A Caatinga (chamada pelos índios pré-colombianos que viviam no Sertão nordestino de "mata branca") é o único bioma exclusivamente brasileiro, o que significa que grande parte do seu patrimônio biológico não pode ser encontrado em algum outro lugar do planeta. Este nome decorre da paisagem esbranquiçada apresentada pela vegetação durante o período seco: a maioria das plantas perde as folhas e os troncos tornam-se esbranquiçados e secos. A Caatinga ocupa uma área de cerca de 850.000 km², cerca de 10% do território nacional, englobando de forma contínua parte dos estados da Paraíba, Piauí, Ceará, Maranhão, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia e o norte de Minas Gerais.
Mapa do Brasil destacando a área que engloba o bioma da Caatinga |
A Caatinga é o mais fragilizado dos biomas brasileiros. O uso insustentável de seus solos e recursos naturais ao longo de centenas de anos de ocupação, associado à imagem de local pobre e seco, fazem com que a Caatinga esteja bastante degradada. Entretanto, pesquisas recentes vêm revelando a riqueza particular do bioma em termos de biodiversidade e fenômenos característicos. Do ponto de vista da vegetação, a região que abrange o bioma da Caatinga é classificada como savana estépica. Entretanto, a paisagem é bastante diversa, com regiões distintas, cujas diferenças se devem à pluviometria, fertilidade e tipos de solo e relevo.
Flora típica da Caatinga no estado de Pernambuco |
Uma primeira divisão que pode ser feita é entre o Agreste e o Sertão. O Agreste é uma faixa de transição entre o interior seco (Sertão) e a Mata Atlântica (Zona da Mata). Já o Sertão apresenta vegetação mais rústica. Outras subdivisões comuns incluem Seridó, Curimataú, Caatinga e Carrasco. Em termos de tipos de vegetação, a Caatinga do Seridó é uma transição entre campo e caatinga arbórea. Cariri é a caatinga com vegetação menos rústica.
Área rural no município de Ipueira, região do Seridó do RN |
O Carrasco, termo aplicado à vários tipos de vegetação, corresponde a savana muito densa, seca, que ocorre no topo de chapadas, caracterizada pelo predomínio de plantas caducifólias lenhosas, arbustivas, muito ramificadas e densamente emaranhadas por trepadeiras. Ocorre sobretudo na Bacia do Meio-Norte e na Chapada do Araripe. Porém, floristicamente, alguns autores consideram o Carrasco mais próximo do cerradão (ou catanduva) do que da Caatinga. Nas serras, que apresentam mais umidade, surgem os brejos de altitude.
Caatinga na Serra da Capivara, Piauí |
As populações que habitam a Caatinga são também conhecidas como caatingueiros: são sertanejos, vaqueiros, agricultores, populações indígenas e quilombolas. Estes grupamentos humanos desenvolvem suas próprias estratégias de sobrevivência e convivência com as condições da Caatinga. São guardiões do conhecimento sobre o manejo das plantas, de suas propriedades e usos medicinais, sobre a milenar técnica de busca de águas subterrâneas com varinhas (conhecida como radiestesia) e sobre os sinais da natureza que antecedem as secas prolongadas e as chuvas.
Serrote da Caixa D'Água, em Paulista - PB |
Há quatro grupos principais que vivem na Caatinga: as catadoras de mangaba, os caatingueiros, os vazanteiros e os do fundo e fecho de pasto.
As catadoras de mangaba
A mangaba (Hancornia speciosa) pode ser encontrada do Norte até o Sudeste do Brasil. De origem indígena (mã'gawa) significa (segundo Ferreira, 1973), coisa boa de comer. É uma árvore frutífera da família das apocináceas, com um porte médio atingindo entre 5 e 10 metros de altura.
As catadoras de mangaba vivem da colheita desse fruto usado na fabricação de sucos, sorvetes, doces e bebidas; a maioria delas estão localizadas no estado de Sergipe. São mulheres extrativistas, lutadoras, defensoras de uma das maiores culturas sergipana e brasileira - a cultura da mangaba. Uma fruta nativa do litoral e dos cerrados do Brasil, que está presente nas áreas nativas nas quais populações tradicionais praticam o extrativismo há séculos.
Mulheres catadoras de mangaba |
A principal pauta de luta das catadoras em Sergipe é pela criação de Reservas Extrativistas (Resex), que possam garantir oficialmente áreas de proteção da ocorrência da fruta no litoral e agreste sergipano sem interferência do avanço imobiliário e do agronegócio, especialmente do monocultivo canavieiro, os dois maiores fatores de redução das mangabeiras no estado. Para isso, foi criado o Movimento Catadoras de Mangaba (MCM), que conta com o apoio da Universidade Federal de Sergipe (UFS) e da Embrapa, e reúne catadoras de comunidades extrativas de importantes áreas de ocorrência da fruta no litoral sergipano.
Mulheres separando a mangaba após a colheita |
Os caatingueiros
Os caatingueiros cultivam vários gêneros agrícolas, criam gado e constituem-se uma coletividade dispersada por um longo espaço que agrega nas suas interfaces as atividades conciliadoras da vida social caatingueira. Eles destacam-se dos demais grupos sociais da região, pois estão completamente ligados ao bioma Caatinga, tanto em seu modo de produção quanto em seu modo de vida, com processos produtivos ajustados às condições ambientais (uma destas características é o conhecimento e a utilização de plantas e raízes medicinais).
Os caatingueiros caracterizam-se pelo caráter mercantil de produção e pela aparente prosperidade em comparação aos demais povos e comunidades com os quais se relacionam diretamente, produzindo grande diversidade de gêneros agrícolas, produtos derivados de leite e criando gado que se alimenta das pastagens nativas da região.
Outra característica dos caatingueiros é a sólida rede de solidariedade familiar e comunitária, expressa principalmente no momento do abate de animais, como o gado bovino e suíno, quando partes são distribuídos entre os parentes e vizinhos.
Vaqueiro da comunidade dos caatingueiros |
Os vazanteiros
Os vazanteiros, que ficam principalmente nas margens do Rio São Francisco, vivem da pesca e de atividades agrícolas. Eles possuem um modo de vida próprio, e são chamados assim porque praticam uma agricultura que está associada aos ciclos dos rios.
O ciclo natural do rio - seca, enchente, cheia e vazante - sempre possibilitou a esses povos, que têm forte influência indígena, quilombola e ribeirinha, o acesso à terra periodicamente fertilizadas pela matéria orgânica depositada em longas extensões das margens e ilhas. As terras baixas, chamados de baixões, são os locais onde a terra é mais fértil e úmida. É lá que eles vivem e cultivam legumes, verduras, frutas e pasto. Além disso, as vazantes e os brejos, com seus buritizais e babaçuais, garantem o sustento dos extrativistas, que também compõem essas comunidades.
Mas, a construção de reservatórios para usinas hidrelétricas ao longo da bacia do "Velho Chico" vem, sistematicamente, reduzindo e destruindo as áreas vazantes, causando profundas alterações na organização e no modo de vida desse povo.
O ciclo natural do rio - seca, enchente, cheia e vazante - sempre possibilitou a esses povos, que têm forte influência indígena, quilombola e ribeirinha, o acesso à terra periodicamente fertilizadas pela matéria orgânica depositada em longas extensões das margens e ilhas. As terras baixas, chamados de baixões, são os locais onde a terra é mais fértil e úmida. É lá que eles vivem e cultivam legumes, verduras, frutas e pasto. Além disso, as vazantes e os brejos, com seus buritizais e babaçuais, garantem o sustento dos extrativistas, que também compõem essas comunidades.
Mas, a construção de reservatórios para usinas hidrelétricas ao longo da bacia do "Velho Chico" vem, sistematicamente, reduzindo e destruindo as áreas vazantes, causando profundas alterações na organização e no modo de vida desse povo.
Vazanteiras do Norte de Minas Gerais |
Os grupos de fundo e fecho de pasto
Os grupos de fundo e fecho de pasto vivem no Sertão nordestino e têm de lidar com o regime de chuvas irregular. Sua principal atividade é a criação extensiva de pequenos animais. Eles se caracterizam pela posse e uso comunitário da terra e dos seus recursos. Costuma-se afirmar que nestes espaços o bode é o rei. Isto porque, no fundo de pasto, os animais são criados livremente, sendo reconhecidos por algumas marcas feitas pelos seus donos. Tal modelo de criação facilita o acesso dos animais à água e à comida, principalmente nos períodos de estiagem severa, além de ser um exemplo de adaptação e convivência com o clima semiárido da região.
As poucas cercas existentes nestas localidades não denotam, necessariamente, propriedade privada, apenas protegem os lotes de plantação e os pequenos animais, como as galinhas, de outros maiores, criados extensivamente.
A produção é prioritariamente para consumo das famílias produtoras e tocadas por homens e mulheres que mantém fortes vínculos com as tradições locais e com o manejo ambiental sustentável do território. Bons conhecedores do seu habitat, eles sabem que após os períodos de seca, as plantas voltam a florescer, que os animais podem encontrar os alimentos que necessitam e que a água comunalmente dividida e racionada garante uma qualidade de vida digna a todos.
As poucas cercas existentes nestas localidades não denotam, necessariamente, propriedade privada, apenas protegem os lotes de plantação e os pequenos animais, como as galinhas, de outros maiores, criados extensivamente.
Criador da comunidade fundo e fecho de pasto |
Comunidade de fundo e fecho de pasto no interior da Bahia |
REFERÊNCIA: Silva, Axé
Tempo de geografia: 7º ano / Axé Silva, Jurandyr Ross. - 4. ed. - São Paulo: Editora do Brasil, 2018. - (Coleção tempo)