domingo, 8 de março de 2020

OS QUILOMBOLAS E OS QUILOMBOS

  Para fugir dos maus-tratos e da submissão do colonizador, os escravizados resistiram de diversas maneiras. Uma delas foi a formação de quilombos, para onde negros, além de indígenas e mestiços fugiam. Nos quilombos, considerados fortalezas escondidas no meio da mata, eles se organizavam, plantavam, criavam animais e viviam em liberdade.
  A palavra "quilombo" tem origem nos termos "kilombo" (Quimbundo) e "ochilombo" (Umbundo), estando presente também em outras línguas faladas ainda hoje por diversos povos Bantus que habitam a região de Angola, na África Ocidental. Originalmente, designava apenas um lugar de pouso, utilizado por populações nômades ou em deslocamento. Posteriormente, passou a designar também as paragens e acampamentos das caravanas que faziam o comércio de cera, escravos e outros itens cobiçados pelos colonizadores. Significava também "acampamento guerreiro", capital, povoação, união. Porém, foi só no Brasil que o termo "quilombo" ganhou o sentido de comunidades autônomas de escravos fugitivos. Os moradores dessas comunidades são chamados de quilombolas.
Comunidade quilombola de Curiaú, no Amapá
  No Brasil houve diversos quilombos, tanto pequenos quanto grandes. Parte da produção quilombola era usada para a sobrevivência da sua população, parte era comercializada com comunidades vizinhas.
  O quilombo mais conhecido, sempre lembrado pelos livros de história, foi Palmares, instalado na Serra da Barriga, em Alagoas, mas pelo menos dois mil outros deram origem a comunidades hoje chamadas de remanescentes de quilombo ou quilombolas.
  Os quilombos eram entendidos pelo Conselho Ultramarino do governo português de 1740 como "todo agrupamento de negros fugidos que passe de cinco, ainda que não tenham ranchos levantados em parte despovoada nem se achem pilões neles".
  Alguns quilombos se formaram a partir da compra de muitas terras de escravos alforriados, alguns receberam áreas por meio de herança, outros grupos se mantiveram em fazendas decadentes.
  Os escravos fugiam das fazendas entre os séculos XVI e XIX e se abrigavam nos quilombos para se defenderem do sistema escravista e resgatarem a cosmovisão africana e os laços de família perdidos com a escravização. Neles existiam manifestações religiosas e lúdicas, como a música e a dança.
Comunidade quilombola Boa Vista dos Negros, em Parelhas (RN)
  De acordo como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), atualmente existem cerca de 3 mil comunidades quilombolas. Os moradores dessas comunidades lutam para obter o direito às terras que vêm sendo ocupadas desde o tempo de escravização. Visam, assim, garantir sua sobrevivência, sem perder suas tradições e seu modo de vida. Atualmente, as comunidades quilombolas passam por um processo de reconhecimento legal de sua existência por parte dos governos nacionais e das organizações internacionais.
  As comunidades quilombolas, de acordo com certos critérios, podem pleitear ao Estado brasileiro:
  • o reconhecimento oficial como comunidade quilombola, pela Fundação Cultural Palmares;
  • o título de propriedade da terra, como consta na Constituição Federal de 1988;
  • o acesso ao projeto de sustentabilidade, preservação e valorização de seus patrimônios histórico-culturais, assegurados nos Artigos 214, 215 e 216 da Constituição do Brasil.
Mapa do Brasil sobre a distribuição das comunidades quilombolas
O Quilombo dos Palmares
  o Quilombo dos Palmares foi o mais importante quilombo da era colonial brasileira. Localizava-se na Serra da Barriga, na então Capitania de Pernambuco, região hoje pertencente ao município de União dos Palmares, no estado de Alagoas.
  O auge do Quilombo dos Palmares ocorreu na segunda metade do século XVII, constituindo-se no mais emblemático dos quilombos formados no período colonial. Resistiu por mais de um século e se transformou em um símbolo de resistência do africano à escravidão. Seu primeiro líder foi Ganga Zumba (Grande Senhor), um escravo nascido no Reino do Congo por volta de 1630, e sucedido por seu sobrinho Zumbi, que foi um dos pioneiros na resistência contra a escravidão na América.
Mirante da Serra da Barriga
  À época das invasões holandesas no Brasil (1624-1625 e 1630-1654), com a perturbação causada nas rotinas dos engenhos de açúcar, registrou-se um crescimento da população em Palmares, que passou a formar diversos núcleos de povoamento (mocambos), nos quais os principais foram:
  • Cerca Real do Macaco - o maior centro político do quilombo, contando com cerca de 1.500 habitações;
  • Subupira - centralizava as atividades militares, contando com cerca de 800 habitações;
  • Zumbi - era o líder do povo. Tornou-se símbolo da luta dos afro-brasileiros contra a opressão e a discriminação;
  • Dandara - esposa de Zumbi, liderava as falanges femininas do exército palmarino.
Zumbi dos Palmares (1655-1695)
  Segundo historiadores, em 1670 a população do Quilombo dos Palmares chegou a 20 mil pessoas. Essa população sobrevivia graças à caça, à pesca, à coleta de frutas (goiaba, caju, abacate, entre outras) e à agricultura (feijão, milho, mandioca, banana, laranja e cana-de-açúcar). Praticavam também o artesanato (cestos, tecidos, cerâmica, metalurgia), onde os excedentes eram comercializados com as populações vizinhas, e os colonos chegavam a alugar terras para o plantio e a trocar alimentos por munição com os quilombolas.
  Com a expulsão dos holandeses do Nordeste do Brasil, acentuou-se a carência de mão de obra para a retomada de produção dos engenhos de açúcar da região. Dado o elevado preço dos escravos africanos, os ataques a Palmares aumentaram, visando a recaptura de seus integrantes.
Lagoa Encantada dos Negros
  A prosperidade de Palmares atraía a atenção e receio, e o governo federal sentiu-se obrigado a tomar providências para afirmar o seu poder sobre a região. Em carta à Coroa Portuguesa, um governador-geral reportou que os quilombos eram mais difíceis de vencer do que os holandeses.
  Foram necessários cerca de 18 expedições, organizadas desde o período de dominação holandesa, para erradicar definitivamente o Quilombo dos Palmares. Após várias investidas, o governador e capitão-general da Capitania de Pernambuco, Caetano de Melo e Castro, contratou o bandeirante Domingos Jorge Velho e o capitão-mor Bernardo Vieira de Melo para erradicar de vez a ameaça dos escravos fugitivos na região. O quilombo passou a ser atacado pelas forças do bandeirante e, em 1694, após um ataque frustrado, as forças dos bandeirante iniciaram uma empreitada vitoriosa, com um contingente de seis mil homens, bem armados e municiados. Um quilombola, Antônio Soares, foi capturado e, mediante a promessa de Domingos Jorge Velho de que seria libertado em troca da revelação do esconderijo do líder, Zumbi foi encurralado e morto em uma emboscada em 20 de novembro de 1695.
  A cabeça de Zumbi foi cortada e conduzida para Recife, onde foi exposta em praça pública no Pátio do Carmo, no alto de um mastro, para servir de exemplo a outros escravos. Sem a liderança de Zumbi, por volta de 1710, o quilombo se desfez por completo.
Pátio do Carmo, em Recife (PE) - aqui a cabeça de Zumbi dos Palmares foi exposta
A Fundação Cultural Palmares
  A Fundação Cultural Palmares é uma entidade pública brasileira vinculada ao Ministério da Cultura, instituída pela Lei Federal nº 7.668, de 22 de agosto de 1988.
  A entidade teve seu Estatuto aprovado pelo Decreto nº 418, de 10 de janeiro de 1992, e tem como missão os preceitos constitucionais de reforços à cidadania, à identidade, à ação e à memória dos segmentos étnicos dos grupos formadores da sociedade brasileira, além de fomentar o direito de acesso à cultura e à indispensável ação do Estado na preservação das manifestações afro-brasileiras.
Comemoração de 27 anos da Fundação Cultural Palmares, em 2015

2 comentários:

Francisco Alves C. Sobrinho disse...

Texto esclarecedor sobre os primórdios do movimento quilombola, a formação dos quilombos, o processo de resistência, as lutas e os enfrentamentos. Pela importância do tema, cabe, agora, uma panorâmica contextualizada sobre a dimensão dos quilombos e resquícios de quilombos atuais e suas perspectivas diante destas 'novas' circunstâncias do Brasil atual e seus governantes.

Francisco Alves C. Sobrinho - Natal / RN

Marciano Dantas de Medeiros disse...

obrigado

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