domingo, 14 de agosto de 2022

A GUERRA CIVIL NA SÍRIA

  O conflito na Síria se iniciou no final de 2011 e se arrasta até os dias atuais. Tem como principal características: a) ser uma guerra civil descentralizada, b) possuir várias frentes de luta e, c) sofrer a interferência de potências mundiais e regionais, em especial Estados Unidos, de um lado, e Rússia, de outro.
  Tudo começou em Daraa, uma cidadezinha ao sul da Síria, onde uma manifestação pró-democracia foi duramente reprimida pelo governo sírio. Isso desencadeou uma onda de protestos por todo o país, que se intensificou após março de 2011, quando jovens sírios foram presos e torturados por escreverem suas ideias antigovernistas em um muro da cidade.
  A partir de então, a onda revolucionária se avolumou e se formaram diferentes grupos rebeldes: uns favoráveis à maior participação democrática, outros fundamentalistas e extremistas como o Estado Islâmico e a Al Qaeda, outros, ainda, com postura etnocêntrica e separatista, a exemplo dos curdos. Em comum, esses grupos tinham o objetivo de derrubar o presidente da Síria, Bashar al-Assad.
A região da Síria no Oriente Médio
Causas do Conflito
  A Síria é governada pela família al-Assad desde a década de 1970 de maneira ditatorial. Bashar al-Assad só assumiu o país em 2000, após a morte de seu pai, Hafez al-Assad. O governo de Bashar sofreu inúmeras críticas pela corrupção e pela falta de liberdade política. Essas críticas tomaram novas proporções com a Primavera Árabe.
  No começo de 2011, a população síria manifestou sua insatisfação com o governo do presidente Bashar al-Assad. A Primavera Árabe aconteceu quando a população de vários países árabes manifestou-se, exigindo democracia e melhores condições de vida em seus países. Os protestos iniciaram-se no final de 2010 na Tunísia, e espalharam-se por outros países, como Líbia e Egito. Na Síria, os protestos iniciaram-se em março de 2011, na cidade de Deraa, no sul do país. A resposta do governo sírio foi violenta, o que motivou novas rebeliões em diferentes partes do país, como na capital, Damasco, e em Aleppo, sua maior cidade.
  As primeiras manifestações contra o governo de Bashar al-Assad aconteceram em uma escola de Deraa, quando estudantes menores de 15 anos começaram a pichar palavras contra o presidente. A polícia secreta síria foi mobilizada para prendê-los. Posteriormente, esses estudantes presos foram brutalmente torturados no interrogatório conduzido contra eles.
  A prisão dos estudantes e a insatisfação da população motivaram novos protestos e, à medida que a repressão do governo contra os protestos populares aumentava, mais protestos eram organizados. Logo se formaram grupos de resistência que se transformaram em milícias armadas, cujo objetivo era, primeiro, garantir sua defesa contra a repressão do governo e, segundo, garantir a derrubada de Bashar al-Assad.
  Esses exércitos rebeldes foram inicialmente formados por civis e militares desertores que não concordavam com o trato violento que a população do país estava recebendo.
Um manifestante anti-Assad grafitando na parte de um prédio a frase "Derrubem al-Assad", em maio de 2011
Crescimento da guerra civil
  A ONU e a Liga Árabe movimentaram-se para buscar saídas diplomáticas ao conflito, entretanto, os cessar-fogos negociados nunca foram respeitados. Assim, a escalada da violência na Síria tomou proporções de guerra civil.
  Nesse momento, a principal força rebelde era o Exército Livre da Síria (ELS), que surgiu em julho de 2011, e era formado, principalmente, por soldados desertores. Esse grupo possuía características seculares (não estava sujeito a nenhuma ordem religiosa) e, portanto, era considerado um grupo rebelde moderado, mas, com o tempo, o ELS passou por uma alteração ideológica, aderindo a ideias fundamentalistas.
  A partir de 2012, o ELS perdeu força e, desde 2016, esse grupo passou a ser abertamente dependente do apoio oferecido pela Turquia. A oposição rebelde na Síria também contou com grupos extremistas de tendência jihadista, como o Hayat Tahri al-Sham, anteriormente conhecido como Fateh al-Sham, e Frente al-Nusra.
Soldados do Exército Livre da Síria reunidos durante a Batalha pela cidade de Aleppo
  A partir de 2013, o Estado Islâmico, antigo braço iraquiano da Al-Qaeda, aproveitou-se da instabilidade da Síria e aderiu a grupos rebeldes de jihadistas sunitas. Entretanto, como o Estado Islâmico cresceu rapidamente, ele se autoproclamou um califado em territórios na Síria e no Iraque. A guerra, que havia começado por razões políticas, tomou proporções religiosas.
  Outras frentes de guerra surgiram com pequenos grupos rebeldes, principalmente de tendências fundamentalistas. Entretanto, a atuação do Estado Islâmico e do Hayat Tahrir al-Sham diminuiu consideravelmente nos últimos anos devido o enfraquecimento de ambos. Atualmente, a Tharir al-Sham tem forte presença no norte da Síria e, o Estado Islâmico, apesar de muito enfraquecido, ainda é uma ameaça para o país. Observadores internacionais temem um retorno dessa organização terrorista.
Portando cartazes e bandeiras nacionais, sírios protestam contra o governo em Damasco, capital da Síria, em 8 de abril de 2011
  Outro grupo que teve destaque na guerra civil travada na Síria foram os curdos, que se mobilizaram para o conflito a partir de 2014, quando o Estado Islâmico passou a perseguir a minoria curda no país. As tropas curdas atualmente mantêm o controle ao norte da Síria, na região chamada Rojava ou Federação Democrática do Norte da Síria.
  Como a guerra foi sendo travada entre diferentes grupos, o conflito espalhou-se por diversas frentes. Assim, mudanças e movimentações das tropas aconteceram (e ainda acontecem) com grande frequência na Síria.
Mapa da guerra civil na Síria
Mobilização estrangeira
  A guerra civil na Síria se tornou um conflito de grandes proporções, principalmente em razão da interferência estrangeira no país. Diversos países envolveram-se direta ou indiretamente no conflito, financiando determinados grupos. Assim, o mundo assistiu a Síria se tornar palco de disputa de interesses entre nações.
  O governo sírio possui o apoio da Rússia e do Irã, que enviam, além de armas e dinheiro, tropas. O Exército Livre da Síria e o exército curdo recebem o apoio dos Estados Unidos, que se opõem a Bashar al-Assad, mas, principalmente, ao avanço do Estado Islâmico.
  Além disso, a Turquia também financia o Exército Livre da Síria, mas luta abertamente contra o exército curdo, devido os curdos serem uma minoria perseguida no território turco. Observadores internacionais acreditam que o envolvimento da Turquia na guerra se deve pelo interesse dela em enfraquecer os curdos, em se tornar uma potência protagonista no Oriente Médio, além de tentar expandir seu território, aproveitando-se da instabilidade na Síria.
  Outros países que atuaram direta ou indiretamente no conflito foram Arábia Saudita, Reino Unido, França e Israel.
Situação atual da Síria:
  •   Áreas sob controle do governo sírio
  •   Áreas sob controle de forças curdas
  •   Áreas sob controle do Exército Sírio e das Forças Democráticas Sírias (FDS)
  •   Áreas sob controle do ELS
  •   Exército Revolucionário Comando & zona de ocupação americana
  •   Áreas sob controle da Tahrir al-Sham
  •   Grupos de oposição em reconciliação
  •   Áreas sob controle do Estado Islâmico
Consequências
  Ao longo de 10 anos, a Guerra Civil Síria deixou consequências graves para esse país do Oriente Médio. A guerra foi responsável por destruir a infraestrutura do país, colocou grande parte da população local em situação de pobreza e foi responsável pela morte de milhares de pessoas.
  Atualmente, fala-se que a guerra civil na Síria foi responsável pela morte de mais de 600 mil pessoas. Fala-se também em cerca de dois milhões de pessoas que foram feridas ao longo da guerra. Entre essas pessoas, milhares ficaram com algum tipo de deficiência física permanente. Outra consequência foi a grande quantidade de pessoas que foram forçadas a abandonar as suas casas. Estima-se que, aproximadamente, 13 milhões de sírios abandonaram suas casas, dos quais, sete milhões optaram por fugir do país. Desse total, mais da metade se refugiou no interior da Turquia, o país no mundo que mais recebeu refugiados sírios. A migração de milhões de sírios para a Europa resultou no que ficou conhecido como crise dos refugiados.
Prédios destruídos em Saadallah al-Jabiri, na cidade de Aleppo, devido a um atentado à bomba, em outubro de 2012 
  A guerra colocou milhares de pessoas em situação delicada, e muitos têm dificuldade de obter alimentos. Milhares de crianças tiveram suas chances de construir um futuro melhor destruídas ao ficarem sem educação, e milhões de sírios sofrem com a destruição do sistema de saúde do país ao longo dos mais de 10 anos de guerra.
  Os bombardeios que o país sofreu durante esse conflito fizeram com que cidades, como Aleppo, ficassem inteiramente destruídas. A Síria ainda presenciou a destruição do seu patrimônio histórico cultural, com destaque para Palmira, que teve sítios arqueológicos importantíssimos sendo destruídos pelo Estado Islâmico.
Visão panorâmica do Sítio Arqueológico de Palmira, que foi destruído pelas tropas rebeldes do Estado Islâmico
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
ANDRADE, George Bronzeado de. A guerra civil Síria e a condição dos refugiados: um antigo problema, "reinventado" pela crueldade de um conflito marcado pela inação da comunidade internacional. Revista de Estudos Internacionais. João Pessoa, v. 2, 2011.
BRANCOLI, Fernando. Primavera Árabe - praças, ruas e revoltas. São Paulo: Desatino, 2013.
COSTA, Fernando Nogueira da. Conflito Histórico-Religioso na Síria. Disponível em: <http://fernandonogueiracosta.wordpress.com/2013/02/15/conflito-historico-religioso-na-siria/>. Acesso em: 10/08/2022.
DEMANT, Peter. O mundo muçulmano. 3ª edição. São Paulo: Contexto, 2013.
PUDDEPHATT, Andrew. As revoluções árabes e a comunicação digital. Política Externa, São Paulo, 20 n. 1, junho 2011.
SILVA, Daniel Neves. "Guerra Civil Síria"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/geografia/conflito-na-siria-primavera-que-nao-consegue-se-estabelecer.htm. Acesso em 10 de agosto de 2022.
VISENTINI, Paulo. O grande Oriente Médio: da descolonização à primavera árabe. Rio de Janeiro: Elsevier, 2014.

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