM já possuíam linhas de montagem de veículos no Brasil desde 1919 e 1925, respectivamente.
Juscelino Kubitschek, durante a inauguração da fábrica da Volkswagen, em 1959
  Muitas das transnacionais realizam o processo de truste. Truste é a fusão de várias empresas de modo a formar um monopólio com o intuito de dominar determinada oferta de produtos e/ou serviços. É a expressão utilizada para designar as empresas ou grupos que, sob uma mesma orientação, mas sem perder a autonomia, se reúnem com o objetivo de dominar o mercado e suprimir a livre concorrência. Essas empresas quando se unem, controlam todas as etapas da produção, desde a retirada de matéria-prima da natureza até a distribuição das mercadorias. Os trustes podem ser horizontais ou verticais.
  Nos trustes horizontais as empresas fabricam o mesmo produto e correspondem a uma estrutura de mercado de concorrência imperfeita, no qual o mercado é controlado por um número reduzido de empresas, de tal forma que cada uma tem que considerar os comportamentos e as reações das outras empresas quando tomam decisões de mercado.
  Os trustes verticais ocorre quando as empresas visam controlar, de forma sequencial, a produção de determinado gênero industrial, desde a matéria-prima até o produto acabado, sendo que as empresas podem ser de diversos ramos.
Exemplo de empresas que praticaram o truste
  O monopólio ocorre quando uma única empresa detém o mercado de um determinado produto ou serviço, conseguindo influenciar o preço do bem que comercializa. Os monopólios podem surgir devido a características particulares do mercado ou devido a regulamentação governamental (monopólio coercivo). Um exemplo prático de monopólio existente no Brasil refere-se à exploração petrolífera, onde a Petrobras é a única responsável pela exploração do petróleo no país. Isso reflete diretamente nos preços dos combustíveis, fazendo com que o Brasil tenha um dos combustíveis mais caros do mundo.
A Petrobras é o maior exemplo de monopólio existente no Brasil
  O oligopólio ocorre quando poucas empresas dominam um determinado setor da economia. Em um oligopólio, as alterações nas condições de atuação de uma empresa vai influenciar o desempenho de outras empresas no mercado. Isto provoca reações que são mais relevantes quando o número de empresas do oligopólio é reduzido. Um oligopólio é caracterizado por:
  • um estado de hegemonia, em que existe luta para alcançar a supremacia total;
  • inflexibilidade dos preços, sendo que todos os vendedores aceitam os preços estabelecidos;
  • ocorrência de ações em conjunto, frequentemente dando origem aos trustes.
  São exemplos de oligopólios no Brasil as emissoras de TVs, as operadoras de telefonia, as distribuidoras de combustíveis, entre outras.
Exemplos de oligopólios no Brasil
  As atividades produtivas, mercantis e administrativas das transnacionais ultrapassam fronteiras, estendendo-se a diversos países. Os vínculos especiais com o país de origem diminuem na proporção em que aumenta seu poder independente em um mercado globalizado e sem fronteiras. Essas corporações se espalharam pelo mundo e assumiram a hegemonia na economia mundial. O processo que permitiu essa expansão, foi o da extrema competição por meio de inovações em seus produtos e da eliminação dos concorrentes, realizando a prática de dumping.
  Dumping é uma prática comercial que consiste em uma ou mais empresas de um país a venderem seus produtos, mercadorias ou serviços por preços extraordinariamente abaixo do seu valor de mercado por um determinado tempo, com o objetivo de eliminar os seus concorrentes. É muito utilizado principalmente entre países que exportam um determinado produto, sendo uma forma de ganhar quotas de mercado. Quando uma empresa pratica o dumping e provoca a eliminação de seus concorrentes, essa empresa coloca os preços dos seus produtos acima do valor de mercado, prejudicando os consumidores.
Em 2011, o governo chinês acusou o Brasil de praticar dumping no setor de celulose
  Com enorme faturamento das transnacionais, acelerado a partir da década de 1990, essas megaempresas controlam todos os setores da economia: agricultura, indústria, comércio e serviços. Muitas delas se transformam em holding e conglomerados.
  Um holding, sociedade holding ou sociedade gestora de participações sociais é uma forma de sociedade criada com o objetivo de administrar um grupo de empresas. A holding administra e possui a maioria das ações ou cotas das empresas componentes de um determinado grupo. Essa forma de sociedade é muito utilizada por médias e grandes empresas e, normalmente, visa a melhorar a estrutura de capital, ou é usada como parte de uma parceria com outras empresas ou mercado de trabalho. Existem duas modalidades de holding:
  • a pura, quando, do seu objetivo social, consta somente a participação no capital de outras sociedades;
  • a mista, quando, além da participação, ela serve também à exploração de alguma atividade empresarial.
A Unilever é um exemplo de holding
  Um conglomerado é a combinação de duas ou mais corporações com atividades em diferentes tipos de negócio, mas que estão sob uma mesma estrutura corporativa (ou grupo empresarial), geralmente uma holding e várias subsidiárias.
  Os conglomerados são considerados uma forma de oligopólio e ficaram populares na década de 1960 nos Estados Unidos, devido a uma combinação de baixa taxa de juros e uma forte tendência do mercado na época. Os maiores conglomerados são norte-americanos e japoneses.
  São exemplos de conglomerados: Mitsubishi, Ambev, Coca-Cola, Fiat, Siemens, GE, Nestlé, Toshiba, Pepsico, Itaú, Grupo Guararapes, LG, Samsung, Toyota, Grupo JBS, entre outras.
Grupo JBS - exemplo de conglomerado
  Com as novas facilidades de comunicações e de transporte, as transnacionais puderam flexibilizar sua localização, instalando unidades produtoras em países onde os custos são mais baixos. Isso aumentou a integração de muitos países à economia mundial, como os chamados Tigres Asiáticos e, posteriormente, a China e o Vietnã.
  As partes de um mesmo produto pode ser fabricadas em diferentes países e montadas em outro. Muitas transnacionais nem sequer fabricam seus produtos: cuidam de projetos e da manutenção da marca. O processo de produção de componentes é realizado por indústrias localizadas em países em que existem condições atraentes (como mão de obra barata). A montagem final do produto segue o mesmo padrão em todas as partes do mundo. Com essa descentralização da produção, os produtos não possuem mais origem definida, o chamado made in. Muitas dessas empresas realizam o sistema just in time.
A grande maioria dos produtos consumidos no mundo possuem a logomarca made in
  Just in time é um sistema de administração da produção que determina que nada deve ser produzido, transportado ou comprado antes da hora exata. Pode ser aplicado em qualquer organização, para reduzir os estoques e os custos decorrentes. O just in time é o principal pilar do Sistema Toyota de Produção ou produção enxuta.
  Com esse sistema, o produto ou matéria-prima chega ao local de utilização somente no momento exato em que for necessário. Os produtos somente são fabricados ou entregues a tempo de serem vendidos ou montados.
  O conceito desse sistema está relacionado ao de produção por demanda, onde primeiramente vende-se o produto para depois comprar a matéria-prima e posteriormente fabricá-lo ou montá-lo. Nas fábricas onde esse sistema é implantado, o estoque de matéria-prima é mínimo e suficiente para poucas horas de produção. Para que isto seja possível, os fornecedores devem ser treinados, capacitados e conectados para que possam fazer entregas de pequenos lotes na frequência desejada.
  A redução do número de fornecedores para o mínimo possível é um dos fatores que mais contribui para alcançar os potenciais benefícios da política just in time. Essa redução gera vulnerabilidade em eventuais problemas de fornecimento, já que fornecedores alternativos foram excluídos e, por isso, há uma seleção cuidadosa dos fornecedores.
  As modernas fábricas de automóveis são construídas em condomínios industriais, onde os fornecedores just in time estão a poucos metros e fazem entregas de pequenos lotes na mesma frequência da produção montadora, criando um fluxo contínuo. O sistema de produção adapta-se mais facilmente às montadoras de produtos onde a demanda de peças é relativamente previsível e constante, sem grandes oscilações.
Esquema do sistema just in time
  Uma das ferramentas que contribui para um melhor funcionamento do sistema just in time é o kanban. Kanban é uma palavra de origem japonesa que significa literalmente registro ou placa visível. É um cartão de sinalização que controla os fluxos de produção ou transportes em uma indústria. O cartão pode ser substituído por outro sistema de sinalização, como luzes, caixas vazias e até locais vazios demarcados.
  Coloca-se um kanban em peças ou partes específicas de uma linha de produção, para indicar a entrega de uma determinada quantidade. Quando se esgotarem todas as peças, o mesmo aviso é levado ao seu ponto de partida, onde se converte num novo pedido para mais peças. Quando for recebido o cartão ou quando não há nenhuma peça na caixa ou local definido, então deve-se movimentar, produzir ou solicitar a produção da peça.
  O kanban permite agilizar a entrega e a produção de peças. Pode ser empregado em indústrias montadoras, desde que o nível de produção não oscile em demasia.
Esquema do kanban
  A soma de bens e serviços finais produzidos em um lugar durante determinado tempo é expressa pelo Produto Interno Bruto (PIB). No entanto, o volume de vendas de muitas transnacionais ultrapassam o PIB de muitos países, e grande parte do lucro dessas empresas é remetida aos seus países de origem.
  Por essa razão, as transnacionais contam com os governos dos países-sede (potências como os Estados Unidos, França, Alemanha, Reino Unido e Japão) para apoiá-las e defender seus interesses. E, dessa forma, acabam exercendo também enorme poder sobre a economia e as decisões políticas dos países que a acolhem.
As maiores transnacionais do mundo
  Muitas vezes, as transnacionais realizam o cartel. Cartel é um acordo explícito ou implícito entre concorrentes para, principalmente, fixação de preços ou cotas de produção, divisão de clientes e de mercados de atuação ou, por meio da ação coordenada entre os participantes, eliminar a concorrência e aumentar os preços dos produtos, obtendo maiores lucros em prejuízo do bem-estar do consumidor.
  Os cartéis são considerados a mais grave lesão à concorrência e prejudicam consumidores ao aumentar preços e restringir a oferta, tornando os bens e serviços mais caros ou indisponíveis.
  Um dos exemplos mais claros de cartelização refere-se ao preço do petróleo no mercado mundial, cuja produção e distribuição do produto depende, em grande parte, da Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo). No Brasil, essa prática é bastante comum principalmente nos postos de combustíveis, que acrescentam os décimos de centavos com o objetivo de enganar os consumidores.
O postos de combustível é um dos exemplos mais comum de cartel no Brasil
FONTE: Terra, Lygia. Conexões: estudos de geografia geral e do Brasil / Lygia Terra, Regina Araújo, Raul Borges Guimarães. - 2. ed. - São Paulo: Moderna, 2013.

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