quarta-feira, 2 de março de 2022

FORMAS DE MARCAR O TEMPO

   As medidas de tempo foram inventadas, ao longo da história, devido às necessidades das civilizações de controlar os dias e as horas, o que auxiliava as tomadas de decisões na época, como o mês melhor para cultivo, a medição das cheias dos rios, as fases da Lua, entre outras coisas. Hoje elas ainda são essenciais, pois se tornou inimaginável uma sociedade que não meça o tempo.

  As diferentes formas de organização e ocupação do espaço fazem parte do campo de estudo da Geografia, uma das ciências com as quais os estudos historiográficos dialogam. Em outra perspectiva, na formação do planeta Terra, identificam-se as eras geológicas, submetidas aos ritmos do tempo natural. O tempo geológico é o tempo do planeta Terra e o tempo histórico é o tempo das sociedades humanas na sua superfície.

As eras geológicas representam subdivisões na escala de tempo geológico

Tempo geológico

  Desde sua origem, há aproximadamente 4,6 bilhões de anos, a configuração do planeta Terra está em constante transformação. Isso acontece porque há muita energia térmica no interior do planeta e também porque a superfície da crosta terrestre sofre a ação permanente de forças externas, como a chuva, o vento, e, muito mais recentemente, o próprio ser humano, que constrói cidades, cultiva alimentos, desmata, refloresta, extrai minérios, faz aterros e represas, desvia rios, etc.

  Algumas mudanças de origem natural são facilmente percebidas. Por exemplo, terremotos e erupções vulcânicas são fenômenos que podem provocar alterações imediatas na paisagem. Outras mudanças naturais, como o afastamento dos continentes ou o processo de formação das grandes cadeias de montanhas, denominado orogênese, ocorrem em um intervalo de tempo tão longo que não conseguimos percebê-las em nosso curto período de vida.

Evolução da fragmentação da Pangeia até os dias atuais

  Para compreender os fenômenos geológicos, a noção de tempo que temos em nosso cotidiano - o tempo histórico, medido em meses, anos décadas, séculos ou milênios - não é suficiente. Para essa compreensão, é preciso pensar em termos de tempo geológico, medido em milhões de anos, divididos em éons, cujo nome vem do grego aion, "eternidade", começando pelo hadeano (do grego hades, que significa "inferno"), até o fanerozoico (do grego phaneros, que significa "visível", e zoico, "vida"). O éons, por sua vez, são subdivididos em eras, períodos e épocas.

Escala do tempo geológico simplificada, mostrando todos os éons e eras; os períodos das eras Paleozoica, Mesozoica e Cenozoica; e as épocas dos períodos Paleógeno, Neógeno e Quaternário. Os demais períodos, épocas e idades não estão nomeados, mas seus limites estão delimitados.

Tempo histórico

  Todos nós convivemos com fenômenos temporais: dia, noite, estações do ano, nascimento, crescimento, envelhecimento. Várias civilizações estabeleceram uma divisão do tempo adotando como base a observação dos ciclos da natureza: o movimento da Terra, do Sol e da Lua. Além da Lua e do Sol, o calendário dos maias, povo que viveu numa região hoje conhecida por América Central e cujo auge ocorreu entre os séculos III e X, baseava-se na observação do planeta Vênus, por exemplo. Muitos calendários foram elaborados com base na análise dos astros, por sua influência sobre as plantações e a necessidade de definir os tempos de plantio, poda e colheita.

Desde a Pré-história que os povos antigos se baseiam no tempo para o cultivo e a colheita

  Uma volta do planeta Terra em torno do seu eixo (rotação) foi interpretada por diversas culturas como um dia, que foi dividida em 24 partes iguais, chamadas de horas, por sua vez também subdivididas em minutos, e assim por diante. Decidiu-se que o dia não começa ao nascer do Sol, mas aproximadamente seis horas depois que ele desaparece no horizonte. Outras civilizações poderiam fazer divisões diferentes: afirmar que o dia começa logo que o Sol aparece. No século VIII a.C., na Babilônia, os astrônomos definiam o início do dia quando o Sol estava a pino, em seu ponto mais alto do céu. A semana de sete dias pode ter surgido de acordo com as fases da Lua.

  Essas diferentes formas de dividir o tempo correspondem ao tempo físico ou cronológico. Cada civilização tem uma leitura particular do tempo, que pode ser a melhor, a mais adequada ou a mais confortável para os membros de seu grupo, de acordo com seus saberes, crenças ou cosmologias. Embora muitos tenham aceitado e incorporado as divisões do tempo como se fossem naturais, podemos perceber que suas bases são arbitrárias, artificialmente definidas, sendo passível de críticas ou de modificações. Ou seja, trata-se de uma convenção, de uma invenção cultural.

Cronologia do tempo histórico

  O tempo cronológico, embora fundamental para a compreensão da história, não é seu objeto de estudo, mas sim do tempo histórico, ou seja, os períodos da existência humana em que ocorrem eventos que fazem parte de estruturas e contextos mais amplos, como a economia, as ideias, a política.

  É lógico que esses períodos só existem mentalmente, pois a vida das pessoas não muda de modo inesperado na passagem de um período para outro. Datas, períodos, eras e outras formas de demarcar o tempo histórico são convenções e orientam a leitura do passado, mas não representam mudanças definitivas e rupturas em todos os aspectos da sociedade. Após uma revolução, por exemplo, algumas condições de vida ou o sistema de governo podem ser modificados de maneira brusca, mas o modo de pensar, as práticas e atitudes diante dos acontecimentos, as mentalidades, mudam mais lentamente, em ritmos diversos. Entretanto, estudando os períodos históricos podemos compreender a história de forma mais ampla e realizar divisões de acordo com alguns critérios, como organização social, relações de trabalho e sistemas de governo.

  O relógio, por exemplo, foi uma invenção para medir o tempo de modo matemático, mais preciso, e trouxe diversas mudanças para as sociedades.

As fases da Lua são importantes para orientar diversas atividades econômicas, como a pesca e a agricultura

O tempo e o relógio

  O tempo histórico não é regular, contínuo e linear como o tempo físico ou cronológico, mas sim composto de diferentes durações, já que está vinculado às ações de grupos humanos e aos conjuntos de fenômenos - mentais, econômicos, sociais e políticos - que resultam dessas ações. Podem existir diferentes divisões, de acordo com os determinados pontos de vista cultural, político, ideológico, etc. Por exemplo, para alguns historiadores, o século XIX começa não em 1801, mas em 1789 (início da Revolução Francesa), e termina não em 1900, mas em 1914 (início da Primeira Guerra Mundial). Já o século XX teria se iniciado em 1914 e se encerrado em 1991, com o fim da União Soviética. Isso porque essas datas - início da Revolução Francesa, início da Primeira Guerra Mundial e fim da União Soviética - delimitam um período em que os eventos foram significativos para transformações sociais, culturais e políticas em nível mundial. Evidentemente, essa divisão não trata os séculos como tempo cronológico, mas como tempo histórico.

A Queda da Bastilha, em 14 de julho de 1789. Para alguns historiadores, esse acontecimento marca o início do século XIX

  Com base nessa ideia - de que o tempo das ações humanas não segue exatamente os relógios e os calendários -, outros historiadores argumentam que o tempo histórico pode ser de longa, de média ou de curta duração. Nas relações do ser humano com o meio natural que o cerca e nas modificações climáticas e geográficas, como o aquecimento global, essas mudanças ocorrem de forma bastante lenta. Nas formas de organização da produção, da distribuição e do consumo de bens materiais, nas relações econômicas e nas relações políticas, as mudanças seriam, em uma conjuntura de tempo médio, marcadas por rupturas e permanências. Já o tempo de curta duração se refere ao tempo do evento, do acontecimento, aquele que tradicionalmente era valorizado na história escrita ao longo do século XIX.

  Medir o tempo histórico e periodizá-lo (dividi-lo em períodos) é igualmente um ato arbitrário, pois a escolha do ponto inicial da contagem e dos eventos mais importantes é feita por algumas pessoas, segundo sua compreensão do mundo e da existência humana, e seguida por outros, sem que necessariamente exista uma concordância de todos. As periodizações também são expressões da cultura e evidenciam os principais valores de uma sociedade ou civilização.

De acordo com o tempo das ações humanas, a Revolução Industrial refere-se a uma conjuntura do tempo médio

O calendário cristão

  No início da propagação do cristianismo, ainda não se contava o tempo a partir do nascimento de Cristo. Isso viria a ocorrer apenas algumas décadas depois do fim do Império Romano do Ocidente, em 525 d.C., quando Dionísio, o Exíguo (na época, abade de Roma), fundamentado na informação sobre a idade de Roma e em detalhes históricos do período do nascimento de Cristo, estabeleceu o ano em que Jesus teria nascido. Com esses dados, Dionísio definiu o ano 1 do calendário cristão como o ano 754 da fundação de Roma. Em 1582, o papa Gregório XIII reformulou o calendário, motivo pelo qual o calendário cristão ocidental é chamado de gregoriano.

  De acordo com essa abordagem, embora muitas pessoas no Ocidente não sejam cristãs, nossa periodização baseia-se na ideia de que o nascimento de Cristo é tão importante para a humanidade que o tempo deve ser dividido em dois períodos: antes de Cristo (a.C.) e depois de Cristo (d.C.). Também por isso as sociedades cuja religião majoritária segue essa crença (como as das Américas pós-ocupação europeia e as da Europa) são chamadas, em conjunto, de civilizações cristãs ocidentais.

Linha do tempo para a periodização cujo critério é o nascimento de Jesus Cristo

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

REIS, José Carlos. O tempo histórico como "representação intelectual". Fênix: Revista de História e Estudos Culturais, Uberlândia, v. 8, ano VIII.

HAWKING, S. W. Uma breve história do tempo: do big bang aos buracos negros. 2. ed. Rio de Janeiro: Rocco, 1988.

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