segunda-feira, 30 de abril de 2012

MUDANÇAS OCORRIDAS NOS TEMPOS HISTÓRICOS

  " A análise de documentos antigos (relatórios sobre o tempo, dados de colheitas, narrativas de calamidades naturais etc.) permite reconstituir a evolução do clima no período histórico, cuja duração é relativamente reduzida (4 mil anos) se comparamos com a longa evolução do planeta.
  Na escala global, os estudiosos admitem ter ocorrido um período de aquecimento entre os séculos IX e XIII, conhecido como optimum climático, em que a temperatura média da Terra teria sido 2 a 3 °C mais elevada que a atual. Mais tarde, entre o começo do século XVI e meados do XIX estaria situada a pequena Idade do Gelo, caracterizada pelo fenômeno oposto, ou seja, por uma baixa da temperatura global de 2 °C, que voltou a elevar-se após essa época.
O nosso Planeta sempre sofreu mudanças climáticas, com aumento ou diminuição da temperatura
  O clima, contudo, pode ser identificado não apenas pela temperatura, mais também pelo conjunto dos seus elementos (precipitação, ventos, umidade relativa, evaporação etc.).
  É igualmente avaliar as interações que se verificam entre a massa atmosférica e os outros componentes do quadro natural, principalmente o oceano, que recobre 70,8% do planeta, e a biosfera.
  De grande relevância é a ação antrópica, cujas consequências se manifestam, cada vez mais, em todos os domínios naturais, principalmente na biosfera, onde a força transformadora do homem se mostra muito poderosa. A destruição das florestas tropicais para a prática da agricultura ou das atividades mineradoras em grande escala é um exemplo expressivo.
Evolução da temperatura média global desde 1860
  A mais importante consequência para o clima resultante da ação humana é a mudança nos processos de absorção e reflexão dos raios solares, desequilibrando o balanço da energia nas baixas camadas, além de influir na força e na direção dos ventos de superfície e nos valores da umidade relativa no regime de chuvas.
  A eliminação da cobertura vegetal diminui a capacidade de retenção de energia solar pela superfície e inibe a formação de fluxos de ar ascendentes, chamados 'correntes térmicas'. A estabilidade atmosférica tende a se acentuar, diminuindo a possibilidade de formação de nuvens produtoras de chuvas. Além disso, decresce a quantidade de polens em suspensão no ar, e a presença dessas micropartículas (chamadas 'núcleos biogênicos') é importante para estimular a condensação e a nebulosidade. A derrubada de florestas pode, portanto, concorrer para tornar menor a incidência de chuvas em escala local.
Grande parte dos desmatamentos são por causa das atividades agrícolas
  A expansão das atividades industriais resultou no aumento descontrolado das áreas urbanas, cuja consequência principal foi o surgimento do 'clima urbano', caracterizado pelas 'ilhas de calor', bem conhecidas em todas as áreas metropolitanas do mundo. Em nosso país, o exemplo mais bem estudado é o da cidade de São Paulo, cuja temperatura média, em 1920, era de 17,7 °C e hoje está em torno de 19 °C.
Mapa que mostra a quantidade de vegetação e a temperatura na cidade de São Paulo
  O lançamento de consideráveis volumes de resíduos industriais na atmosfera forma 'plumas' de poluição que irão bloquear, junto à superfície, o calor resultante da radiação infravermelha (ondas longas), produzindo elevação da temperatura.
  Desde o início da década de 1970, os satélites meteorológicos vêm documentando a presença de uma gigantesca mancha escura sobre o Atlântico Norte, entre os Estados Unidos e a Europa Ocidental, onde se localizam importantes complexos industriais.
Imagens de satélites que mostram manchas de lixo no Atlântico Norte
  Paralelamente há o perigo da desintegração da camada de ozônio, que se situa entre 30 e 50 quilômetros de altura e desempenha o papel de capa protetora da Terra contra a radiação ultravioleta do Sol (ondas curtas). Isso estaria ocorrendo em virtude do consumo em larga escala de um produto químico denominado clorofluorcarbono (CFC), gerado principalmente pela indústria de refrigeradores e de sprays. Essa substância eleva-se no ar e destrói a camada de ozônio, pondo em risco toda a biosfera, em virtude do caráter letal da variação ultravioleta.
Camada de ozônio - protege a Terra dos raios ultravioleta emitidos pelo Sol
  Nem todas as pesquisas, porém, comprovam o aquecimento progressivo da atmosfera. Há estudos que apontam para resultados inversos, ou seja, que a Terra estaria se esfriando, a partir da década de 1940-50, com novo avanço das geleiras, ao mesmo tempo que os totais de chuvas estariam variando de maneira não uniforme nos vários pontos do globo. Da mesma forma que os desertos se expandem em alguns pontos e sofrem recuos em outros.
Na África, a região do Sahel vem sofrendo a desertificação, com o avanço do Saara
  A própria destruição da camada de ozônio tem sido objeto de polêmica na comunidade científica, sobretudo quanto à sua intensidade e à localização dos maiores danos.
  As mudanças climáticas vêm sendo observadas com atenção, pois podem afetar de forma importante a vida econômica, como, por exemplo, as atividades agrícolas, a geração de energia em grande escala e, de forma direta, todo o setor produtivo. As características da economia, principalmente sua distribuição espacial, dependem, em grande parte, do perfil climático do globo e de sua estabilidade.
AS VARIAÇÕES DO TEMPO ATMOSFÉRICO E O HOMEM
  No dia de Ano-Novo de 1978, uma onda de frio varreu a Europa e as temperaturas baixaram a níveis inéditos na segunda metade do século XX: 45 °C negativos em Moscou e Estocolmo, com paralisação de rodovias e ferrovias de várias regiões da França e da Alemanha, além de outros transtornos na vida dos habitantes dessa importante região do mundo.
Praça Vermelha em Moscou sob forte nevasca no inverno de 2010
  O oposto também já ocorreu em áreas de significativa densidade demográfica, como, por exemplo, a região mediterrânea. Ali, em julho de 1987 (verão no Hemisfério Norte), a temperatura subiu a alturas impressionantes para aquela latitude: 40 °C na Grécia e 45 °C no sul da Espanha (região de Sevilha).
  Os extremos de pluviosidade acarretam, da mesma forma, verdadeiras calamidades. Em Cherrapundki (Bangladesh), situada numa superpovoada planície no sopé do Himalaia, já se registraram, num só ano, 26.461 mm de chuva, ou seja, vinte vezes mais do que se verifica na cidade de São Paulo no mesmo intervalo de tempo.
Rua comercial completamente alagada em julho de 2009 na cidade de Dacca, capital de Bangladesh, em virtude das fortes chuvas que caem nesse período na região
  O recorde diário de chuva ocorreu em 29 de fevereiro de 1964 na ilha de Reunião, no Índico tropical: 1.346 mm em 24 horas, equivalente ao valor de um ano da cidade de São Paulo.
  Por outro lado, em Arica, na região desértica do norte do Chile, houve uma série de 53 anos consecutivos em que só foi recolhido 0,8 mm de chuva, o que equivale a zero. Trata-se de um quadro físico hiperárido.
Deserto do Atacama no Chile - o deserto mais seco do mundo
  Várias outras manifestações meteorológicas interferem na vida das pessoas. Nevoeiros, por exemplo, podem paralisar pousos e decolagens nos grandes aeroportos, como também a navegação marítima. Na Grã-Bretanha foi demonstrado que os acidentes rodoviários são 33% mais frequentes em situações de fog (névoa úmida), ocorrência comum ali.
Fog (névoa úmida) sobre a cidade de Londres - Inglaterra
  Da mesma forma, em qualquer região do globo, as inversões térmicas de fundo de vale originadas pelo acúmulo de ar frio podem criar bancos de nevoeiro que põe em risco o tráfego  rodoviário. Na rodovia Presidente Dutra (São Paulo-Rio de Janeiro), no trecho do Vale do Paraíba entre Jacareí e São José dos Campos, esse fenômeno se verifica com certa frequência nos meses de inverno, trazendo sérias consequências. Em julho de 1986, registrou-se ali o maior engavetamento de veículos da década no Brasil, envolvendo dezenas deles, com mais de vinte vítimas fatais.
Nevoeiro na Rodovia dos Bandeirantes próximo à Jundiaí - SP
  Em certas áreas do planeta, onde as temperaturas das águas oceânicas são elevadas, podem originar-se furacões responsáveis por grandes danos, especialmente em áreas costeiras. O Oceano Índico e o golfo do México, por situarem-se em baixas latitudes, constituem zonas de risco. O perigo se acentua no final do verão, quando a concentração de energia é maior (entre agosto e outubro, no caso do Hemisfério Norte).
Furacão Katrina, que devastou a cidade de Nova Orleans nos Estados Unidos em 2005
  Há várias outras anomalias do comportamento atmosférico que perturbam as atividades humanas. Os efeitos de uma estiagem em área agrícola, por exemplo, podem fazer diminuir a oferta de alimentos, determinando a elevação do custo de vida. Em suma, a sociedade moderna, apesar de seu admirável avanço tecnológico, não está imune aos efeitos do tempo atmosférico."
JURANDYR ROSS
  Jurandyr Luciano Sanches Ross, é um geógrafo brasileiro formado pela Universidade de São Paulo (USP), com mestrado, doutorado e livre-docência em Geografia Física pela USP.
  É membro do conselho editorial da Revista do Instituto Florestal, da Revista Brasileira de Geomorfologia, do conselho consultivo do Boletim de Geografia da Universidade Estadual de Maringá e professor titular da Universidade de São Paulo. Foi chefe do Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP de 1983 até 2010.
  Tem experiência na área de Geografia, com ênfase em Geomorfologia, atuando principalmente nos seguintes temas: geomorfologia, cartografia, gestão ambiental, zoneamento ecológico-econômico e planejamento ambiental e produção do conhecimento geocientífico.
  Foi professor do primeiro e do segundo graus na rede de ensino privado e participou do Projeto Radam e do mapeamento geomorfológico do Centro-Oeste e Sul da Amazônia.
  Como consultor, participou também dos estudos ambientais para a construção de hidrelétricas dos rios Xingu, Madeira, Iguaçu e Uruguai. Participou também das pesquisas socioambientais para Zoneamento Ecológico-Econômico junto ao MMA (Ministério do Meio Ambiente), dos projetos da bacia do Alto Paraguai, zona costeira do Brasil e do PPG7 - Programa de Proteção das Florestas Tropicais - Amazônia.
 FONTE: CONTI, José Bueno; FURLAN, Sueli Ângelo. Geoecologia: o clima, os solos e a biota. In: ROSS, Jurandyr Sanches (Org.). Geografia do Brasil. São Paulo: Edusp, 1998. p. 80-85.

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