sábado, 21 de julho de 2012

MITOS E REALIDADES DA DINÂMICA POPULACIONAL

  "A história da humanidade tem sido a história da luta pela sobrevivência da espécie. O ser humano sempre lutou para se manter vivo diante dos inúmeros obstáculos do dia-a-dia e pela continuidade de sua descendência, constantemente ameaçada pelas altas taxas de mortalidade. Para fazer frente ao desafio da mortalidade, a sociedade se organizava para manter altas taxas de fecundidade, de modo a possibilitar o crescimento populacional. No século XIX, alguns poucos países começaram a vencer a batalha pela vida. Vários fatores contribuíram para a transição da mortalidade: a melhoria do padrão de vida da população, frutos dos ganhos de produtividade ocorridos especialmente a partir da segunda metade do século passado, decorrentes da chamada segunda revolução industrial; as conquistas da medicina, resultado da inovação médica, dos programas de saúde pública, do avanço do saneamento básico, da higiene pessoal; e também do avanço educacional, que permitiu aos pais uma melhor atenção aos cuidados das crianças. Assim, alguns países mais industrializados conseguiram uma redução em suas taxas de mortalidade. Nesses países, este processo ocorreu de forma lenta e foi acompanhado, logo em seguida, pela redução das taxas de fecundidade. Em muitos países do chamado Terceiro Mundo, entretanto, a queda da mortalidade caiu muito rapidamente após a Segunda Guerra Mundial e não foi seguida, imediatamente, pela queda da fecundidade. Isso provocou um rápido crescimento populacional, que propiciou a difusão do mito da 'explosão populacional'.
  Em decorrência desse mito, metas de limitação demográfica foram traçadas e formas coercitivas de controle populacional foram aplicadas. Programas de restrição do número de filhos ou de 'planejamento familiar' foram recomendados e implementados sem muito respeito aos direitos individuais. As mulheres foram as principais vítimas das propostas autoritárias de regulação da fecundidade. A maioria dos programas implantados de cima para baixo não apresentou os resultados esperados. Todavia, independentemente da vontade das autoridades controlistas, a queda da fecundidade se generalizou em quase todo o mundo, fruto da menor demanda por filhos.
Outdoor em Pequim sobre a Política de Filho Único adotado pelo governo chinês
  Hoje em dia, com a redução generalizada das taxas de fecundidade, está surgindo um novo mito: o da 'implosão populacional'. Muitas vozes, principalmente dos setores religiosos, estão interpretando a transição de altos a baixos  níveis das taxas de fecundidade como um indício de 'suicídio demográfico'. Este é outro mito, pois existe uma distância muito grande entre as baixas taxas de fecundidade e o desaparecimento de uma população. É importante destacar que esse novo mito não tem servido para impor novos meios contraceptivos, mas sim para restringir seus usos e para atacar os direitos sexuais e reprodutivos dos indivíduos, especialmente das mulheres. Saem de cena os controlistas e entram os  populacionistas ou natalistas. [...]
Aborto - uma das formas mais criticadas pela Igreja contra a redução da taxa de natalidade
O MITO DA EXPLOSÃO DEMOGRÁFICA
  Em 1798, quando a população mundial se encontrava na faixa de 0,8 bilhão de habitantes, Thomas Malthus publicou a primeira versão do Ensaio sobre população, lançando a base da construção do mito da 'explosão populacional'. O princípio de população de Malthus dizia: 'O poder de crescimento da população é indefinidamente maior do que o poder que tem a terra de produzir meios de subsistência para o homem. A população, quando não controlada, cresce numa progressão geométrica. Os meios de subsistência crescem apenas numa progressão aritmética' [MALTHUS, T. R. Ensaio sobre população. São Paulo: Abril Cultural, 1983. p. 282.] [...]
Thomas Malthus
  Pelo princípio malthusiano, a população tenderia sempre a crescer mais que os meios de subsistência, tornando a fome e a miséria uma realidade inexorável. Uma alternativa lógica para se evitar o desastre populacional seria o controle da natalidade através do uso de métodos contraceptivos, aborto, abstinência sexual no casamento etc. Mas isso ia contra outros princípios malthusianos, uma vez que Malthus era um sacerdote da Igreja Anglicana, que condenava a regulação da fecundidade entre casais e o aborto. Concordava, apenas, com a abstinência sexual fora do casamento. Ele pregava o princípio bíblico 'crescei e multiplicai-vos'. Nesse sentido, mesmo indo contra o senso comum, podemos dizer que Malthus nunca foi um controlista. Como escreveu Poursin e Dupuy [POURSIN, J. M.; DUPUY, G. Malthus. São Paulo: Cultrix, 1975.]: 'Malthus é resolutamente populacionista'. [...]
Malthus defendia a abstinência sexual, não dentro, mas fora do casamento
  Apesar da repercussão alcançada pelo Ensaio sobre população, a história se encarregou de jogar por terra o modelo malthusiano, uma vez que o desenvolvimento tecnológico propiciou, nos últimos dois séculos, um grande crescimento dos meios de subsistência e um enorme crescimento da produção per capita. Entre 1820 e 1992 as populações da Europa Ocidental e do mundo cresceram, respectivamente, 3 e 5 vezes, enquanto, no mesmo período, a economia mundial cresceu 40 vezes. Nesse período, foi a produção que teve um crescimento geométrico e não a população. Assim, além de contrariar a visão tecnológica de Malthus, a história mostrou que não existe uma relação direta entre as variáveis renda e fecundidade, mas sim uma relação inversa, pois quanto maior a renda do casal menor é o número provável de filhos.
A modernização do campo triplicou a produção de alimentos no mundo, porém, a fome continuou, visto que essa produção é má distribuída entre a população mundial
  Nesse sentido, podemos dizer que o princípio malthusiano era apenas uma ideologia conservadora capaz de justificar a ordem estabelecida na sociedade feudal e pré-capitalista. Nesse sentido, o mito da 'explosão populacional' foi utilizado como um recurso para justificar a necessidade de manter o atraso e a superexploração das classes trabalhadoras, justificando salários miseráveis.
  Cabe ainda destacar a diferença entre as concepções de Malthus e o neomalthusianismo. Malthus é o ideólogo do período anterior à queda generalizada das taxas de mortalidade. O fenômeno de transição demográfica, típico do século XX, veio trazer novas questões. O crescimento do padrão de vida da população, os avanços da medicina, as medidas de avanço da higiene pública, as campanhas de prevenção de doenças e os cuidados especiais com os recém-nascidos possibilitaram uma forte redução da taxa bruta de mortalidade em todo o mundo. Nos países industrializados, esse processo ocorreu de forma relativamente lenta e foi acompanhado, após pequeno lapso de tempo, pela queda das taxas de fecundidade. Nos países do Terceiro Mundo, entretanto, a queda das taxas de mortalidade ocorreu, de modo geral, de modo muito rápida após o fim da Segunda Guerra Mundial e não foi acompanhada imediatamente pela redução dos altos níveis de fecundidade prevalecentes nesses países. Houve, em consequência, uma forte elevação das taxas de crescimento populacional. Foi nessa época que se popularizou o termo 'explosão populacional' que, naquele momento, parecia ser um perigo real. [...]
Gráfico que representa o crescimento populacional
  Diante de tudo isso, a solução apontada seria estabelecer metas de crescimento zero e, para tanto, os neomalthusianos, livres dos princípios religiosos de Malthus, passaram a receitar o controle da fecundidade como forma de desarmar a 'bomba populacional'.
  Além de métodos modernos de contracepção criados pela ciência, como a pílula anticoncepcional, DIU etc., alguns chegaram a pregar a esterilização em massa, outros pregavam até mesmo o aborto. Ao contrário de Malthus, os teóricos neomalthusianos acreditam que é possível acabar com a miséria e a pobreza, mas tendem a culpar os próprios pobres pela sua situação desprivilegiada, uma vez que estes são naturalmente prolíferos. Nessa perspectiva, políticas populacionais restritivas foram traçadas recorrendo a métodos de controle que atentavam contra os direitos reprodutivos. Até a China comunista, pós-Mao Tsé-Tung adotou um sistema bastante forte para incentivar apenas um filho por casal. Tudo isso porque os neomalthusianos consideram que a pobreza é decorrente do excesso de população e contribui para atrasar ou frear o desenvolvimento econômico. É como se a fecundidade fosse uma variável independente que precisasse ser controlada. Dessa forma, o mito da 'explosão populacional' contribuiu, muitas vezes, para impor decisões reprodutivas alheias à vontade dos casais. Destacamos, então, que, enquanto o malthusianismo é uma ideologia essencialmente natalista, o neomalthusianismo é, ao contrário, essencialmente controlista. [...]
Para os neomalthusianos a pobreza é a principal causa do crescimento populacional
Tabela 1. Países mais populosos – 2011 (ONU)
Colocação
País
Em milhões de habitantes
República Popular da China
1.338.712.968
Índia
1.210.193.422
Estados Unidos
313.232.044
Indonésia
245.613.043
Brasil
193.741.680
Paquistão
187.342.721
Bangladesh
158.570.535
Nigéria
155.215.573
Rússia
142.914.136
10°
Japão
127.433.494
 
Tabela 2. Maiores taxas de crescimento demográfico – período entre 2005-2010 (ONU)
Colocação
País
% anual
Libéria
4,5
Burundi
3,9
Afeganistão
3,85
Saara Ocidental
3,72
Timor Leste
3,5
Níger
3,49
Eritreia
3,24
Uganda
3,24
República Democrática do Congo
3,22
10°
Palestina
3,18
 
Tabela 3. Maiores aglomerações urbanas do mundo (junção de cidades próximas) – ONU 2011
Cidade/país
Número de habitantes
Tóquio (Japão)
34.831.910
Cidade do México (México)
22.608.873
Seul (Coreia do Sul)
22.300.646
Nova York (Estados Unidos)
21.363710
São Paulo (Brasil)
20.316.149
Mumbai (Índia)
19.850.884
Nova Délhi (Índia)
19.565.905
Xangai (China)
18.150.831
Los Angeles (Estados Unidos)
18.101.378
Osaka (Japão)
16.497.267
  [A dinâmica demográfica, sobretudo quando se verificam altas taxas de natalidade, é apontada como responsável pela pobreza e pela crise de recursos naturais. Numa análise mais detalhada, verifica-se que se trata da distribuição de renda nos países.
  Os dados das tabelas acima mostram que os países  mais populosos não figuram entre aqueles com as maiores taxas de crescimento demográfico (predominam os africanos), o que sugere uma certa estabilização de seu crescimento, como a China e o Japão. Muitas das cidades de grande porte estão na Ásia - no Japão, na China e na Índia. Como estes dois últimos ainda podem ter sua população urbana aumentada, isso poderá contribuir para a estabilização das taxas de crescimento demográfico.]
Tóquio - maior aglomeração urbana do mundo
O MITO DA IMPLOSÃO DEMOGRÁFICA
  Um certo tempo após o início da queda da mortalidade, as taxas de fecundidade também começaram a cair, desacelerando o ritmo de crescimento da população mundial. Houve uma difusão de novas práticas conceptivas. Esse processo começou primeiro nos países desenvolvidos, de maior renda per capita, países do Norte, para depois cair também nos países subdesenvolvidos, de baixa renda, países do Sul. Neste últimos, ao contrário dos primeiros, a transição demográfica ainda não se completou. Para efeito prático, consideramos que o fim da primeira transição demográfica ocorre quando a taxa de natalidade se iguala à taxa de mortalidade. Nos países do Norte esse processo já ocorreu ou está em vias de acontecer. Na verdade, em vários desses países as taxas de natalidade só não estão abaixo das taxas de mortalidade - o que provocaria o decréscimo populacional - devido ao efeito da estrutura etária (alta proporção de mulheres em idade fértil) e à migração internacional. Ou seja, na maioria absoluta dos países do Norte as taxas de fecundidade estão abaixo do nível de reposição (aproximadamente 2,1 filhos por mulher). A continuar essa tendência, o conjunto desses países deverá assistir à diminuição de suas populações. Contudo, nos países do Sul, salvo raras exceções,  as taxas de fecundidade, mesmo estando em declínio, ainda se encontram acima do nível de reposição.
  Muitas abordagens teóricas buscam explicar a transição da fecundidade. Segundo a abordagem da modernização, a redução do tamanho da família é decorrente da passagem da sociedade agrária para a sociedade urbano-industrial. Maiores níveis de educação, participação feminina no mercado de trabalho, industrialização, urbanização e secularização podem explicar a queda da fecundidade. [...]
  A menor demanda por filhos tem tornado o controlismo e a explosão populacional questões anacrônicas ou restritas a poucas regiões do mundo. Todavia, ainda existem muitos controlistas que alardeiam o perigo da transição demográfica e tomam como exemplo a situação existente no continente africano. Também existem aqueles que justificam  o atraso e o subdesenvolvimento dos países do Sul pelo elevado ritmo de crescimento populacional, tentando jogar sobre os próprios pobres a culpa da pobreza e buscando ocultar as iniquidades da ordem econômica internacional. Para muitos ideólogos do Norte, é mais fácil discutir as altas taxas de crescimento populacional do que discutir as altas taxas dos juros internacionais e receituário restritivo do FMI. Dessa forma, enquanto cresce a preocupação com a possibilidade de decréscimo populacional nos países ricos do Norte, mantém-se o receituário controlista para os países do Sul. [...]
Mapa do crescimento populacional no mundo
CONCLUSÃO
  O espectro do apocalipse demográfico ronda o mundo. Primeiro foi o espectro da explosão demográfica. Segundo Malthus, a população cresceria em progressão geométrica enquanto os meios de subsistência cresceriam em progressão aritmética. A partir daí, teorias escatológicas pregavam a incapacidade do planeta de sustentar uma população cada vez maior e com maior nível de consumo. O rápido crescimento populacional dos países do Terceiro Mundo logo após o término da Segunda Guerra Mundial reforçou o medo da 'bomba populacional', que seria mais perigosa que a bomba de Hiroshima. Mas, diante da desaceleração geral do crescimento populacional do mundo, o espectro do apocalipse mudou de lado. No final do século XX e início do terceiro milênio, as teorias escatológicas já falam no deserto populacional, fruto da implosão demográfica provocada pelas baixas taxas de fecundidade. Mas explosões e implosões demográficas são mitos que devem ser rechaçados porque fazem parte de uma ideologia que traz, implícitas, formas coercitivas para se estabelecer metas demográficas, ferindo os direitos individuais. [...]"
Mapa da projeção demográfica no mundo
FONTE:  ALVES, José Eustáquio Diniz.  Mitos e realidades da dinâmica populacional. Disponível em: ,www.abep.nepo.unicamp.br.. Acesso em 17/7/2012.

segunda-feira, 16 de julho de 2012

TRANSFORMAÇÕES NO CAMPO E A URBANIZAÇÃO DO CENTRO-SUL

  Nas últimas décadas, tanto o Estado quanto as empresas privadas investiram grandes quantias no estabelecimento de um amplo complexo agroindustrial na região Centro-Sul do Brasil, com base na modernização de monoculturas comerciais (em geral cultivadas em latifúndios), em detrimento das policulturas alimentares (desenvolvidas, sobretudo, em pequenas e médias propriedades rurais.
  As linhas de crédito insuficientes ou com juros bancários altos levaram boa parte dos pequenos e médios produtores rurais ao endividamento e, consequentemente, à perda de suas terras, intensificando o processo de concentração fundiária na região. A disseminação do modelo de desenvolvimento agrícola capitalista, baseado no agronegócio, passou a dispensar, principalmente a partir da década de 1970, um contingente expressivo de trabalhadores, que tiveram suas funções substituídas, em grande parte, pelas tecnologias empregadas nas grandes fazendas.
Agronegócio - responsável pela mudança na agricultura do país
  Todos esses fatores aumentaram a concentração fundiária no Centro-Sul e geraram um intenso processo de êxodo rural, impulsionando grande parte da população da região a abandonar o campo e migrar, sobretudo, para os médios e grandes centros urbanos.
REGIÕES METROPOLITANAS DO CENTRO-SUL
  O Centro-Sul é atualmente o complexo regional mais populoso do país, com cerca de 120 milhões de habitantes, o que corresponde a 63% do total da população brasileira. Apresenta-se também como a região com o maior índice de urbanização: aproximadamente 91% dos seus habitantes vivem em cidades.
  Durante cerca de três décadas (1960 a 1980), o grande afluxo de migrantes e as altas taxas de natalidade desencadearam um intenso processo de urbanização na região, caracterizado pelo crescimento desordenado de seus maiores centros urbanos, como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Curitiba e, em seguida, duas cidades de médio porte, que também foram o destino de muitos migrantes. O rápido e desordenado processo de ampliação da área urbana dessas cidades fez com que, em muitos casos, suas malhas acabassem por se unir às malhas urbanas de municípios próximos, originando aglomerações urbanas ainda maiores. O censo realizado em 2010 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) delimitou 36 dessas grandes aglomerações, as quais são denominadas regiões metropolitanas. Segundo esse órgão, 20 delas estão no Centro-Sul, como mostra a tabela abaixo.

REGIÕES METROPOLITANAS DO CENTRO-SUL
NÚMERO DE MUNICÍPIOS
ÁREA (KM²)
NÚMERO DE HABITANTES
(IBGE – 2010)
Belo Horizonte
48
14.240,50
5.414.701
Vale do Aço
26
6.701,00
615.297
Grande Vitória
7
2.331,00
1.687.704
Rio de Janeiro
19
5.326,80
11.835.708
São Paulo
39
7.947,30
19.683.975
Baixada Santista
9
2.405,90
1.664.136
Campinas
19
3.644,90
2.797.137
Curitiba
26
15.418,60
3.174.201
Londrina
11
5.564,50
801.817
Maringá
25
5.577,10
690.303
Florianópólis
22
7.465,70
1.012.233
Vale do Itajaí
16
5.006,40
689.731
Norte/Nordeste Catarinense
20
10.829,50
1.094.412
Foz do Rio Itajaí
9
1.012,40
532.771
Carbonífera
25
5.053,80
550.206
Tubarão
18
4.540,90
356.721
Porto Alegre
31
9.803,10
3.958.985
Goiânia
20
7.315,10
2.173.141
Chapecó
25
4.938,20
403.494
Lages
23
19.090,80
350.532
METROPOLIZAÇÃO E PROBLEMAS URBANOS NO CENTRO-SUL
  O crescimento exacerbado das metrópoles e das cidades médias brasileiras, inclusive as do Centro-Sul, ocasionou uma série de problemas ligados à infraestrutura urbana, como a falta de saneamento básico e de moradia, o aumento do preço da terra, o estrangulamento do sistema viário e a poluição atmosférica, hídrica e dos solos. Além disso, mesmo que o processo de industrialização tenha ampliado sensivelmente os postos de trabalho nos diversos setores de atividades urbanas, a oferta de emprego não cresceu na mesma proporção que a população, fato que tem gerado um gigantesco contingente de desempregados, isto é, pessoas que trabalham no setor informal.
Comércio popular na rua 25 de Março em São Paulo
  Com o empobrecimento de uma grande parcela da população, o processo de urbanização caracterizou-se pelo aumento das desigualdades sociais, imprimindo uma forte segregação socioespacial no interior das cidades, principalmente nas de médio e grande porte.
METRÓPOLES: CENTROS DE DECISÕES
  Ainda que os grandes centros urbanos do Centro-Sul sejam palco de profundos contrastes socioeconômicos, observa-se nessa região, como consequência do desenvolvimento da atividade industrial, um intenso processo de diversificação das atividades ligadas ao setor terciário (comércio e serviços) e um incremento daquelas relacionadas à área educacional e científica (com a implementação de faculdades, universidades e centros de pesquisa). O crescimento do volume das atividades ligadas à área administrativa-financeira transforma os grandes centros urbanos desse complexo regional em sedes de grandes corporações nacionais e multinacionais, de organizações estatais, de importantes instituições financeiras, como bancos, bolsas de valores e empresas de crédito e letras de câmbio, assim como de empresas ligadas à produção cultural e artística, como editoras, redes de televisão, jornais e outros segmentos da mídia. Por tudo isso, o Centro-Sul é considerado a região polarizadora das decisões econômicas, políticas e administrativas do país.
Bovespa - a maior bolsa de valores do Brasil
FONTE: Boligian, Levon. Geografia espaço e vivência, volume único / Levon Boligian, Andressa Turcatel Alves Boligian. -- 3. ed. -- São Paulo: Atual, 2011.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

OS FLUXOS E O SISTEMA DE TRANSPORTE

  O sistema de transporte é um elemento fundamental das economias nacionais. Os custos de deslocamento incidem sobre os custos das matérias-primas e dos produtos finais destinados aos mercados internos ou à exportação. Sistemas de transportes caros e ineficientes reduzem o potencial de geração de riquezas e a competitividade dos países. No Brasil, o desenho do sistema de transporte reflete as desigualdades regionais.
REDES DE TRANSPORTE: RUGOSIDADES ESPACIAIS
  Nas paisagens coexistem formas espaciais, objetos produzidos pelo trabalho humano em diferentes momentos históricos. Por mais velozes que sejam as mudanças na sociedade, esses objetos nunca são destruídos ou substituídos por outros ao mesmo tempo. Ao contrário, alguns processos novos se adaptam às formas espaciais preexistentes, e a elas atribuem novos papéis. Isso acontece, por exemplo, quando uma região fabril é desativada e os velhos galpões são reaproveitados para novos fins, como grandes restaurantes, danceterias ou áreas de promoção cultural; ou quando uma antiga área portuária se transforma em polo de turismo ou lazer.
Estação das Artes Elizeu Ventania em Mossoró - RN. Antigo prédio do Sistema Ferroviário Federal, foi recuperado pela Petrobras e hoje abriga a maior parte das festas e eventos sociais da cidade.
  O geógrafo Milton Santos chama de "rugosidades" essas formas espaciais produzidas para atender necessidades do passado, mas que resistiram aos processos de transformação social e econômico e continuam a desempenhar um papel  ativo no presente. É o que ocorre, por exemplo, com as redes nacionais de transporte - espelhos dos diferentes modelos de organização da economia que se sucederam ao longo da história de um país.
  No Brasil, as rodovias dominam a matriz de transportes. O sistema rodoviário responde por 59% da matriz, em contraste com os 24% das ferrovias e os 17% das hidrovias e outros meios somados. Para efeitos de comparação com o Brasil, um país também de dimensões continentais como o Canadá tem 46% de ferrovias, 43% de rodovias e 11% de hidrovias e outros. A opção pelas rodovias, responsáveis pelos elevados custos de deslocamento que vigoram no país, foi realizada no contexto da acelerada industrialização que teve lugar em meados do século passado.
Ferrovia Transiberiana - maior ferrovia do mundo, corta a Rússia de leste a oeste
  No final do século XIX e início do século XX, porém, o modelo de transporte adotado no Brasil contemplava, basicamente, as necessidades da economia agroexportadora. Nesse período, o trem era o meio de transporte mais típico. O traçado das redes regionais interligava as áreas produtoras de mercadorias tropicais aos portos, pelos quais a produção era escoada para o mercado externo. No caso da malha ferroviária paulista, que estava a serviço do café, havia uma abertura em leque para as terras do interior e um afunilamento na direção do Porto de Santos.
  Essas redes configuravam as estruturas de "bacia de drenagem", pois se destinavam a escoar produtos minerais e agrícolas para os portos, de onde eles seguiam rumo aos mercados internacionais. Os planos de desenvolvimento de transportes visavam integrar as ferrovias com as hidrovias, uma vez que os rios eram bastante utilizados para a circulação regional. Um plano esboçado pelo engenheiro militar Eduardo José de Moraes ainda no século XIX tinha como objetivo criar um sistema hidroviário integrado.
  Com a emergência da economia urbano-industrial, as ferrovias e hidrovias foram paulatinamente perdendo importância para a rede rodoviária. Na década de 1930 esboçou-se uma nova diretriz na política nacional de transporte, que passou a privilegiar a construção de grandes rodovias. Washington Luís, presidente da República entre 1926 e 1930, adotou como lema de seu mandato a frase "governar é construir estradas". Nas décadas seguintes, essa política seria fortalecida pela criação da Petrobras e pelo desenvolvimento da indústria automobilística.
  A opção rodoviária, adotada naquela época, é atualmente uma das maiores dificuldades logísticas do país, pois teve como resultado um sistema de transporte caro e ineficiente, que traz impactos negativos tanto para a economia quanto para o meio ambiente.
Mapa rodoviário do Brasil
  Embora no Brasil existam grandes extensões de rios navegáveis, o país não dispõe de um sistema hidroviário. O sistema ferroviário, praticamente abandonado nos últimos 80 anos, hoje apresenta enormes trechos desativados ou subaproveitados.
  No que diz respeito às rodovias, apesar da presença de estradas modernas e construídas com os mais avançados recursos da engenharia, predominam os trechos esburacados e em péssimas condições. Cerca de 16% delas foram privatizadas e receberam investimentos nas últimas décadas, ainda que tenham se tornado extremamente caras tanto para os carros de passeio quanto para os caminhões de carga, em virtude das elevadas tarifas de pedágio.
  Entre as rodovias públicas, cerca de 80% da malha foi classificada como deficiente, ruim ou péssima por uma pesquisa da Confederação Nacional do Transporte (CNT).
BR-230 (Transamazônica) - Trecho entre Altamira e Marabá, no Pará
  A situação da maior parte da malha ferroviária brasileira também é bastante precária. Enquanto a maioria dos países desenvolvidos dispõe de um sistema ferroviário moderno, que permite tráfego das locomotivas de até 300 km/h, os trilhos no Brasil têm mais de 100 anos, e por eles passam trens vagarosos.
  Além disso, muitos trechos da malha foram cercados por cidades: um levantamento feito pela MRS Logística, que opera a malha sudeste da antiga Rede Ferroviária Federal, aponta a existência de 11.000 cruzamentos com estradas no Brasil. A necessidade de desacelerar nos trechos próximos a cidades e estradas obriga os trens de carga brasileiros a andarem numa velocidade de 25 km/h, ao passo que em outros países a velocidade média é de 80 km/h.
Grande parte da rede ferroviária do Brasil encontra-se sucateada
  Atualmente, onze linhas férreas estão convertidas em atrações turísticas. A maior delas, com 664 km de extensão é a que liga a capital do Espírito Santo, Vitória, à capital mineira. A menor, com somente 4 km, fica na cidade do Rio de Janeiro: o Trenzinho do Corcovado.
  Em muitos casos, a transformação de trechos ferroviários desativados em caminhos turísticos foi iniciativa dos apaixonados por trens; gente que gostava de ver as locomotivas correr sobre os trilhos e lembrar com saudade da época áurea do transporte ferroviário de passageiros no país. Reunidos em associações, esses militantes preservam a memória ferroviária brasileira, recuperam locomotivas e vagões e procuram colocá-los novamente em atividade.
Trem Turístico puxado por uma "Maria Fumaça" que liga São João Del Rey a Tiradentes - MG
  Algumas rodovias brasileiras desempenharam (e ainda desempenham) papel estratégico na integração do território nacional.
  O Nordeste e o Sul do país foram conectados ao Sudeste por meio da BR-116 e, depois, da BR-101. Nas décadas de 1950 e 1960, as capitais do Centro-Oeste e Brasília foram ligadas ao Sudeste.
  Em seguida, Brasília e Cuiabá tornaram-se os trampolins para a integração da Amazônia com o restante do território brasileiro. Os eixos principais foram a BR-153 (Belém-Brasília) e a BR-364, que parte de Mato Grosso e abre caminho para Rondônia e o Acre. Um eixo secundário é a BR-163 (Cuiabá-Santarém), cuja pavimentação se interrompe antes da divisa setentrional de Mato Grosso e só é retomada nas proximidades de Santarém.
Trecho da BR-010 (Belém-Brasília) em Dom Eliseu (PA)
  Na década de 1980, a crise financeira do Estado brasileiro teve efeitos devastadores sobre a vasta malha rodoviária. Com a capacidade de investimentos bastante reduzido, o governo federal simplesmente deixou de realizar a manutenção das estradas, que, sob o peso dos caminhões de carga e dos efeitos erosivos da chuva e do sol quente, se deterioraram em pouco tempo.
  O péssimo estado de conservação das rodovias brasileiras não prejudica apenas os usuários de transporte de passageiros, mas também o ramo de transporte de cargas, que tem muito mais gastos com a manutenção de caminhões. Além disso, a existência de trechos intransitáveis e a falta de maior integração entre as redes de transporte, exigem trajetos mais longos e complicados, o que resulta em mais poluição e mais gastos com combustíveis, além de uma maior exposição a acidentes.
Condições das rodovias federais de acordo com uma pesquisa feita em 2010 pela CNT
  Na década de 1990, a administração de inúmeras rodovias federais e estaduais passou ao controle de concessionários privados, garantindo a modernização e expansão das ligações viárias que servem principalmente aos eixos de circulação do Sudeste. Entre esses empreendimentos destacam-se as grandes rodovias paulistas, como os sistemas Anhanguera-Bandeirantes (entre São Paulo e Campinas), Anchieta-Imigrantes (entre São Paulo e a Baixada Santista) e Dutra-Ayrton Senna (entre São Paulo e o Vale do Paraíba).
Rodovia dos Bandeirantes - trecho São Paulo-Cordeirópolis
AS ESTRADAS DA GLOBALIZAÇÃO
  Nos últimos anos, o Brasil tem realizado um enorme esforço para aumentar sua participação no comércio internacional. Entretanto, o predomínio das rodovias e a precária integração entre os diferentes modos de transportes geram elevados custos de deslocamento, que dificultam a chegada dos produtos brasileiros aos mercados externos. Por isso mesmo, uma parcela significativa do orçamento e das obras previstas no Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), anunciado em 2007, está voltado para o setor. Essas obras destinam-se a configurar uma nova estrutura em "bacia de drenagem", por meio de empreendimentos ferroviários e hidroviários. A perspectiva do Plano Nacional de Logística e Transporte (PNTL), do Ministério dos Transportes, é alcançar em 2015 o equilíbrio entre os três sistemas, com a seguinte repartição: rodoviário, 33%; hidroviário, 29%.
Obras do PAC na BR-101 no município de Goianinha - RN
  Alguns dos principais empreendimentos destinam-se a facilitar o escoamento da agropecuária modernizada do Centro-Oeste, na Amazônia meridional e no leste do Pará. O centro e o sul do Mato Grosso do Sul já estão conectados aos portos de Santos e Paranaguá por meio das ferrovias Noroeste do Brasil, Novoeste e Ferropar. Os trilhos da Ferronorte alcançaram a porção setentrional do Mato Grosso do Sul e, numa segunda etapa, devem atingir Cuiabá e Porto Velho. O ramal ferroviário Cuiabá-Santarém é um projeto de longo prazo, mas o trecho paraense da rodovia que liga essas duas cidades estão sendo asfaltado.
  A conclusão da segunda etapa da Ferronorte representará uma dupla conexão das áreas agrícolas do oeste do Mato Grosso e de Rondônia. Ao sul, a produção será escoada pelos portos de São Paulo e do Paraná, ou através da Hidrovia do Rio Paraná, rumo à Argentina. Ao norte, seguirá pela Hidrovia do Madeira até chegar ao Rio Amazonas, de onde seguirá para o oceano. A estrada de ferro também servirá para aliviar o fluxo que passa pela BR-364.
Ferrovia Ferronorte
  A Ferrovia Norte-Sul destina-se a escoar a produção agropecuária de uma vasta área que se estende pelo oeste baiano, Goiás, Tocantins e nordeste de Mato Grosso. A estrada de ferro está conectada às rodovias e ferrovias do Sudeste. Do outro lado, tanto a ferrovia quanto a hidrovia projetada interligam-se à Estrada de Ferro Carajás, que transporta minérios e grãos para o porto de Itaqui, no Maranhão. O novo eixo ferroviário em construção tende a reduzir o transporte de cargas pela BR-153.
Ferrovia Norte-Sul
  Os investimentos não estão ocorrendo apenas no ramo ferroviário. Desde 2007, o Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes (DNIT) está preparando uma espécie de "PAC das hidrovias", que prevê investimentos de até R$ 18 bilhões nos próximos anos.
  A mais importante entre essas obras é a ampliação da Hidrovia Tietê-Paraná. A intenção do governo é ampliar o trecho navegável, dos atuais 800 para 2.000 km. A capacidade de transporte de carga aumentaria de 5 milhões para 30 milhões de toneladas por ano. Outra vantagem é que a hidrovia terminaria a uma distância de apenas 150 km do Porto de Santos (hoje essa distância é de 310 km).
HidroviaTietê-Paraná
  A segunda obra em análise é a ampliação da Hidrovia do Tocantins-Araguaia. O primeiro trecho da obra contempla a construção da eclusa de Tucuruí, que dará ao Rio Tocantins 700 km navegáveis. No futuro, pretende-se fazer mais três eclusas, elevando a distância navegável para 2.200 km.
  O terceiro projeto trata-se do projeto da implantação da Hidrovia Teles Pires-Tapajós, que demandará investimentos de R$ 5 bilhões para ampliar a navegabilidade do rio de 300 km para 1.500 km.
Hidrovia Tocantins-Araguaia
A INTEGRAÇÃO INTERMODAL
  A nova política de transportes não representa uma mera substituição da prioridade rodoviária pela ênfase nas ferrovias e hidrovias. A configuração de uma estrutura de "bacia de drenagem" capaz de contribuir para a inserção competitiva do país na economia globalizada depende da integração intermodal - ou seja, entre diferentes modos de transporte.
  As cargas devem ser transferidas, com eficiência e baixos custos, entre caminhões, vagões ferroviários e comboios fluviais. Isso exige a construção de terminais intermodais e terminais especializados junto às ferrovias, hidrovias e portos marítimos. Os trabalhos de ligações intermodais desenvolvem-se em todas as regiões. Um exemplo é a ligação da Ferrovia Norte-Sul ao Porto de Santos, que deverá facilitar o escoamento da safra de grãos do Centro-Oeste.
  Os portos marítimos e fluviais nos quais atracam embarcações de longo curso representam os elos principais entre o sistema nacional de transporte e o mercado mundial. Segundo o Ministério dos Transportes, existem no país 40 portos públicos, basicamente operados pelo setor privado. Do ponto de vista da movimentação de cargas, os maiores portos brasileiros são dois grandes terminais exportadores de minérios e produtos siderúrgicos: Tubarão, no Espírito Santo, e Itaqui, no Maranão. Ambos prestam serviços para a Companhia Vale do Rio Doce (Vale), a maior empresa mineradora do país e uma das maiores do mundo.
Os principais portos do Brasil
  No litoral Sudeste encontra-se a maior concentração de portos de intenso movimento, com destaque para o Porto de Santos, que movimenta principalmente produtos industrializados. Na Região Sul, destacam-se as exportações agropecuárias de Paranaguá e Rio Grande.
  Os custos portuários brasileiros chegaram a figurar entre os mais elevados do mundo, em razão da fraca mecanização das operações de embarque e desembarque e da intrincada burocracia administrativa. Faltam equipamentos para movimentar a carga, há poucos estacionamentos para os caminhões e os armazéns são insuficientes. Desse modo, congestionamentos e atrasos tornam-se rotina, o que dificulta a vida de quem exporta. Nesse setor, porém, a maior parte dos investimentos está sendo realizada pelo setor privado, que já controla cerca de 80% da movimentação portuária nacional.
Fila de carretas em direção ao Porto de Paranaguá - PR
  Os investimentos em infraestrutura de transporte estão gerando novos polos de crescimento econômico e acendem disputas pela atração de investimentos. No Nordeste, dois novos e modernos portos foram empreendimentos prioritários dos governos estaduais na década de 1990: Suape, em Pernambuco, e Pecém, no Ceará. Em torno deles, surgiram, graças a generosos incentivos fiscais, distritos industriais com vocação exportadora.
O TRANSPORTE INTRAURBANO
  As últimas décadas conheceram uma verdadeira explosão nas taxas de motorização individual. Entre os países desenvolvidos, essa taxa varia de cerca de 350 mil automóveis por mil habitantes da Dinamarca até 500 ou mais na Alemanha, Itália e nos Estados Unidos. Nos países subdesenvolvidos industrializados, ela é bem menor, em torno de 100 a 200 automóveis por mil habitantes, embora esteja crescendo em ritmo acelerado.
  Nas cidades brasileiras com mais de 60 mil habitantes, por exemplo, a taxa de motorização passou de 171 veículos/mil habitantes em 2003 para 206 veículos/mil habitantes em 2007. Por isso, e apesar dos programas  de redução de poluentes de veículos, a quantidade de poluentes emitidos pelos habitantes dessas cidades apresentou aumento de 2,3% no período.
  A poluição atmosférica causada pelos veículos acarreta distúrbios de saúde em vastas camadas da população. A poluição sonora e os acidentes de tráfego também fazem parte da lista dos problemas gerados pelo crescimento intensivo do transporte individual.
Ar bastante poluído na cidade de São Paulo - SP
  No mundo todo houve expansão da motorização individual, ao passo que o uso dos transportes públicos experimentou estagnação, ou mesmo declínio. Nas metrópoles brasileiras, carentes de adequados sistemas de transporte público, o automóvel tende a substituir os deslocamentos a pé ou em bicicletas.
  Desde a década de 1960, as estratégias voltadas para reduzir a crise do tráfego urbano concentraram-se na multiplicação das obras viárias: pistas expressas, vias elevadas, viadutos, túneis, anéis periféricos. Essas estratégias, extremamente caras, desfiguram grande parte da paisagem urbana, ampliaram o espaço consumido pelas infraestruturas de circulação, deterioraram áreas residenciais, parques e praças e fracassaram: o aumento da oferta de vias de tráfego estimulou o crescimento, num ritmo ainda maior, da quantidade de veículos e das distâncias percorridas.
A falta de investimentos em transporte público, obriga a população a andar em ônibus cada vez mais lotados nas grandes cidades
  A experiência do passado recente revelou que novas infraestruturas de circulação geram seus próprios congestionamentos. Assim, surgiram propostas para enfrentar o desafio do tráfego urbano que buscam combinar investimentos nos transportes de massa com restrições ativas à circulação de veículos particulares. No Brasil, as experiências de limitação do tráfego de automóveis abrangem principalmente proibições parciais de circulação, por meio de sistemas de rodízios. O automóvel, antigo ícone da liberdade de deslocamento, tornou-se símbolo das mazelas da vida urbana.
FONTE: Terra, Lygia. Conexões: estudos de geografia geral e do Brasil / Lygia Terra, Regina Araújo, Raul Borges Guimarães. -- 1. ed. -- São Paulo: Moderna, 2010.

segunda-feira, 9 de julho de 2012

O CONSENSO DE COPENHAGEN

  Bjorn Lomborg é o pesquisador dinamarquês que coordena o ciclo anual de debates sobre mudanças globais conhecido por "Consenso de Copenhagen". Apesar de esse grupo de estudiosos aceitar os dados de aumento da temperatura global calculados pelo IPCC, ele estabelece outras prioridades para enfrentar o problema: créditos de emissões.
  O Consenso de Copenhagen é um projeto iniciado em 2004 que visa estabelecer as prioridades para promover o bem-estar da humanidade com base na teoria do bem estar, iniciada por Bjorn Lomborg, autor do livro O Ambientalista Cético e diretor do Instituto Avaliação Ambiental da Dinamarca.
Bjorn Lomborg
  O projeto inicial é apoiado financeiramente pelo Governo dinamarquês e pela revista The Economist.
  As prioridades e as soluções propostas nesse consenso são relativas ao aquecimento global, as doenças infecciosas, as guerras, a educação, a crise financeira, a corrupção dos governos, a luta contra a desnutrição e a fome, a migração humana, o saneamento, especialmente das águas, os subsídios e as barreiras tarifárias.
  "Com uma linguagem de 'medo, terror e desastre', a mudança climática chamou o máximo da nossa atenção. Afirmo, porém, que precisamos esfriar um pouco a cabeça. Queremos ajudar o mundo - ótimo. Mas ninguém garante que a melhor forma de fazê-lo seja cortar CO2. O que temos visto é que existem várias outras áreas nas quais é possível gerar muito mais benefícios de forma mais rápida e mais barata. Uma tentativa como o Protocolo de Kyoto - que consumiu boa parte da vontade política mundial durante a última década e que irá custar US$ 180 bilhões anuais caso seja cumprido plenamente, mas produzirá pouquíssimos benefícios até o final do século - ilustra bem esse argumento [...] Teremos, primeiramente, de atacar problemas triviais, porém, difíceis, como a necessidade de uma reforma agrícola, a recuperação de pantanais para minimizar o risco de inundações, o fim do seguro subsidiado em zonas de furacão e a maior disponibilidade de cuidados médicos e aparelhos de ar-condicionado. Esses assuntos soaram prosaicos em comparação à excitante tarefa de discutir a mudança climática e seus impactos globais ao longo dos próximos séculos, mas a solução promoverá enorme benefício para os seres humanos e para a natureza, dentro de prazos realistas e por meio de financiamentos plausíveis [...] Espero que esfriemos nosso debate, que seguremos a rédea dos exageros e comecemos a nos concentrar nas searas do que é possível promover o máximo de benefícios. Isso não significa cruzar os braços diante da mudança climática, mas sim, abrir um diálogo franco sobre seus efeitos e as possíveis soluções, uma conversa a respeito de quais deveriam ser nossas prioridades [...] Espero que possamos olhar as próximas gerações nos olhos e dizer que não fizemos apenas o que a moda encarava como nobre, mas que melhoramos maciça  e meticulosamente o mundo por meio de estratégias simples, testadas e boas."
Copenhagen - Dinamarca
FONTE: LOMBORG, Bjorn. Cool it - Muita calma nessa hora! Rio de Janeiro: Elsevier, 2008. p. 130-131.

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