Partindo de uma compreensão mais ampla do conceito de movimentos sociais, pode-se reconhecer sua presença no Brasil desde o período colonial. Foram incontáveis eventos, que variaram em duração, intensidade, número de participantes e causas. Opuseram-se no início desse processo: indígenas e colonos, escravizados e senhores, colonos e governantes. As formas de resistência também variaram muito de acordo com o contexto.
Os movimentos dos povos indígenas são os mais antigos no território onde se formou o Brasil. Resistem às mais distintas formas de exploração, aos ataques à sua forma de ser e viver e lutam pela manutenção da posse das terras onde vivem, sobretudo a partir do século XVI, com a chegada dos colonizadores europeus.
Mapa do Brasil com os principais grupos indígenas que habitavam o território brasileiro na época do descobrimento |
Indígenas e bandeirantes
A resistência à escravidão e à tomada das terras onde se viam foram as causas das primeiras lutas indígenas. As ações iniciais dos colonos depois foram potencializadas pelos paulistas - moradores da capitania de São Vicente que, em razão da falta de recursos da região, saíram em busca de riquezas pelo interior adentro. Conhecidos como bandeirantes, passaram a ser vistos como responsáveis pela expansão das fronteiras do Brasil. Em estados como São Paulo, este passado se inscreveu no nome de praças, ruas, avenidas e rodovias em diversos municípios (Anhanguera, Bandeirantes, Raposo Tavares), e em monumentos - como o Monumento das Bandeiras, de Victor Brecheret, de 1953, a Estátua de Borba Gato, de Júlio Guerra, de 1962 -, e na sede do governo: o Palácio dos Bandeirantes, todos na capital.
Estátua de Borba Gato, na Avenida Santo Amaro, em São Paulo |
Contudo, ao contrário da imagem que se construiu dos bandeirantes, eles eram em sua maioria mestiços de europeus com indígenas, sendo, assim, desprezados pelos europeus e também pelos indígenas, contra os quais atuaram muitas vezes de forma violenta. Andavam descalços e não falavam o português, mas sim a língua geral do Brasil, que misturava línguas da família tupi-guarani. Isso explica o fato de muitos lugares onde não viveram indígenas da família tupi-guarani terem nomes tupi.
Os bandeirantes buscavam conquistar riquezas em três tipos de ação: o apresamento ou a preação de indígenas, a fim de comercializá-los com os colonos para explorarem o trabalho escravo; a busca por minerais preciosos como ouro e diamante; e o sertanismo de contrato, isto é, a contratação para realizarem algum "serviço sujo" para os colonos, como destruir uma aldeia ou um quilombo.
Devido aos ataques contra aldeias indígenas a fim de obter prisioneiros, houve conflitos entre os bandeirantes e os jesuítas, que tentavam proteger os indígenas da escravidão, não obstante o esforço que faziam para retirar-lhes sua cultura.
Índios soldados da província de Curitiba escoltando prisioneiros nativos, de Jean-Baptiste Debret |
Conflitos indígenas no período colonial
Há dois conflitos envolvendo indígenas e colonos considerados mais significativos. Um ocorreu entre 1554 e 1567, entre os litorais de São Paulo e Rio de Janeiro e ficou conhecido como Confederação dos Tamoios, a qual reunia indígenas Tupinambá dos grupos Tupiniquim, Aimoré e Temiminó.
Alguns portugueses se casavam com indígenas, o que lhes facilitava alianças militares e a exploração de outros grupos. Assim ocorreu com João Ramalho, que se casou com Bartira, membro da tribo dos guaianases. João Ramalho propôs escravizar os tupinambás e acabou matando o chefe da tribo, Caiçuru. Seu filho, Aimberê, reuniu os chefes das outras tribos e declarou guerra aos portugueses e aos guaianases - estava formada a Confederação dos Tamoios.
Naquele período, os franceses estavam tentando dominar territórios na costa do Brasil. Eles se aliaram aos tamoios, oferecendo armas. Assim, uma disputa que envolvia colonos e indígenas em um primeiro momento, acabou ganhando uma proporção de conflito internacional. Aimberê tentou uma aliança com outro chefe indígena, Tibiriçá, que se mostrou leal aos portugueses. O conflito teve seu fim em 1567, com a expulsão dos franceses e a derrota da Confederação dos Tamoios.
Mapa do litoral do Sudeste destacando a Guerra dos Tamoios |
O outro conflito ficou conhecido como Confederação dos Cariris ou Guerra dos Bárbaros e ocorreu entre 1683 e 1713 na Região Nordeste do Brasil, reunindo indígenas dos grupos Inhamum, Cariú, Crateú e Tarairú. No primeiro contato com os europeus, os membros do grupo Cariri viviam próximos aos rios Itapicuru e Paraguaçu, na Serra da Borborema, e estabeleceram contato amistoso. Contudo, com o passar do tempo, a penetração dos conquistadores portugueses no interior do país, buscando metais preciosos e expandindo fazendas, significou o massacre dos povos indígenas e a exploração deles.
Os indígenas resistiram de várias formas: fugindo dos aldeamentos missionários e das fazendas onde eram mantidos cativos, defendendo suas aldeias dos ataques dos bandeirantes, atacando vilas e fazendas e, por vezes, se suicidando quando eram aprisionados. A Confederação foi a resistência mais significativa. Ela durou trinta anos e contou com indígenas dos atuais estados de Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco. Em 1713, os cariris foram derrotados. Homens, mulheres, idosos e crianças foram mortos na investida final, acabando com a Confederação dos Cariris.
Localização das línguas Kariri dentro do tronco Macro-Jê |
Indígenas na atualidade
Entre as várias estratégias de luta dos povos indígenas em defesa de seus direitos, merece destaque o protagonismo que eles têm assumido em diversas frentes. Muitos indígenas estão realizando cursos de formação para dar aulas nas escolas indígenas; outros estão realizando cursos superiores nas áreas de Direito, Pedagogia, Antropologia e Filosofia; outros, ainda, têm se destacado como palestrantes e autores de livros.
Cacique Raoni, da etnia caiapó, uma das figuras mais respeitadas do movimento indígena na atualidade |
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
MAGALHÃES, Domingos José Gonçalves de; MOREIRA, Maria Eunice; BUENO, Luís. A Confederação dos Tamoios. Col: Série Letras do Brasil. Curitiba: Editora UFPR, 2007.
PUNTONI, Pedro. A Guerra dos Bárbaros: Povos Indígenas e a colonização do Sertão Nordeste do Brasil. São Paulo: Hucitec, 2002.
SILVA, Daniel Neves. "Povos indígenas do Brasil"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/brasil/o-indigena-no-brasil.htm. Acesso em: 23 de junho de 2023.
Nenhum comentário:
Postar um comentário