domingo, 19 de setembro de 2021

OS ATAQUES TERRORISTAS

  Terrorismo é o uso da violência, física ou psicológica, por meio de ataques localizados a elementos ou instalações de um governo ou da população governada, de modo a incutir medo, pânico e, assim, obter efeitos psicológicos que ultrapassem largamente o círculo das vítimas, incluindo o restante da população do território. É utilizado por uma grande gama de instituições como forma de alcançar seus objetivos, como organizações políticas, grupos separatistas e até por governos no poder.

  O terrorismo originou-se no século I d.C., quando um grupo de judeus radicais, chamados de sicários (Homens de Punhal), atacavam cidadãos judeus e não judeus que eram considerados a favor do domínio romano. Nessa época também havia uma grande perseguição aos cristãos pelo Império Romano, que praticava práticas terroristas para acusar os cristãos de tais crimes. Outros indícios que confirmam as origens remotas do terrorismo são os registros da existência de uma seita muçulmana, no final do século XI d.C., que se dedicou a exterminar seus inimigos no Oriente Médio. Dessa seita teria surgido a origem da palavra "assassino". Mas foi no século XXI que ele se acentuou e que o discurso terrorista virou assunto recorrente na mídia Ocidental.

Cristãos sendo usados como tochas humanas, na perseguição sob Nero, por Henry Siemiradzki. Museu Nacional, Cracóvia, Polônia, 1876.

Terrorismo moderno

  O terrorismo moderno tem sua origem no século XIX no contexto europeu, quando grupos anarquistas viam no Estado seu principal inimigo. A principal ação terrorista naquele período visava à luta armada para constituição de uma sociedade sem Estado - para isso, os anarquistas tinham como principal alvo algum chefe de Estado, e não seus cidadãos.

  Durante a segunda metade do século XIX, as ações terrorista tiveram uma ascensão. Porém, no século XX, houve uma expansão dos grupos que optaram pelo terrorismo como forma de luta. Como consequência dessa expansão, o raio de atuação terrorista aumentou, surgindo novos grupos, como os separatistas bascos na Espanha, os curdos na Turquia e no Iraque, os muçulmanos na Caxemira e as organizações paramilitares racistas de extrema-direita nos Estados Unidos. Um dos seguidores dessa última organização foi Timothy James McVeigh, terrorista que assassinou 168 pessoas em 1995, no conhecido Atentado de Oklahoma.

  Com o desenvolvimento da ciência e tecnologia no século XX, as ações terroristas passaram a ter um maior alcance e poder por meio de conexões globais sofisticadas, uso de tecnologia bélica de alto poder destrutivo, redes de comunicação (internet), entre outros.

Edifício Federal Alfred P. Murrah após o Atentado de Oklahoma City

Terrorismo no século XXI

  No início do século XXI, principalmente após os ataques terroristas aos Estados Unidos, estudiosos classificaram o terrorismo em quatro formas:

  • Terrorismo revolucionário - surgiu no século XX e seus praticantes ficaram conhecidos como guerrilheiros urbanos marxistas (maoístas, castristas, trotskistas e leninistas);
  • Terrorismo nacionalista - fundado por grupos que desejavam formar um novo Estado-nação dentro de um Estado já existente (separação territorial), como no caso do grupo terrorista separatista ETA (Euskadi Ta Askatasuna -Pátria Basca e Liberdade) na Espanha (o povo Basco não se identifica como espanhol, mas ocupa o território espanhol e é submetido ao governo da Espanha);
  • Terrorismo de Estado - é praticado pelos Estados nacionais e seus atos integram duas ações. A primeira seria o terrorismo praticado contra a sua própria população. Foram exemplos dessa forma de terrorismo: os Estados totalitários fascistas e nazistas, a ditadura militar brasileira e a ditadura Pinochet no Chile. A segunda forma constituiu-se como uma luta contra a população estrangeira (xenofobia);
  • Terrorismo de organizações criminosas - são atos de violência praticados por fins econômicos e religiosos, como nos casos da máfia italiana, do Cartel de Medellín, da Al Qaeda, entre outros.

Corpos de guerrilheiros da Guerrilha do Araguaia com as mãos amarradas na década de 1970. Essa guerrilha praticava um terrorismo revolucionário

O Atentado de 11 de Setembro de 2001

   No dia 11 de setembro de 2001, membros da rede terrorista Al-Qaeda, constituída por extremistas islâmicos, sequestraram quatro aviões nos Estados Unidos. Dois deles foram lançados sobre as torres gêmeas do World Trade Center, em Nova York; outro sobre o Pentágono, a sede do Departamento de Defesa do país, próximo à capital Washington. O último foi derrubado pelas forças militares oficiais. Este foi o maior ataque estrangeiro ao território estadunidense desde 1812, ano da guerra contra o Canadá, então colônia inglesa.

  Os ataques terroristas de 2001 mataram cerca de 3 mil pessoas. A resposta do governo dos Estados Unidos, nos anos seguintes, foi de reafirmação de seu poder militar por meio da Doutrina Bush, uma espécie de cruzada contra o que o então presidente estadunidense, George W. Bush, denominou "eixo do mal". A ação dirigia-se contra grupos e países que contestavam a hegemonia dos Estados Unidos, como a Coreia do Norte, o Irã e o Iraque. A primeira incursão da Doutrina Bush, no entanto, foi no Afeganistão, país que estava sob o regime Talibã, grupo fundamentalista islâmico, e que abrigava bases de operação da Al-Qaeda.

Vídeo mostrando o momento do ataque às torres do World Trade Center

  Apoiado por outros países, como o Reino Unido, os ataques estadunidenses foram extensos e provocaram grandes destruições. Em poucas semanas, o governo afegão seria vencido e substituído por representantes de grupos mais alinhados com os Estados Unidos. O controle territorial, porém, se estenderia por longos anos, mais precisamente até o final de 2014, quando oficialmente a missão foi encerrada. Ao final da década de 2010, porém, as ações militares dos Estados Unidos ainda continuavam na região, principalmente em áreas de atuação de grupos fundamentalistas.

  Desde 14 de abril de 2021, quando o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, anunciou a retirada de todas as tropas americanas do Afeganistão, os talibãs começaram a assumir o controle do país, retomando definitivamente o poder no país desde agosto de 2021.

Militantes do Talibã

A Guerra do Iraque

  Após o Afeganistão, o alvo do governo dos Estados Unidos foi o Iraque, sob a alegação de suspeita de produzir armamentos de destruição em massa e de patrocinar o terrorismo internacional, o que era negado pelo governo local, comandado à época pelo ditador Saddam Hussein (1937-2006). Em 2003, mesmo sem a autorização da ONU, uma coalizão de países sob a liderança de Estados Unidos e Reino Unido deu início à invasão do Iraque.

  Assim como ocorreu no Afeganistão, os ataques foram intensos e provocaram grandes estragos, com a desorganização da sociedade local. Em algumas semanas, o governo de Saddam Hussein foi destituído. Investigações revelaram, entretanto, que o Iraque não possuía armas de destruição em massa e que vários relatórios dos países agressores tinham sido forjados para justificar a guerra.

  A presença das tropas estadunidenses e de aliados no território iraquiano se estenderia por longos anos, mas com intenso movimento de resistência, o que provocou a morte de mais de 100 mil pessoas. Oficialmente, as tropas estadunidenses só se retirariam do país em 2011. Longe de haver estabilidade, o governo local se viu imerso em diversos conflitos internos, muitos deles envolvendo grupos islâmicos fundamentalistas. Com isso, tropas dos Estados Unidos mantiveram-se presentes no país nos anos seguintes.

Dois tanques de guerra americanos M1 Abrams das forças de ocupação da Coalizão em frente ao monumento das "Mãos da Vitória", no centro de Bagdá, em 2003

O aumento do extremismo

  As intervenções estrangeiras dos últimos anos no Oriente Médio resultaram em inúmeras consequências, entre elas o fortalecimento de grupos extremistas após a Guerra do Iraque (2003-2011). Muitos desses grupos se estruturaram para resistir à ocupação do país, promovendo ações suicidas e práticas terroristas para atingir as principais potências internacionais, mas que também se voltavam contra a população local.

  Foi assim que ali se fortaleceu um grupo extremista ligado à Al-Qaeda, que a partir de 2006 passaria a se identificar como Estado Islâmico (EI), cujo principal objetivo era delimitar um território na região para reunir a população sunita, o segmento majoritário do islamismo. Após a saída das tropas estadunidenses do país, em 2011, o EI intensificou sua atuação, que ganharia maior abrangência com a eclosão de uma guerra civil na Síria.

Militante do Estado Islâmico carregando a bandeira do grupo

  Iniciado em 2011, o conflito sírio teve origem na chamada Primavera Árabe, um conjunto de manifestações populares que se arrastou por diversos países do Oriente Médio e do Norte da África a partir de 2010 e que resultou na queda de diversos governos locais, como ocorreu na Tunísia e no Egito. Na Síria, o governo permaneceu devido a uma forte repressão imposta a seus opositores, o que provocou intensa reação da população local contra o regime comandado por Bashar al-Assad. O cenário de conflito favoreceu a atuação do Estado Islâmico na Síria, que passou a colaborar com os rebeldes que lutavam contra o governo.

Explosão de um carro bomba feita na base aérea de Menagh, em território sírio, em 2017, executada por um suicida ligado ao Estado Islâmico. Conforme o grupo ia perdendo terreno e influência, seus militantes passaram a realizar centenas de atentados (a maioria suicidas) contra cidades da Síria e do Iraque e por outras regiões do Oriente Médio.

  Nos anos seguintes, o acirramento da guerra civil na Síria provocou uma dramática movimentação de refugiados, principalmente em direção a países vizinhos e à Europa, onde encontraram forte resistência para sua aceitação.

  Em 2014, extremistas do EI na Síria e no Iraque declararam a formação de um califado nos territórios ocupados. O grupo passou a chamar a atenção do mundo todo devido à adoção de práticas de extrema violência, divulgando vídeos com a execução sumária de seus prisioneiros, entre eles, cidadãos estrangeiros naturais das grandes potências.

  A situação levou o governo dos Estados Unidos a anunciar estratégias militares para combater o EI, especialmente por meio de ataques aéreos aos territórios controlados pelos extremistas. Porém, a partir de então, viu-se a disseminação de ataques terroristas assumidos pelo grupo em diversos países do mundo.

  Em novembro de 2015, um desses ataques ocorreu em Paris, na França, provocando a morte de 130 pessoas. Os alvos foram uma casa de espetáculos, um estádio de futebol e uma área repleta de restaurantes. No ano seguinte, os ataques se repetiram em Bruxelas, na Bélgica, no aeroporto e em uma estação de metrô, fazendo 32 vítimas fatais.

Em laranja, o território reivindicado pelo Estado Islâmico

FONTE: Palavra de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas: Mundo contemporâneo: tensões, conflitos e cooperação / Arno Aloísio Goettems ... [et al.]. São Paulo: Palavras Projetos Editoriais 2020 (pág. 134/135)

quinta-feira, 9 de setembro de 2021

A GUERRA DO VIETNÃ

  A Guerra do Vietnã, iniciada em 1959 e estendida até 1975, foi o enfrentamento entre o Vietnã do Norte e o Vietnã do Sul, ambos lutando pela unificação do país sob seu domínio. O conflito no Vietnã contou, a partir de 1965, com a participação ativa dos Estados Unidos, o qual lutou ao lado das tropas do Vietnã do Sul contra as forças do Vietnã do Norte. A atuação americana nessa guerra fez parte de sua política de contenção do comunismo em nível internacional durante o período da Guerra Fria.

   Ao longo dos anos 1960, a agressividade da política externa do governo estadunidense se ampliou. O maior exemplo foi o envolvimento nos conflitos do Vietnã, que se originaram no processo de descolonização com a divisão do território em duas partes: uma próxima aos princípios comunistas e outra adepta ao capitalismo. Os Estados Unidos intervieram militarmente no embate, com o propósito de derrotar os defensores do comunismo. A iniciativa, porém, resultou em grande desastre militar, com graves consequências à população vietnamita

  Ao longo de 11 anos, o governo estadunidense mobilizou grandes recursos para ocupar a região. Em 1964, eram cerca de 150 mil soldados envolvidos na guerra - quatro anos depois, o número ultrapassava os 500 mil homens. As tropas contavam ainda com tecnologias bélicas avançadas e bastante destrutivas, inclusive armas químicas, que provocaram a morte tanto de soldados vietnamitas quanto da população local.

  No início do conflito, a opinião pública estadunidense defendeu os ataques. A resistência vietnamita, porém, impossibilitou uma vitória rápida, obrigando a crescente mobilização de recursos e soldados, inclusive com a morte de um número considerável de indivíduos enviados ao combate. Nos Estados Unidos surgiram movimentos pacifistas e defensores de direitos civis, que passaram a lutar pelo fim do conflito e pela retirada das tropas estadunidenses do Vietnã. Ainda assim, o governo só começou a retirar seus exércitos do país em 1973. Dois anos depois, a guerra chegou ao fim, com a unificação do país e a tomada do poder pelos comunistas, para grande descontentamento dos Estados Unidos.

Mapa do Vietnã com a divisão do país em Vietnã do Norte (vermelho) e Vietnã do Sul (azul)

Nomes para a guerra

  Vários nomes foram aplicados ao conflito. Guerra do Vietnã é o nome mais comumente usado. Também tem sido chamado de Segunda Guerra da Indochina e Conflito do Vietnã.

  As principais organizações militares envolvidas na guerra foram, de um lado, o Exército da República do Vietnã (ARVN) e as Forças Armadas dos Estados Unidos, e, por outro lado, o Exército Popular do Vietnã (PAVN - mais comumente chamado de Exército do Vietnã do Norte), e a Frente Nacional para a Libertação do Vietnã do Sul (FNL, mais conhecido como Vietcongue), uma força de guerrilha  comunista do Vietnã do Sul.

Museu em Hanói com as armas utilizadas na Guerra do Vietnã em exposição

Pré-guerra

  A Guerra do Vietnã é considerada pelos historiados um desdobramento direto da guerra travada na década de 1950, na região, pela independência e contra o domínio colonial francês. O Vietnã, juntamente com Camboja e Laos, formou, durante décadas, a Indochina Francesa e, após a Segunda Guerra Mundial, viu o poder colonial francês ser enfraquecido. O resultado desse conflito foi a consolidação do fim do domínio francês na região com a independência do Vietnã, Laos e Camboja.

  No caso do Vietnã, a independência aconteceu de maneira mais complexa, pois o país estava dividido em duas grandes forças antagônicas. Essa divisão foi ratificada na Conferência de Genebra, em 1954, em que foi estipulado que o Vietnã do Norte teria como capital Hanói e seria governado pelos comunistas de Ho Chi Minh, e o Vietnã do Sul, com capital em Saigon (atual Ho Chi Minh), seria governado por Bao Dai, aliado dos Estados Unidos.

  Apesar da divisão existente, na mesma Conferência de Genebra, determinou-se a realização de eleições livres para formar um governo que promovesse a unificação dos países. No entanto, a escalada da tensão entre as duas partes e as diferenças ideológicas fizeram com que o governo do Vietnã do Sul recusasse a realização dessas eleições.

Conferência de Genebra de 1954, na qual promoveu a divisão do Vietnã

  Tanto o governo do Norte quanto o do Vietnã do Sul apresentavam posturas ditatoriais e repressivas. O norte, por exemplo, promovia julgamentos sumários, fuzilamentos em massa e confinamentos em campos de trabalho forçado, enquanto o Sul desenvolvia um governo extremamente corrupto e ditatorial, que impôs perseguição a dissidentes e suspeitos de adesão ao comunismo.

  A partir de 1955, esses governos desenvolveram campanhas um contra o outro, além de aliarem-se a potências internacionais que poderiam dar-lhes suporte em caso de conflito. O Vietnã do Norte passou a contar com o apoio da União Soviética, e o Vietnã do Sul foi apoiado pelos Estados Unidos. A crescente tensão precipitou pequenos conflitos entre as tropas das duas forças, o que conferiu ares de guerra civil a partir de 1959.

Camponeses presos suspeitos de serem Vietcongue sob detenção do exército dos Estados Unidos, em 1966

Participação americana na guerra

  Durante os primeiros anos do conflito, os Estados Unidos não se envolveram diretamente e mantiveram sua atuação apenas no fornecimento de armas e na ação de conselheiros norte-americanos que preparavam as tropas do Vietnã do Sul para as batalhas. Apesar do apoio estadunidense, as tropas vietcongues (nome usado em referência aos vietnamitas comunistas do Norte) levavam a vantagem no conflito.

  O governo de Diem, que estava no poder desde 1955, passou por um forte enfraquecimento e enfrentou inúmeros protestos no Vietnã do Sul. Isso levou os Estados Unidos a apoiarem conspirações internas que articularam o golpe e a execução de Diem em 1963. Pouco tempo depois, o assassinato do presidente americano John F. Kennedy fez com que os Estados Unidos assumissem uma nova postura no conflito.

  Com a morte de Kennedy, o vice, Lyndon Johnson, ocupou a presidência dos Estados Unidos e, durante o seu governo, o país passou a atuar diretamente no conflito com o envio de tropas. A entrada dos norte-americanos no conflito aconteceu após o Incidente do Golfo de Tonquim. Nesse incidente, a embarcação USS Maddox foi supostamente atacada duas vezes por torpedeiros norte-vietnamitas (o segundo ataque nunca foi comprovado). Isso foi utilizado como pretexto por Lyndon Johnson para autorizar o ataque ao Vietnã do Norte e o envio de tropas.

O presidente americano Lybdon B. Johnson na assinatura da Resolução do Golfo de Tonquim, que dava autoridade para a Casa Branca levar à nação a guerra no sudoeste da Ásia

  A entrada dos Estados Unidos na guerra motivou o envio de 184 mil soldados ao final de 1965. Esse número cresceu gradativamente nos anos seguintes, chegando a 429 mil soldados, em 1966, e 543 mil em abril de 1969. A presença estadunidense no conflito também promoveu intensos bombardeios no Vietnã e nos vizinhos Camboja e Laos.

  A participação dos Estados Unidos na guerra, no entanto, não conseguiu a derrota das forças vietcongues. Utilizando-se do conhecimento geográfico das matas e de táticas de guerrilha, os vietcongues tornaram as batalhas desgastantes para as forças norte-americanas. Além disso, o uso de armamentos, como as bombas incendiárias Napalm, os ataques contra civis e o grande número de norte-americanos mortos no conflito impulsionaram uma campanha na imprensa dos Estados Unidos pela saída do país do conflito.

Soldados americanos inspecionando vilas vietnamitas em busca de soldados do Vietcongue

  Essas pressões da sociedade e da imprensa norte-americana levaram o presidente Richard Nixon a assinar um cessar-fogo e, em 1973, concluiu a retirada das tropas americanas do Vietnã. Sem esse apoio, o Vietnã do Sul não conseguiu conter as tropas comunistas e, em 1975, os vietcongues conquistaram a cidade de Saigon, realizando a unificação do Vietnã sob o comando dos comunistas em 1976.

  Estima-se que, em decorrência desse conflito, os Estados Unidos tiveram por volta de 58 mil baixas, enquanto os exércitos do Vietnã do Sul 225 mil baixas e do Vietnã do Norte 1,1 milhão de soldados.

Os vietcongues construíram um complexo sistema de túneis que lhes possibilitava transportar armamentos, socorrer feridos, estocar munições e enviar tropas para os locais de combate. Foi assim que conseguiram derrotar as tropas norte-americanas e do Vietnã do Sul

terça-feira, 31 de agosto de 2021

A CLASSE OPERÁRIA

  Classe trabalhadora é um conceito mais amplo da categoria clássica de proletariado, definida por Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-185) no Manifesto do Partido Comunista de 1848. O conceito de classe trabalhadora abrange não só o proletariado, mas todas as camadas sociais que vivem da venda da sua força de trabalho.

  É importante distinguir que, em sociologia os conceitos de classe social mudam conforme a orientação de cada escola sociológica. A escola chamada histórico-crítica ou marxismo defende o conceito de que a divisão de classes deve ser compreendida a partir do lugar onde cada grupo de indivíduos está no processo de produção de mercadorias. Já as correntes de pensamento mais afetas ao liberalismo tem uma concepção de classe social conforme a renda e o padrão de vida do indivíduo ou grupo social.

  Para os marxistas, existem duas classes sociais autônomas politicamente no modo de produção capitalista: a burguesia, constituída pelos donos dos meios de produção e o proletariado, constituído pelos trabalhadores que fabricam mercadorias a partir da venda de sua força de trabalho. Vale ressaltar que a venda da força de trabalho não está limitada a venda para um empresário capitalista. Um pequeno proprietário de terras ou de comércio, permanece vendendo sua força de trabalho, apesar de não possuir um chefe e ser dono dos meios de produção ou detentor do capital intelectual que está utilizando o seu trabalho.

  Já a corrente liberal divide a sociedade por seus ganhos: existem, assim, estamentos sociais (estratificação social), organizados alfabeticamente (classe A, B, C, etc.), cada uma correspondendo a uma faixa de consumo e de renda.

  Atualmente, o conceito de classe trabalhadora sofre interferência das mudanças das relações de trabalho. O setor de serviços cresceu e muitas atividades, como, por exemplo, profissionais liberais e as consultorias, não utilizam meios de produção físicos (máquinas e ferramentas). Mesmo se utilizassem, seus donos seriam os próprios trabalhadores, porém, esse fato não os tirariam da classe trabalhadora.

Charge ilustrando a dominação do patrão sobre uma família operária

Formação da classe trabalhadora inglesa

  Nas fábricas inglesas havia operários de diferentes origens. Boa parte deles vinha do campo. Eram camponeses que tinham vivido em terras comunais (utilizadas de forma coletiva), de onde foram expulsos pelos grandes proprietários de terra. A tomada dessas terras deu-se com o apoio do governo inglês, que, desde o século XVI, vinha concedendo a esses proprietários rurais o direito de se apoderar das terras comunais para transformá-la em área de pastagem.

  Os camponeses viviam nessas terras comunais sem deter a posse delas; por isso, tiveram de abandoná-las, deixando para trás suas moradias e plantações. Na busca pela sobrevivência, esses camponeses migraram para as cidades, onde acabaram se tornando a principal mão de obra da nascente indústria inglesa.

  Também foram trabalhar nas indústrias diversos trabalhadores manuais, como sapateiros, ferreiros, tecelões, alfaiates, entre outros. Esses profissionais não tiveram condições de fazer frente à concorrência das indústrias.

  Para se ter uma ideia, um tecelão qualificado conseguia produzir, em sua oficina, uma peça de tecido por dia de trabalho. Nesse mesmo período, dois teares movidos a vapor produziam três peças e meia. Ainda que fosse de qualidade inferior, essas peças eram vendidas a preços bem mais em conta. Essa concorrência contribuiu para levar à ruína grande parte dos trabalhadores qualificados.

  Esses profissionais tiveram de vender seus equipamentos e suas ferramentas e buscar uma oportunidade de trabalho nas fábricas, que necessitavam de pessoas para operar as máquinas. Todo esse processo envolvendo trabalhadores rurais e urbanos deu origem ao surgimento de um novo grupo social, os proletários (operários).

Ilustração de 1865 que representa o papel central do maquinário nas indústrias do século XIX

As condições de trabalho

  As condições de trabalho do operariado eram precárias. Em geral, as pessoas permaneciam em locais úmidos e quentes, sem ventilação adequada. A alimentação servida era insuficiente e de péssima qualidade. As máquinas ofereciam perigo de acidentes ao menor descuido dos trabalhadores. Esses fatores, aliados à longas jornadas, contribuíam para reduzir a expectativa de vida dos operários.

  As fábricas tinham despesas elevadas com a compra das máquinas, mas se os equipamentos funcionassem por longos períodos os ganhos logo compensariam os gastos. Assim, interessados em recuperar rapidamente o capital investido, os patrões exigiam que seus funcionários realizassem jornadas de até 18 horas ininterruptas, seis dias por semana. Em muitas fábricas, só era permitido parar à noite para se alimentar. No restante da jornada, os funcionários eram obrigados a comer enquanto trabalhavam.

  Os trabalhadores eram vigiados por um supervisor ao longo de toda a jornada. Acidentes provocados pelo cansaço eram frequentes e acarretavam severas punições.

  As fábricas passaram a priorizar a contratação de mulheres e crianças - muitas com apenas 7 anos de idade, pois os patrões consideravam que trabalhadores com esse perfil eram mais dóceis. Além disso, ofereciam salários menores que os dos homens. Dessa maneira, muitos homens foram substituídos por seus filhos e esposas. Essa mudança contribuiu para a redução geral dos salários pagos a todos os trabalhadores.

Representação mostrando mulheres e crianças trabalhando em uma tecelagem na Inglaterra, no século XIX

Más condições de trabalho e trabalho infantil

  Os donos de fábrica costumavam recrutar crianças pobres em orfanatos. Elas recebiam o salário de aprendiz, o equivalente a cerca de metade do valor pago a um adulto, e podiam ficar com esse mesmo salário até os 21 anos de idade. Mesmo pequenos, meninos e meninas enfrentavam jornadas diárias de até 15 horas, podendo apanhar caso dormissem de cansaço durante o serviço.

  Em 1789, por exemplo, dois terços dos 1.150 funcionários que trabalhavam nas três fábricas da cidade de Derbyshire, na Inglaterra, eram crianças. Em meados da década de 1830, a cada quatro trabalhadores das fábricas inglesas de tecidos, havia um homem adulto, uma mulher e duas crianças e adolescentes.

  Uma das principais consequências da adoção da mão de obra infantil nas fábricas britânicas foi o aumento drástico da morte de crianças, por causa de acidentes de trabalho ou pelas doenças decorrentes da extensa jornada em locais insalubres, ou ainda por desnutrição.

  O salário que os trabalhadores recebiam mal dava para o sustento. A maior parte do dinheiro era gasto com o pagamento de impostos e taxas urbanas, pouco sobrando para a alimentação. A fome e a fraqueza deixavam os operários suscetíveis a doenças e epidemias, como cólera, febre tifoide e outras enfermidades que proliferavam nos bairros operários.

  Nesses bairros, as condições de higiene e saúde eram precárias. As pessoas viviam em cortiços e construções superlotadas, em casebres desprotegidos do vento e da chuva ou em habitações temporárias. Essas moradias ficavam em ruas escuras, sem pavimentação e mal ventiladas. As residências não tinham água suficiente, e o sistema de saneamento era precário ou inexistente.

Crianças trabalhando em uma fábrica de tecidos na Inglaterra no século XIX

A organização da classe trabalhadora

  A dura realidade das fábricas motivou os operários a se organizar e a lutar contra as más condições de trabalho e contra a exploração que sofriam nas fábricas. Sem nenhuma lei que os protegesse, muitos começaram a recusar os serviços nas unidades fabris. Preocupado com essa evasão de mão de obra, o governo inglês adotou diversas medidas repressivas. Uma delas estabelecia que o operário que abandonasse o emprego poderia ser acusado de vadiagem e até preso.

  As primeiras reações violentas dos trabalhadores ingleses começou em 1811, quando eles invadiram fábricas à noite para destruir máquinas. Esses trabalhadores ficaram conhecidos como ludittas, pois seu líder chamava-se Ned Ludd. As máquinas eram vistas como o principal responsável pela situação em que os operários se encontravam, pois substituíam a mão de obra operária e provocavam o desemprego. O movimento espalhou-se nas décadas seguintes para países como Bélgica, França e suíça.

  O luddismo, contudo, atacava apenas um aspecto do processo, a substituição dos trabalhadores pelas máquinas, deixando de lado suas causas: os diferentes interesses de trabalhadores e donos das fábricas.

  Muitos trabalhadores perceberam que essas ações não eram suficientes para melhorar as condições de vida do proletariado. Preocupados com os acidentes de trabalho, as doenças e o desemprego, os trabalhadores fundaram as primeiras associações de auxílio mútuo. O objetivo dessas entidades era criar uma reserva monetária para auxiliar os operários nos momentos de necessidade.

Representação dos ludditas destruindo uma máquina de tear em 1811

Nascem os sindicatos

  O surgimento das associações de auxílio mútuo foi o primeiro passo para a criação dos sindicatos trabalhistas, entidades destinadas a lutar pelos direitos do proletariado. Uma vez organizados em sindicatos, os trabalhadores ingleses - e mais tarde os de outros países - fariam importantes conquistas, como melhores salários, redução da jornada de trabalho, aposentadoria, descanso semanal remunerado, férias, etc.

  Um dos principais instrumentos adotados pelos trabalhadores para exigir mudanças nas relações de trabalho foi a greve. Assim, em vez de destruir as máquinas - como faziam os ludditas -, os operários paravam de trabalhar, paralisando as fábricas e a produção. Essa paralisação afetava diretamente os interesses dos donos das fábricas, pois a produção parada reduzia seus lucros.

  A luta dos operários começou a alcançar resultados mais efetivos a partir da década de 1830, quando os trabalhadores ingleses reuniram suas reivindicações na chamada Carta do Povo. Era um programa de seis reivindicações que operários apresentaram ao Parlamento britânico. Entre outras coisas, os trabalhadores defendiam jornada de dez horas de trabalho por dia e o direito de eleger seus representantes para o Parlamento.

  Nascia o cartismo, primeiro grande movimento político do proletariado que obteve importantes avanços trabalhistas, em especial quanto à jornada de trabalho de adultos e quanto ao trabalho infantil. A pressão deu resultado e, entre os anos de 1830 e 1840, o Parlamento inglês aprovou diversas leis que protegiam e regulamentavam as atividades de homens, mulheres e crianças nas fábricas. UM dos desdobramentos dessa luta dos trabalhadores foi o nascimento dos movimentos socialistas.

Representação de manifestação do cartismo em Londres

domingo, 22 de agosto de 2021

O NOVO ENSINO MÉDIO E A BNCC

   Apesar dos avanços, a educação brasileira ainda enfrenta problemas na atualidade. No Ensino Médio, em particular, há grandes desafios, como garantir uma escola mais atrativa para os jovens, combater a evasão escolar e oferecer um ensino de qualidade.

  A evasão escolar é um fenômeno complexo, que pode resultar de vários fatores, como ingresso precoce no mercado de trabalho, dificuldades de aprendizagem ou de acesso à escola, falta de interesse pelo modelo escolar existente no país, entre outros.

  Em relação à falta de interesse pela escola, especialistas apontam que esse fator é responsável por cerca de 40% da evasão escolar. Entretanto, a questão é: Quais são as razões desse desinteresse pela educação?

  A resposta não é simples, mas estudiosos identificam alguns aspectos, entre os quais está a falta de protagonismo do jovem. Na educação tradicional, o estudante é visto como objeto, destino, alvo, e não como sujeito da aprendizagem. Ele cria muito pouco e não é estimulado a refletir e vivenciar aquilo que é transmitido pelo professor na sala de aula. Enfim, tratado como agente passivo, o estudante não se envolve no processo de ensino e aprendizagem.

  O Ensino Médio brasileiro vinha sendo organizado em 13 disciplinas obrigatórias e com uma abordagem de conteúdos muitas vezes desconectados entre si, mostrando-se pouco atraentes e sem responder às necessidades e às expectativas dos jovens no conteúdo histórico atual.

  Na tentativa de implementar um novo modelo de Ensino Médio, a lei de Reforma do Ensino Médio propôs um currículo diversificado, em uma estrutura que compreende a formação geral básica, incluindo quatro áreas do conhecimento, a formação técnica e profissional e os itinerários formativos. O objetivo é flexibilizar o currículo de modo a possibilitar diferentes arranjos curriculares, que sejam relevantes para o contexto local e possam ser ajustados às diversas realidades das escolas e dos sistemas de ensino.

Algumas mudanças com o Novo Ensino Médio

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC)

  Um passo para concretizar essa proposta foi a aprovação da BNCC do Ensino Médio de 2018, que delimita os direitos e os objetivos de aprendizagem dos estudantes, expressos no desenvolvimento de competências e habilidades. A BNCC não é um currículo, mas, sim, um orientador curricular. Cabe aos estados e municípios elaborarem seus currículos a partir dos princípios e aprendizagens essenciais definidos por ela.

  Na BNCC, competência é definida como a mobilização de conhecimentos (conceitos e procedimentos) e habilidades, como práticas cognitivas e socioemocionais.

  O Conselho Nacional de Educação (CNE), responsável por aprovar o texto final em dezembro de 2017, resolveu que, na BNCC, competências e habilidades estão relacionadas aos direitos e objetivos de aprendizagem dos estudantes.

  O conceito de competência é associada à mobilização de conhecimentos e habilidades indispensáveis para a vida em sociedade. Foram definidas dez competências gerais que devem guiar o trabalho de todos os anos e em todas as áreas de conhecimento.

  Entre as competências listadas na base estão: trabalhar em grupo, aceitar as diferenças, lidar com conflitos e argumentar, entre outras. Quatro das dez competências tratam do desenvolvimento de habilidades socioemocionais.

  A proposta da base, no entanto, não é ensinar essas competências de forma isolada. Por isso, o professor terá papel fundamental no processo. Caberá a ele encontrar formas para, de maneira intencional e planejada, aliar o aprendizado dos conceitos ao desenvolvimento das competências. Além das competências gerais, cada área e cada componente curricular possuem suas competências específicas.

  As habilidades dizem respeito às aprendizagens essenciais separadas para cada área, componente curricular e ano. São sempre iniciadas por um verbo que, segundo o texto da Base, "explicita o processo cognitivo envolvido".

Competências gerais da BNCC

  No Ensino Médio, a BNCC apresenta referências que rompem com a organização curricular centrada exclusivamente em componentes curriculares, dando maior espaço para o trabalho com áreas de conhecimento a fim de favorecer as abordagens interdisciplinares.

  Segundo a orientação desse documento oficial, cada escola e sistema de ensino deverão elaborar o próprio currículo, com o intuito de promover o desenvolvimento dos estudantes nas dimensões intelectual, física, emocional, social e cultural. Esse direcionamento implica que, além dos aspectos acadêmicos, as unidades de ensino devem expandir a capacidade dos estudantes de lidar com seu corpo e bem-estar, suas emoções e relações, sua atuação profissional e cidadã, sua identidade e repertório cultural. Nesse princípio, a BNCC defende o princípio de uma educação integral dos estudantes.

  Em síntese, a educação integral deve:

  • Eleger o estudante como foco central e protagonista de seus processos de ensino e aprendizagem.
  • Respeitar a diversidade e a singularidade do estudante no que diz respeito a sexo, etnia, identidade de gênero, orientação sexual, religião ou deficiência.
  • Estimular a participação reflexiva, ativa, propositiva e colaborativa dos estudantes no cotidiano de suas escolas e na relação com seus pares.

  A BNCC também defende a construção de currículos e propostas pedagógicas que atendam mais adequadamente às especificidades locais e à multiplicidade de interesses dos estudantes, estimulando o exercício do protagonismo juvenil.

  O protagonismo deve ser entendido como a capacidade de enxergar-se como agente principal da própria vida, responsabilizando-se por suas atitudes, distinguindo suas ações das dos outros, e expressando iniciativa e autoconfiança. O estudante protagonista acredita que pode aprender e encontrar as melhores formas de fazer isso não apenas individualmente, mas atuando de forma colaborativa e participativa no contexto escolar.

  Nesse sentido, a BNCC propõe que os estudantes deixem de desempenhar um papel de meros espectadores para se tornarem sujeitos ativos do seu processo de aprendizagem e de desenvolvimento pessoal. Portanto, a BNCC sugere que as situações de ensino e aprendizagem devem ser organizadas de modo que os estudantes exerçam, efetivamente, um papel autoral, ativo, criativo e autônomo de (re)construção e de invenção.

  Ao considerarmos esse princípio de autoria e de protagonismo juvenil estaremos atentos à diversidade de cenários e de condições socioculturais nos quais a escola de Ensino Médio está inserida. Dentro dessa diversidade, é preciso promover a equidade.

domingo, 15 de agosto de 2021

REGIMES TOTALITÁRIOS: O FASCISMO

  O totalitarismo é um sistema político caracterizado pelo domínio absoluto de uma pessoa ou partido político sobre uma nação. Dentro do totalitarismo, a pessoa ou partido político no poder controla todos os aspectos da vida pública e da vida privada por meio de um governo abertamente autoritário.

  O totalitarismo também é marcado pela forte presença de um militarismo na sociedade e é acompanhado por ações do regime com o objetivo de promover sua ideologia por meio de um sistema de doutrinação da população. Os regimes totalitários utilizam-se do terror como arma política para conter e perseguir seus opositores políticos, e a propaganda é usada de maneira consistente para que a população seja convencida das medidas extremas tomadas por esses regimes.

  O totalitarismo foi um sistema político que esteve no auge durante as décadas de 1920 e 1930. Seu surgimento aconteceu após a Primeira Guerra Mundial e é considerado pelos historiadores como um reflexo causado por toda a destruição causada por esse conflito. Assim, o autoritarismo começou a ganhar força como solução política para as crises que o mundo enfrentava no pós-guerra, conseguindo adeptos mundo afora.

Charge mostrando como funciona o totalitarismo. No regime totalitário é preciso controlar as mentes da população pela força e pela propaganda

  O termo "totalitarismo" surgiu durante a década de 1920 para referir-se ao fascismo italiano. Esse sistema político surgiu com o próprio fascismo italiano, regime que alcançou o poder na Itália em 1922, quando Benito Mussolini tornou-se primeiro-ministro do país. Ao longo da década de 1920, a tendência política mundial pendia para o autoritarismo, e o totalitarismo ganhou considerável força após a ascensão do nazismo ao poder na Alemanha.

  As características básicas do totalitarismo são:

  • Culto ao líder - os três regimes possuíam um forte culto ao líder, e sua imagem era espalhada em todos os locais possíveis;
  • Unipartidarismo - todos os regimes totalitaristas suprimiam a existência dos partidos, e somente o partido do governo tinha a permissão de funcionar;
  • Doutrinação - a população dos regimes totalitários era alvo de intensa doutrinação, que se iniciava com o ensino infantil. Essa doutrinação visava propagar a ideologia do governo;
  • Centralização do poder - o poder político no totalitarismo é centralizado no líder e/ou partido;
  • Uso do terror - o terror era uma arma dos regimes totalitários para amedrontar seus opositores e perseguir grupos enxergados como "inimigos do Estado";
  • Censura - a censura era uma prática comum a jornais e à população em geral. Regimes totalitários não aceitavam críticas e não aturavam a existência de uma oposição;
  • Militarização - exaltação do exército e militarização da sociedade;
  • Criação de inimigos internos e/ou externos - esse mecanismo era utilizado como distração ou justificativa para explicar as ações e o autoritarismo do regime;
  • Nacionalismo exacerbado - o nacionalismo no totalitarismo assumia um viés extremista que pregava a exclusão e perseguição de outros povos ou etnias.

Líderes frequentemente acusados de governar regimes totalitários (da esquerda para a direita e de cima para baixo): Joseph Stalin (ex-secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética), Adolf Hitler (ex-Führer da Alemanha Nacional Socialista), Mao Tsé-tung (ex-presidente do Partido Comunista da China), Benito Mussolini (ex-Duce da Itália) e Kim Il-sung (eterno presidente da Coreia do Norte)

Democracia liberal em xeque

  A ascensão de regimes autoritários na Europa, entre eles o fascista e o nazista, foi um legado da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), caracterizada por uma disputa de nacionalismos rivais pela hegemonia continental, além de expressar a competição entre os países europeus por colônias na Ásia e na África. Aos poucos, alastrou-se por outros continentes, sobretudo com a entrada dos Estados Unidos no conflito, em 1917, a favor da França e do Reino Unido. A participação estadunidense foi crucial para o armistício, que, na prática, foi a derrota alemã.

  Porém, o fato decisivo para a ascensão de ditaduras na Europa Ocidental foi o que ocorreu no Império Russo, que entrou na guerra ao lado de franceses e britânicos, pois era inimigo da Turquia, aliada dos alemães. O Império Russo não era uma democracia liberal, mas um regime absolutista, chefiado pelo czar, que governava um império de várias nacionalidades eslavas, situado em uma região convencionalmente chamada de Eurásia.

Divisão da União Soviética

  O império czarista era pouco industrializado, dominado por uma aristocracia agrária e mal tinha uma classe operária. No entanto, foi ali que irrompeu a primeira revolução socialista no mundo. O flagelo da guerra levou à queda do czar Nicolau II, que abdicou em 1917, abrindo caminho para uma democracia liberal. Formou-se, então, um governo provisório, mas este não durou muito. O Partido Bolchevique - comunista -, liderado por Vladimir Lênin, aproveitou-se da instabilidade política para tomar o poder. Apoiou-se nos sovietes - conselhos ou associações operárias - e, em parte, nos camponeses e nos soldados, que não aguentavam mais lutar em uma guerra que não era deles.

  Ainda em 1917, os bolcheviques conquistaram o poder na Rússia. Tiveram que enfrentar uma guerra civil contra os defensores do czarismo, que durou até 1923, mas venceram. As classes dirigentes da Europa Ocidental ficaram horrorizadas com a emergência de um regime que ameaçava o capitalismo, sobretudo com a possibilidade de uma revolução que se pretendia permanente e internacional, em nome da classe operária mundial.

Soldados e civis se manifestando durante a Revolução Russa de 1917

  O temor da burguesia europeia diante do bolchevismo foi essencial para a ascensão de movimentos anticomunistas de caráter autoritário. Partidos comunistas surgiram em vários países, mas na Itália e na Alemanha apareceram com força. Na Itália, não tentaram uma revolução, mas disputaram eleições com bom desempenho em várias regiões. Na Alemanha houve tentativas de golpes revolucionários, como em Munique e Berlim. Ao fracassar nessas tentativas, passaram a disputar eleições, também com desempenho cada vez melhor.

  Foi nesse contexto que se organizaram movimentos nacionalistas contra o internacionalismo soviético. Esses movimentos, embora condenassem as desigualdades do capitalismo, defendiam os interesses da burguesia contra uma eventual revolução comunista. Assim, em 1919, surgiu na Itália o movimento fascista, liderado por Benito Mussolini (1883-1945), ex-socialista, grande orador e com programa anticomunista. Sua força derivava de milícias uniformizadas - os camisas-negras -, que atacavam os comunistas em toda parte.

Bolchevique (1920), por Boris Kustodiev

  Na Alemanha, organizou-se o Partido Nacional-Socialista, ou nazista, liderado por Adolf Hitler (1889-1945). Esse partido dizia-se revolucionário e socialista, mas defendia um socialismo nacional, ao contrário do soviético, considerado inimigo. Hitler chegou ao poder como primeiro-ministro, em 1933, com o suporte das classes dominantes da Alemanha. No ano seguinte, já havia acumulado todos os poderes do país e passou a comandar a destruição da democracia alemã.

  A revolução soviética, de um lado, e as revoluções fascista e nazista, de outro, puseram em xeque a legitimidade da democracia liberal que prevalecia na Europa desde a segunda metade do século XIX. Mesmo nos países em que a democracia  liberal se manteve, como a França e o Reino Unido, surgiram movimentos inspirados no fascismo e no nazismo.

  O anticomunismo das burguesias urbanas ou rurais da Europa Ocidental e o medo que tinham de perder seus privilégios abriram caminho para o questionamento do regime democrático representativo. Essa ideia alastrou-se por Espanha, Portugal, Escandinávia, Europa Oriental e América Latina.

Durante o auge do totalitarismo (décadas de 1920 e 1930), uma série de regimes democráticos ruiu para o autoritarismo

FACISMO: NACIONALISMO AUTORITÁRIO

  A participação da Itália na Primeira Guerra Mundial ao lado da França e do Reino Unido ficou conhecida como "vitória mutilada". Isso porque, apesar de integrar a coligação vitoriosa, não foi atendida em suas reivindicações territoriais. Além disso, o país conheceu uma inflação sem precedentes que empobreceu não apenas a classe trabalhadora, mas também a classe média urbana e os pequenos proprietários rurais. O contraste entre o norte industrial e o sul agrícola também provocava forte desequilíbrio econômico do país.

Movimento fascista

  A instabilidade socioeconômica impulsionou a radicalização política, que colocou os partidos liberal-democratas em segundo plano. No campo da esquerda, o Partido Socialista Italiano, com forte base operária, alcançou 32% dos votos nas eleições parlamentares. A ascensão dos socialistas favoreceu greves por melhores salários e condições de trabalho, paralisando a indústria em 1920. Além disso, armazéns e lojas foram saqueados pela multidão. Foi nesse contexto que a ala à esquerda do Partido Socialista fundou, em 1921, o Partido Comunista Italiano. Discordando da direção socialista, os dirigentes adotaram um programa revolucionário, estimulado pela vitória da revolução bolchevique.

  O crescimento político de comunistas e socialistas levou as classes burguesa e agrária a apoiarem alternativas políticas para manter a ordem capitalista. Assim, essas classes apoiaram o fascismo, que fortaleceu suas bases com operários desempregados e membros da classe média empobrecida. a milícia fascista cresceu recrutando militares de baixa patente ou reformados, jovens pequeno-burgueses e criminosos comuns. No início de 1921, os esquadrões fascistas destruíram centenas de seções socialistas e sindicatos ligados a partidos de esquerda.

Logotipo do Partido Nacional Fascista

  Mas Mussolini percebeu que, para ampliar suas bases sociais, era preciso adotar uma linha mais legalista. Estabeleceu, então, uma trégua com o Partido Socialista e a Confederação Geral do Trabalho e conteve a violência dos seus esquadrões. Fundou o Partido Fascista Italiano, que alcançou 200 mil filiados. As lideranças liberais viam os fascistas com bons olhos naqueles "anos vermelhos", assim chamados em razão da ascensão dos partidos de esquerda. O objetivo dos liberais era usar o fascismo para derrubar os comunistas e os socialistas, e depois controlá-lo. Nas eleições de 1921, o desempenho dos fascistas cresceu a ponto de elegerem 35 deputados. Os socialistas perderam trinta, mas os comunistas elegeram quinze deputados. A esquerda continuava forte, embora dividida entre as opções revolucionária ou democrática, e isso favoreceu o fascismo.

  Em 1922, membros do Partido Fascista reunidos em Nápoles decidiram fazer uma manifestação em Roma, partindo de várias cidades, para pressionar pela participação fascista no governo liberal. Precedia da ocupação de prédios públicos e estações ferroviárias, a Marcha sobre Roma ocorreu em 28 de outubro de 1922 e não encontrou resistência, sendo um enorme sucesso. O rei escolheu Mussolini como primeiro-ministro em 30 de outubro. Iniciou-se, assim, a escalada do fascismo no Estado italiano.

Marcha sobre Roma - movimento que levou o fascismo ao poder na Itália

O fascismo no poder

  Entre 1922 e 1925, o fascismo conviveu com as instituições liberais do país, mas reativou sua milícia para intimidar a oposição. Governos locais de orientação socialista foram dissolvidos e a imprensa foi censurada. A polícia colaborava com os militantes nos ataques aos comunistas.

  Em 1924, o líder socialista Giacomo Matteotti (1885-1924) foi sequestrado e morto pelos camisas-negras depois de proferir um discurso, no parlamento, contra a violência dos fascistas nas eleições parlamentares daquele ano, nos quais os fascistas obtiveram 65% dos votos.

  Mussolini recusou a responsabilidade pelo crime, mas os deputados antifascistas abandonaram o parlamento, exigindo a volta da legalidade. Pediram a intervenção do rei, que apelou para a "concórdia nacional". O resultado foi o aniquilamento das oposições e o estabelecimento da ditadura, prisão, exílio e morte de lideranças de esquerda. Em outubro de 1925, o sindicalismo livre foi liquidado, abolindo-se o direito de greve. A primeira grande medida do fascismo foi o chamado corporativismo na administração das relações trabalhistas.

  Ainda em 1925, o Estado declarou a ilegalidade de todos os partidos políticos, exceto o fascista. Mesmo este foi subordinado ao Estado, criando-se um Conselho Fascista como elo entre o partido e Mussolini. Na prática, o partido foi estatizado e passou a controlar o Estado. A democracia liberal entrou em colapso e, apesar de a monarquia ter sido mantida, o rei era uma figura decorativa.

Giacomo Matteotti - político socialista italiano, em foto da década de 1920

  Em 1929, o Estado convocou um plebiscito para que a população avaliasse o governo. Mussolini obteve cerca de 98% dos votos, tornando-se o duce (derivado de dux, termo utilizado na Roma antiga e que significa "chefe") - chefe do partido, do Estado e da nação. As democracias ocidentais viram com bons olhos a ascensão de Mussolini, sobretudo graças à ofensiva anticomunista. Os jornais britânicos e franceses o apresentavam apenas como um personagem extravagante, embora não considerassem que tal regime pudesse servir de modelo para outros países. A avaliação feita pelos jornais internacionais ajudou a naturalizar um comportamento autoritário que ameaçava a ordem democrática, dando forças ao regime. O tempo mostraria que estavam enganados em naturalizá-lo.

  O mito da romanidade foi levado ao extremo, instituindo-se uma autêntica glorificação do Império Romano, como uma alusão ao tempo em que um império poderoso, com sede no mesmo local da então capital italiana, Roma, governava o mundo ocidental. A sociedade foi fascistizada, a começar pela juventude, organizada em classes de idade: os figli della lupa ("filhos da loba", crianças), os balilla (adolescentes) e os avanguardisti (jovens). O lema imposto à juventude era simples: "Crer, obedecer, combater".

Crianças que faziam parte dos figli della lupa ("filhos da loba")

  A universidade livre também foi devorada pelo regime, o que deu origem aos Grupos Universitários Fascistas. Os professores foram obrigados a jurar fidelidade ao fascismo, sob pena de demissão. Manifestações públicas multiplicaram-se em louvor ao fascismo e ao duce. O fascismo tornou-se consenso na sociedade italiana, e as oposições foram eliminadas pelo terror.

  A política econômica do fascismo facilitou a adesão de vários grupos sociais. A política fiscal protecionista estimulou a indústria de bens de consumo e o mercado interno a ponto de a Itália ter sofrido menos com a crise mundial de 1929 do que outros países. Mesmo assim, o desemprego saltou de 300 mil para 1,23 milhão em 1929. Em 1935, voltou a baixar para 765 mil, devido à intervenção do Estado, com sua forte política de obras públicas, sobretudo rodovias, conjugada à redução dos salários.

  A criação do Instituto para a Reconstrução Industrial, em 1933, deu forte impulso aos setores siderúrgico, mecânico e de construção naval, ampliando o número de empregos. Ele foi criado com fundos estatais, que chegaram a concentrar 22% do capital das empresas. No campo, o regime promoveu a Batalha do Trigo, programa destinado a tornar o país autossuficiente na produção de cereais e fixar os agricultores no campo. Mussolini também instituiu tarifas protecionistas para deter a importação de alimentos e favoreceu as pequenas propriedades e os sistemas de parceria. Foi a chamada política da ruralização.

Benito Mussolini (1883-1945)

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