A Guerra do Paraguai foi o maior conflito armado internacional ocorrido na América do Sul no século XIX. Rivalidades platinas e a formação de Estados nacionais deflagraram o confronto, que destruiu a economia e a população paraguaias. É também chamada Guerra da Tríplice Aliança na Argentina e Uruguai e de Guerra Grande, no Paraguai.
A Guerra do Paraguai durou seis anos. Teve início em dezembro de 1864 e só chegou ao fim do ano de 1870, com a morte de Francisco Solano López em Cerro Corá.
As razões dessa guerra são bastante diversas. O Paraguai no século XIX era um país que discordava do conjunto latino-americano por ter alcançado certo progresso econômico, a partir da independência em 1811. Durante os longos governos de José Francía (1811-1840) e Carlos López (1840-1862), erradicara-se o analfabetismo no país e haviam surgido fábricas - inclusive de armas e pólvora -, indústrias siderúrgicas, estradas de ferro e um eficiente sistema de telégrafo. As "estâncias da pátria" (unidades econômicas formadas por terras e instrumentos de trabalho distribuídos pelo Estado aos camponeses, desde o governo Francía) abasteciam o consumo nacional de produtos agrícolas e garantiam à população emprego e bom padrão alimentar.
Também, desde a sua independência, os governantes paraguaios afastaram o país dos conflitos armados na região Platina. A política isolacionista paraguaia, porém, chegou ao fim com o governo do ditador Francisco Solano López. Solano promoveu a industrialização do país graças a ajuda financeira recebida pela Grã-Bretanha. Essa industrialização contribuiu para o forte crescimento econômico do país.
Com relativo sucesso socioeconômico e de alguma autonomia internacional, Solano López, cujo governo iniciou-se em 1862, teria enfatizado a política militar expansionista, a fim de ampliar o território paraguaio. Segundo essa versão, divulgada pela ótica dos vencedores, Solano pretendia criar o "Paraguai Maior", anexando, para isso, regiões da Argentina, do Uruguai e do Brasil (como Rio Grande do Sul e Mato Grosso). Obteria, dessa forma, acesso ao Atlântico, tido como imprescindível para a continuação do progresso econômico do país. Enfim, a guerra teria como motivo a agressão paraguaia, obrigando o Império a reagir. Porém, certamente foi a política externa brasileira no Prata, marcada pelo intervencionismo, que colaborou para criar uma situação potencialmente explosiva.
Em 1864, o Brasil estava envolvido num conflito armado com o Uruguai. Havia organizado tropas, invadido e deposto o governo uruguaio do ditador Aguirre, que era líder do Partido Blanco e aliado de Solano López. O ditador paraguaio se opôs à invasão brasileira no Uruguai, porque contrariava seus interesses.
O estopim para o conflito foi a intervenção brasileira no Uruguai e a reação de Solano López que, contando com um exército bem mais numeroso que o brasileiro, tomou a ofensiva ao ordenar o aprisionamento do navio brasileiro Marquês de Olinda, no Rio Paraguai, retendo, entre seus passageiros e tripulantes, o presidente da província do Mato Grosso, Carneiro de Campos. A resposta brasileira foi o imediato rompimento de relações diplomáticas com o Paraguai, seguida do revide paraguaio e declaração de guerra.
Mantendo-se na ofensiva, o Paraguai invadiu o Mato Grosso e o norte da Argentina, e os governos do Brasil, Argentina e Uruguai criaram a Tríplice Aliança contra Solano López.
Durante a primeira fase da guerra a iniciativa esteve com os paraguaios. Os exércitos de López definiram as três frentes de batalha iniciais invadindo o Mato Grosso, entre dezembro de 1864 e janeiro de 1865, primeiramente com a invasão de Corrientes (Argentina) e depois o Rio Grande do Sul.
A invasão de Mato Grosso foi feita ao mesmo tempo por dois corpos de tropas paraguaias. A província achava-se quase desguarnecida militarmente, e a superioridade numérica dos invasores permitiu-lhes realizar uma campanha rápida e bem-sucedida.
Um destacamento de cinco mil paraguaios, transportados em dez navios e comandados pelo coronel Vicente Barros, subiu o rio Paraguai e atacou o Forte de Nova Coimbra. A guarnição de 155 homens resistiu durante três dias, sob o comando do tenente-coronel Hermenegildo de Albuquerque Porto Carrero, depois barão de Forte de Coimbra. Quando as munições se esgotaram, os defensores abandonaram a fortaleza e se retiraram, rio acima, a bordo da canhoneira Anhambaí, em direção a Corumbá. Depois de ocupar o forte, que já estava vazio, os paraguaios avançaram rumo ao norte, tomando, em janeiro de 1865, as cidades de Albuquerque e Corumbá.
A segunda coluna paraguaia, comandada pelo coronel Francisco Isidoro Resquin e integrada por quatro mil homens, penetrou, por terra, em uma região mais ao sul do Mato Grosso, e logo enviou um destacamento para atacar a colônia militar fronteiriça de Dourados. O cerco, dirigido pelo major Martín Urbieta,, encontrou forte resistência por parte do tenente Antônio João Ribeiro, atual patrono do Quadro Auxiliar de Oficiais, e de seus 16 companheiros, que morreram sem se render. Os invasores prosseguiram até Nioaque e Miranda (ambos no atual estado do Mato Grosso do Sul), derrotando as tropas do coronel José Dias da Silva. Enviaram em seguida um destacamento até Coxim (MS), tomada em abril de 1865.
Apesar de as primeiras vitórias da guerra terem sido paraguaias, o país possuía uma população muito menor que os países da Tríplice Aliança e não conseguiu resistir a uma guerra prolongada. Além disso, Brasil, Argentina e Uruguai puderam contar com o apoio inglês, recebendo empréstimos para equipar e manter poderosos exércitos.
Segunda fase da guerra: contra-ataque aliado (1865-1866)
A primeira reação brasileira foi enviar uma expedição para combater os invasores em Mato Grosso. A coluna de 27.800 homens comandados pelo coronel Manuel Pedro Drago saiu de Uberaba - MG, em abril de 1865, e só chegou a Coxim em dezembro do mesmo ano, após uma difícil marcha de mais de dois mil quilômetros através de quatro províncias do Império. Ao chegar, Coxim já estava abandonada. O mesmo aconteceu em Miranda, onde chegou em setembro de 1866.
No dia 1° de maio de 1865, Brasil, Argentina e Uruguai assinaram, em Buenos Aires, o Tratado da Aliança contra o Paraguai. As forças militares da Tríplice Aliança eram, no início da guerra, francamente inferiores às do Paraguai.
Foi no setor naval que o Brasil, mais bem preparado, infligiu, logo no primeiro ano de guerra, uma pesada derrota aos paraguaios na Batalha de Riachuelo. Essa batalha foi travada no dia 11 de junho de 1865, no rio Paraná, na qual a esquadra comandada pelo chefe de divisão Francisco Manuel Barroso da Silva derrotou a esquadra paraguaia comandada por Pedro Inacio Meza, cortando as comunicações com o tenente-coronel paraguaio Antonio de la Cruz Estigarribia, que estava atacando o Rio Grande do Sul.
A vitória brasileira do almirante Barroso na Batalha do Riachuelo, já em 1865, levou à destruição da frota paraguaia. A partir daí, as forças da Tríplice Aliança passaram a ter a iniciativa na guerra, controlando os rios, principais meios de comunicação da Bacia Platina, até a vitória definitiva em 1870.
Simultaneamente ao ataque naval, uma força de 10 mil paraguaios atravessou a província argentina das Missões. Alcançando o rio Uruguai, a força se dividiu em duas colunas e rumaram para o sul, marchando em ambas as margens do rio. O tenente-coronel Antonio de la Cruz Estigarribia, liderou cerca de 7.500 homens na margem leste, e o major Pedro Duarte comandou 5.500 homens na margem oeste. Os paraguaios encontraram pouca resistência dos argentinos na margem oeste ou dos brasileiros na margem leste. López acreditava que se conseguisse controlar o Rio Grande do Sul e invadir o Uruguai, os escravos brasileiros iriam subelevar-se e os recém expulsos blancos uruguaios voltariam a pegar em armas.
Terceira fase da guerra: estagnação (1866-1868)
No segundo período da guerra, os desentendimentos entre Osório (comandante das forças brasileiras) e o presidente argentino, que se opunha às perseguições aos paraguaios, levou o governo brasileiro a substituí-lo. Designado em 10 de outubro de 1866 para o comando das forças brasileiras, o marechal Luís Alves de Lima e Silva, marquês e, posteriormente, Duque de Caxias. Assumiu suas funções em Tuiuti, em 19 de novembro, encontrando o exército praticamente paralisado. Os contingentes argentinos e uruguaios vinham sendo retirados aos poucos do exército dos aliados, assolado por epidemias. Desentendimentos entre Venâncio Flores (Uruguai) e Mitre (Argentina) e problemas internos fizeram ambos se retirarem do combate e voltarem a seus países, deixando o Brasil praticamente sozinho. Tamandaré foi substituído no comando da esquadra pelo almirante Joaquim José Inácio, futuro visconde de Inhaúma. Paralelamente, Osório organizou um 3º corpo de exército no Rio Grande do Sul, com mais de cinco mil homens. Na ausência de Mitre, Caxias assume o comando geral e providenciou a reestruturação do exército.
Entre novembro de 1866 e julho de 1867, Caxias organizou um corpo de saúde e um sistema de abastecimento das tropas. Conseguiu também que a esquadra imperial, que se ressentia do comando de Mitre, colaborasse nas manobras contra Humaitá. Nesse período, as operações militares limitaram-se aos conflitos com os paraguaios e a bombardeios da esquadra contra Curupaiti, na província de Santa Fé (Argentina).
Apesar dos esforços de Caxias, a ofensiva pelos aliados só teve reinício no dia 22 de julho de 1867. A base tática de Caxias era atacar pela ala esquerda das fortificações paraguaias, objetivando ultrapassar o reduto fortificado, cortar as ligações entre Assunção e Humaitá e submete-la a um cerco. A manobra de Caxias foi bem-sucedida, porém, devido o tempo decorrido para essa operação ter sido muito longo, permitiu que López fortificasse a região.
Quarta fase: os aliados retomam a ofensiva (1868-1869)
Mitre deu ordens para que a esquadra imperial forçasse a passagem em Curupaiti e Humaitá. No dia 15 de agosto de 1867, duas divisões de cinco encouraçados ultrapassaram Curupaiti, mas foram detidos pelos poderosos canhões da fortaleza de Humaitá. Os aliados completaram o cerco à fortaleza após terem tomado São Solano, Vila do Pilar e Tavi, às margens do rio Paraguai, cortando as comunicações fluviais entre Humaitá e Assunção. López reagiu, atacando a retaguarda da posição aliada em Tuiuti, mas os aliados conseguiram derrotar as tropas paraguaias graças ao reforço trazido de Porto Alegre.
Em janeiro de 1868, com o afastamento definitivo de Mitre, que retornou à Argentina, Caxias voltou a assumir o comando geral dos aliados. Em 19 de fevereiro a esquadra imperial capitão-de-mar-e-guerra Delfim Carlos de Carvalho, forçou a passagem de Humaitá. Apesar de os navios encouraçados terem ultrapassado a fortaleza, chegando a bombardear Assunção, só em 25 de julho de 1868 Humaitá foi totalmente cercada e tomada pelos aliados.
Quinta fase: caça a Solano López e fim da guerra (1869-1870)
No terceiro período da guerra (1869-1870), o genro do imperador Dom Pedro II, Luís Filipe Gastão de Orléans, o Conde d'Eu - marido da princesa Isabel -, foi nomeado para dirigir a fase final das operações militares no Paraguai, objetivando derrotar o governo paraguaio e fortalecer o Império brasileiro. Ele era um dos poucos da família imperial com experiência militar, já que na década de 1850 participara, como oficial subalterno, da campanha espanhola na Guerra do Marrocos. A indicação de um membro da família imperial pretendia diminuir as dificuldades operacionais das forças brasileiras, problema agravado pelos muitos anos de campanha, pela insatisfação dos veteranos e pelos conflitos, políticos e pessoais, que se alastravam entre os oficiais mais experientes.
Em agosto de 1869, a Tríplice Aliança instalou em Assunção um governo provisório fantoche, aliado de pessoas contrárias à Solano, encabeçado pelo paraguaio Cirilo Antonio Rivarola. O Império acelerou o processo para a formação do governo, realizando eleições no ano seguinte e criando uma assembleia constituinte.
Solano López tentando resistir, refez um pequeno exército de 5.000 homens, a maioria velhos, crianças e veteranos semi-inválidos e 36 canhões, na região montanhosa de Ascurra-Caacupê-Peribebuí, aldeia que transformou em sua capital. À frente de 12 mil homens estava o conde d'Eu, que chefiou a campanha contra a resistência paraguaia na chamada Campanha das Cordilheiras, encerrada em 12 de agosto de 1869.
O exército brasileiro defendeu as posições inimigas de Ascurra e venceu a batalha de Peribebuí. Na batalha seguinte, na região do atual Mato Grosso do Sul, as forças brasileiras se defrontaram com um exército formado, em sua maioria, por adolescentes, crianças e idosos, recrutados a força pelo ditador paraguaio. A derrota paraguaia encerrou o ciclo de batalhas da guerra. López abandonou Ascurra e adentrou-se nas matas fugindo das tropas brasileiras, marchando sempre para o norte.
Dois destacamentos foram enviados em perseguição ao presidente paraguaio. No dia 1º de março de 1870, as tropas do general José Antônio Correia da Câmara, o Visconde de Pelotas, surpreenderam o último acampamento paraguaio, em Cerro Corá, onde Solano López foi ferido a lança pelo cabo Chico Diabo e depois baleado, nas barrancas do arroio Aquidabanigui, após recusar-se à rendição. Depois de Cerro Corá, as tropas brasileiras ficaram eufóricas, assassinando civis, pondo fogo em acampamentos e matando feridos e doentes que se encontravam nos ranchos. Esse não era o desejo de Dom Pedro II, que preferia ter López preso do que morto. No Rio de Janeiro, a morte de López fez com que a popularidade do Imperador aumentasse - já que havia caído bruscamente com a guerra. Em 20 de junho de 1870, Brasil e Paraguai assinaram um acordo preliminar de paz.
Apesar de todas as dificuldades, o Paraguai resistiu perto de cinco anos de guerra, mostrando o grau relativamente alto de desenvolvimento e autossuficiência que havia obtido, além do engajamento de sua população em defesa do país.
O maior contingente das tropas da Aliança foi fornecido pelo exército brasileiro, que até então praticamente inexistia. Naquela época, a Guarda Nacional cumpria, ainda que mal, as funções normalmente destinadas ao exército. Já em janeiro de 1865, por decreto imperial, foram criados os corpos dos Voluntários da Pátria, com vantagens de soldo e gratificações para cidadãos entre 18 e 50 anos que se alistassem. Enquanto boa parte da elite - representada pela Guarda Nacional - resistia em ir para a guerra, populares engrossaram com entusiasmo as convocações, chegando rapidamente a 10 mil voluntários, total programado pelo governo.
Para ampliar o contingente de soldados, em novembro de 1866 foi decretado que os escravos que voluntariamente se apresentassem para lutar na guerra obteriam a liberdade. Muitos se alistaram dessa maneira, mas outros foram obrigados a fazê-lo no lugar dos filhos dos seus senhores que haviam sido recrutados. Esses soldados, recrutados à força, receberam, depois, o apelido de "voluntários a pau e corda". Junto a eles, outro grupo destacou-se em meio aos confrontos: os indígenas.
Em 1868, o Brasil alcançou expressiva vitória na Batalha de Tuiuti. Luís Alves de Lima e Silva, o barão de Caxias, assumiu o comando das forças militares imperiais, vencendo rapidamente importantes batalhas que foram chamadas de "dezembradas", por terem acontecido no mês de dezembro de 1868. Essas batalhas abriram caminho para a invasão de Assunção, capital paraguaia, tomada em janeiro de 1869. O conde D'Eu, genro do imperador, liderou a última fase da guerra, conhecida como Campanha da Cordilheira, completada com a morte de Solano López em 1870.
A guerra devastou o território paraguaio, desestruturando sua economia e causando a morte de mais de 300 mil pessoas, número que nas Américas só foi inferior às perdas humanas da Guerra de Secessão, nos Estados Unidos. Acredita-se que a Guerra do Paraguai tenha sido responsável pela morte de mais de 90% da população masculina paraguaia com mais de 20 anos, sobrevivendo a população formada predominantemente por velhos, crianças e mulheres.
Além das mortes em combate, foram devastadoras as epidemias, principalmente a de cólera, que atingiram os homens de ambos os lados da guerra. Acrescente-se ainda que os governos da Tríplice Aliança adotaram uma política genocida contra a população paraguaia.
Para o Brasil, além da morte de aproximadamente 40 mil homens (sobretudo negros e mestiços), a guerra trouxe forte endividamento com os ingleses. Tida como principal beneficiária do conflito, a Inglaterra forneceu armas e empréstimos, ampliando seus negócios na região e acabando com a experiência peculiar da economia paraguaia.
O Brasil conseguiu a manutenção da situação na Bacia do Prata, embora a um preço exorbitantemente alto, dadas as grandes perdas geradas pela guerra. Mas a principal consequência da Guerra do Paraguai foi o fortalecimento e a institucionalização do exército, com o surgimento de um grande e disciplinado corpo de oficiais experientes, pronto a defender os interesses da instituição. Além disso, seu poder bélico tornava-o uma organização capaz de impor suas ideias à força, caso necessário - o que acrescentou uma dose de instabilidade ao regime imperial.
A Guerra do Paraguai durou seis anos. Teve início em dezembro de 1864 e só chegou ao fim do ano de 1870, com a morte de Francisco Solano López em Cerro Corá.
As razões dessa guerra são bastante diversas. O Paraguai no século XIX era um país que discordava do conjunto latino-americano por ter alcançado certo progresso econômico, a partir da independência em 1811. Durante os longos governos de José Francía (1811-1840) e Carlos López (1840-1862), erradicara-se o analfabetismo no país e haviam surgido fábricas - inclusive de armas e pólvora -, indústrias siderúrgicas, estradas de ferro e um eficiente sistema de telégrafo. As "estâncias da pátria" (unidades econômicas formadas por terras e instrumentos de trabalho distribuídos pelo Estado aos camponeses, desde o governo Francía) abasteciam o consumo nacional de produtos agrícolas e garantiam à população emprego e bom padrão alimentar.
Carlos Antonio López (1792-1862) |
Com relativo sucesso socioeconômico e de alguma autonomia internacional, Solano López, cujo governo iniciou-se em 1862, teria enfatizado a política militar expansionista, a fim de ampliar o território paraguaio. Segundo essa versão, divulgada pela ótica dos vencedores, Solano pretendia criar o "Paraguai Maior", anexando, para isso, regiões da Argentina, do Uruguai e do Brasil (como Rio Grande do Sul e Mato Grosso). Obteria, dessa forma, acesso ao Atlântico, tido como imprescindível para a continuação do progresso econômico do país. Enfim, a guerra teria como motivo a agressão paraguaia, obrigando o Império a reagir. Porém, certamente foi a política externa brasileira no Prata, marcada pelo intervencionismo, que colaborou para criar uma situação potencialmente explosiva.
Francisco Solano López (1827-1870) |
O estopim para o conflito foi a intervenção brasileira no Uruguai e a reação de Solano López que, contando com um exército bem mais numeroso que o brasileiro, tomou a ofensiva ao ordenar o aprisionamento do navio brasileiro Marquês de Olinda, no Rio Paraguai, retendo, entre seus passageiros e tripulantes, o presidente da província do Mato Grosso, Carneiro de Campos. A resposta brasileira foi o imediato rompimento de relações diplomáticas com o Paraguai, seguida do revide paraguaio e declaração de guerra.
Mantendo-se na ofensiva, o Paraguai invadiu o Mato Grosso e o norte da Argentina, e os governos do Brasil, Argentina e Uruguai criaram a Tríplice Aliança contra Solano López.
Países e áreas envolvidas na Guerra do Paraguai |
FASES DA GUERRA
Primeira fase: ofensiva paraguaia (1864-1865)Durante a primeira fase da guerra a iniciativa esteve com os paraguaios. Os exércitos de López definiram as três frentes de batalha iniciais invadindo o Mato Grosso, entre dezembro de 1864 e janeiro de 1865, primeiramente com a invasão de Corrientes (Argentina) e depois o Rio Grande do Sul.
A invasão de Mato Grosso foi feita ao mesmo tempo por dois corpos de tropas paraguaias. A província achava-se quase desguarnecida militarmente, e a superioridade numérica dos invasores permitiu-lhes realizar uma campanha rápida e bem-sucedida.
Um destacamento de cinco mil paraguaios, transportados em dez navios e comandados pelo coronel Vicente Barros, subiu o rio Paraguai e atacou o Forte de Nova Coimbra. A guarnição de 155 homens resistiu durante três dias, sob o comando do tenente-coronel Hermenegildo de Albuquerque Porto Carrero, depois barão de Forte de Coimbra. Quando as munições se esgotaram, os defensores abandonaram a fortaleza e se retiraram, rio acima, a bordo da canhoneira Anhambaí, em direção a Corumbá. Depois de ocupar o forte, que já estava vazio, os paraguaios avançaram rumo ao norte, tomando, em janeiro de 1865, as cidades de Albuquerque e Corumbá.
Forte Coimbra |
Apesar de as primeiras vitórias da guerra terem sido paraguaias, o país possuía uma população muito menor que os países da Tríplice Aliança e não conseguiu resistir a uma guerra prolongada. Além disso, Brasil, Argentina e Uruguai puderam contar com o apoio inglês, recebendo empréstimos para equipar e manter poderosos exércitos.
Mapa da primeira fase da guerra |
A primeira reação brasileira foi enviar uma expedição para combater os invasores em Mato Grosso. A coluna de 27.800 homens comandados pelo coronel Manuel Pedro Drago saiu de Uberaba - MG, em abril de 1865, e só chegou a Coxim em dezembro do mesmo ano, após uma difícil marcha de mais de dois mil quilômetros através de quatro províncias do Império. Ao chegar, Coxim já estava abandonada. O mesmo aconteceu em Miranda, onde chegou em setembro de 1866.
No dia 1° de maio de 1865, Brasil, Argentina e Uruguai assinaram, em Buenos Aires, o Tratado da Aliança contra o Paraguai. As forças militares da Tríplice Aliança eram, no início da guerra, francamente inferiores às do Paraguai.
Foi no setor naval que o Brasil, mais bem preparado, infligiu, logo no primeiro ano de guerra, uma pesada derrota aos paraguaios na Batalha de Riachuelo. Essa batalha foi travada no dia 11 de junho de 1865, no rio Paraná, na qual a esquadra comandada pelo chefe de divisão Francisco Manuel Barroso da Silva derrotou a esquadra paraguaia comandada por Pedro Inacio Meza, cortando as comunicações com o tenente-coronel paraguaio Antonio de la Cruz Estigarribia, que estava atacando o Rio Grande do Sul.
Batalha Naval de Riachuelo |
Simultaneamente ao ataque naval, uma força de 10 mil paraguaios atravessou a província argentina das Missões. Alcançando o rio Uruguai, a força se dividiu em duas colunas e rumaram para o sul, marchando em ambas as margens do rio. O tenente-coronel Antonio de la Cruz Estigarribia, liderou cerca de 7.500 homens na margem leste, e o major Pedro Duarte comandou 5.500 homens na margem oeste. Os paraguaios encontraram pouca resistência dos argentinos na margem oeste ou dos brasileiros na margem leste. López acreditava que se conseguisse controlar o Rio Grande do Sul e invadir o Uruguai, os escravos brasileiros iriam subelevar-se e os recém expulsos blancos uruguaios voltariam a pegar em armas.
No segundo período da guerra, os desentendimentos entre Osório (comandante das forças brasileiras) e o presidente argentino, que se opunha às perseguições aos paraguaios, levou o governo brasileiro a substituí-lo. Designado em 10 de outubro de 1866 para o comando das forças brasileiras, o marechal Luís Alves de Lima e Silva, marquês e, posteriormente, Duque de Caxias. Assumiu suas funções em Tuiuti, em 19 de novembro, encontrando o exército praticamente paralisado. Os contingentes argentinos e uruguaios vinham sendo retirados aos poucos do exército dos aliados, assolado por epidemias. Desentendimentos entre Venâncio Flores (Uruguai) e Mitre (Argentina) e problemas internos fizeram ambos se retirarem do combate e voltarem a seus países, deixando o Brasil praticamente sozinho. Tamandaré foi substituído no comando da esquadra pelo almirante Joaquim José Inácio, futuro visconde de Inhaúma. Paralelamente, Osório organizou um 3º corpo de exército no Rio Grande do Sul, com mais de cinco mil homens. Na ausência de Mitre, Caxias assume o comando geral e providenciou a reestruturação do exército.
Rendição de Uruguaiana, em 1865 |
Apesar dos esforços de Caxias, a ofensiva pelos aliados só teve reinício no dia 22 de julho de 1867. A base tática de Caxias era atacar pela ala esquerda das fortificações paraguaias, objetivando ultrapassar o reduto fortificado, cortar as ligações entre Assunção e Humaitá e submete-la a um cerco. A manobra de Caxias foi bem-sucedida, porém, devido o tempo decorrido para essa operação ter sido muito longo, permitiu que López fortificasse a região.
Operação das forças aliadas para a passagem de Humaitá (1866-1868) |
Mitre deu ordens para que a esquadra imperial forçasse a passagem em Curupaiti e Humaitá. No dia 15 de agosto de 1867, duas divisões de cinco encouraçados ultrapassaram Curupaiti, mas foram detidos pelos poderosos canhões da fortaleza de Humaitá. Os aliados completaram o cerco à fortaleza após terem tomado São Solano, Vila do Pilar e Tavi, às margens do rio Paraguai, cortando as comunicações fluviais entre Humaitá e Assunção. López reagiu, atacando a retaguarda da posição aliada em Tuiuti, mas os aliados conseguiram derrotar as tropas paraguaias graças ao reforço trazido de Porto Alegre.
Em janeiro de 1868, com o afastamento definitivo de Mitre, que retornou à Argentina, Caxias voltou a assumir o comando geral dos aliados. Em 19 de fevereiro a esquadra imperial capitão-de-mar-e-guerra Delfim Carlos de Carvalho, forçou a passagem de Humaitá. Apesar de os navios encouraçados terem ultrapassado a fortaleza, chegando a bombardear Assunção, só em 25 de julho de 1868 Humaitá foi totalmente cercada e tomada pelos aliados.
Passagem de Humaitá |
No terceiro período da guerra (1869-1870), o genro do imperador Dom Pedro II, Luís Filipe Gastão de Orléans, o Conde d'Eu - marido da princesa Isabel -, foi nomeado para dirigir a fase final das operações militares no Paraguai, objetivando derrotar o governo paraguaio e fortalecer o Império brasileiro. Ele era um dos poucos da família imperial com experiência militar, já que na década de 1850 participara, como oficial subalterno, da campanha espanhola na Guerra do Marrocos. A indicação de um membro da família imperial pretendia diminuir as dificuldades operacionais das forças brasileiras, problema agravado pelos muitos anos de campanha, pela insatisfação dos veteranos e pelos conflitos, políticos e pessoais, que se alastravam entre os oficiais mais experientes.
Em agosto de 1869, a Tríplice Aliança instalou em Assunção um governo provisório fantoche, aliado de pessoas contrárias à Solano, encabeçado pelo paraguaio Cirilo Antonio Rivarola. O Império acelerou o processo para a formação do governo, realizando eleições no ano seguinte e criando uma assembleia constituinte.
Unidade de Cavalaria do Paraguai, atacado pelas tropas aliadas |
O exército brasileiro defendeu as posições inimigas de Ascurra e venceu a batalha de Peribebuí. Na batalha seguinte, na região do atual Mato Grosso do Sul, as forças brasileiras se defrontaram com um exército formado, em sua maioria, por adolescentes, crianças e idosos, recrutados a força pelo ditador paraguaio. A derrota paraguaia encerrou o ciclo de batalhas da guerra. López abandonou Ascurra e adentrou-se nas matas fugindo das tropas brasileiras, marchando sempre para o norte.
Rendição de Uruguaiana, por Victor Meireles |
Cadáveres paraguaios após a Batalha de Boquerón, em 1866 |
O maior contingente das tropas da Aliança foi fornecido pelo exército brasileiro, que até então praticamente inexistia. Naquela época, a Guarda Nacional cumpria, ainda que mal, as funções normalmente destinadas ao exército. Já em janeiro de 1865, por decreto imperial, foram criados os corpos dos Voluntários da Pátria, com vantagens de soldo e gratificações para cidadãos entre 18 e 50 anos que se alistassem. Enquanto boa parte da elite - representada pela Guarda Nacional - resistia em ir para a guerra, populares engrossaram com entusiasmo as convocações, chegando rapidamente a 10 mil voluntários, total programado pelo governo.
Preparativos para o festejo da vitória no Brasil, em 1870 |
Em 1868, o Brasil alcançou expressiva vitória na Batalha de Tuiuti. Luís Alves de Lima e Silva, o barão de Caxias, assumiu o comando das forças militares imperiais, vencendo rapidamente importantes batalhas que foram chamadas de "dezembradas", por terem acontecido no mês de dezembro de 1868. Essas batalhas abriram caminho para a invasão de Assunção, capital paraguaia, tomada em janeiro de 1869. O conde D'Eu, genro do imperador, liderou a última fase da guerra, conhecida como Campanha da Cordilheira, completada com a morte de Solano López em 1870.
A guerra devastou o território paraguaio, desestruturando sua economia e causando a morte de mais de 300 mil pessoas, número que nas Américas só foi inferior às perdas humanas da Guerra de Secessão, nos Estados Unidos. Acredita-se que a Guerra do Paraguai tenha sido responsável pela morte de mais de 90% da população masculina paraguaia com mais de 20 anos, sobrevivendo a população formada predominantemente por velhos, crianças e mulheres.
Em laranja, os territórios perdidos após a derrota paraguaia para os Aliados |
Para o Brasil, além da morte de aproximadamente 40 mil homens (sobretudo negros e mestiços), a guerra trouxe forte endividamento com os ingleses. Tida como principal beneficiária do conflito, a Inglaterra forneceu armas e empréstimos, ampliando seus negócios na região e acabando com a experiência peculiar da economia paraguaia.
O Brasil conseguiu a manutenção da situação na Bacia do Prata, embora a um preço exorbitantemente alto, dadas as grandes perdas geradas pela guerra. Mas a principal consequência da Guerra do Paraguai foi o fortalecimento e a institucionalização do exército, com o surgimento de um grande e disciplinado corpo de oficiais experientes, pronto a defender os interesses da instituição. Além disso, seu poder bélico tornava-o uma organização capaz de impor suas ideias à força, caso necessário - o que acrescentou uma dose de instabilidade ao regime imperial.
Prisioneiros paraguaios durante a ocupação de Assunção |
FONTE: Vicentino, Cláudio. História geral e do Brasil / Claúdio Vicentino, Gianpaolo Dorigo - 2. ed. - São Paulo: Scipione, 2013.