O feudalismo foi a forma de organização social e econômica instituída na Europa Ocidental entre os séculos X e XV durante a Idade Média. Baseava-se em grandes propriedades de terra, chamadas de feudos, que pertenciam aos senhores feudais, e a mão de obra era servil.
Com a queda do Império Romano do Ocidente e a invasão dos povos bárbaros entre os séculos IV e V, a Europa atravessou um período de ruralização, ou seja, os moradores da cidade se deslocaram para o campo, fugindo da instabilidade provocada pela movimentação dos bárbaros.
A partir do século XV, o feudalismo entrou em crise por conta das mudanças ocorridas na Europa, como os renascimentos cultural, urbano e comercial.
A crise de Roma e a ruralização europeia
A partir do século III, iniciou-se o processo de gradual desagregação do Império Romano, marcado, principalmente, pelo fortalecimento dos nobres proprietários de terras e pela perda de poder dos reis. Problemas econômicos, como a diminuição do número de escravizados (antes obtidos por meio de guerras e invasões), disputas pelo poder entre chefes militares e senadores, sucessivas invasões de povos considerados bárbaros e o crescimento do cristianismo, causaram a descentralização política do Império, que culminou na deposição do último soberano de Roma, em 476 d.C.
A fragmentação do Império Romano possibilitou o fortalecimento do colonato como forma predominante de relação de trabalho. Nesse sistema, indivíduos livres e escravizados se estabeleciam de modo fixo no interior de grandes propriedades, num lote de terra demarcado, devendo entregar parte de sua produção ao proprietário das terras.
Esse movimento de trabalhadores rurais em direção às grandes propriedades esteve associado às elevadas taxações do governo romano sobre os donos de pequenas propriedades de terras, ao colapso da economia mercantil do império e à insegurança crescente da vida nas cidades, especialmente após as migrações dos povos romanos.
Nesse cenário de instabilidade, a sociedade romana ruralizou-se e passou a apresentar, de modo geral, uma divisão básica entre proprietários e camponeses. Esse processo levou a um crescente enrijecimento da hierarquia social e a regras cada vez mais rígidas nas relações de trabalho.
Outro fator que contribuiu de maneira significativa para um processo de reclusão social foi a difusão do cristianismo após o século IV. A partir desse momento, quando o cristianismo se tornou crença oficial em Roma, o clero - composto de homens responsáveis pelos rituais da liturgia cristã - foi aos poucos ganhando privilégios especiais e grandes poderes políticos (na administração civil) e econômicos (por suas crescentes propriedades rurais). Esses representantes da Igreja passaram a ser responsáveis pela salvação de todas as pessoas, ou seja, a via de comunicação essencial entre o céu e a terra. À medida que ganhava força e prestígio, a Igreja tornou-se a principal instituição reguladora da sociedade, e instaurou-se a mentalidade teocêntrica, ou seja, Deus seria o centro de todas as coisas, e toda a sociedade deveria ser ordenada para Ele.
Catedral de Notre Dame, antes e depois do incêndio de 2019. Demonstração de piedade cristã medieval |
Formação do sistema feudal
À medida que o poder central de Roma se enfraquecia, os grandes proprietários de terras se fortaleciam. Dessa maneira, o poder político regionalizou-se, ou seja, deixou de ser centralizado no império e se distribuiu entre os proprietários rurais.
Os povos germânicos que entraram nos territórios romanos contribuíram para a formação do sistema feudal. O colonato, típica instituição romana, se juntou ao comitatus, tradição germânica que ligava os chefes militares aos seus guerreiros por meio de obrigações mútuas de serviços e lealdade. O feudalismo, portanto, é resultado da combinação de instituições romanas e tradições germânicas.
Nesse contexto, os proprietários de terras assumiram a responsabilidade pela defesa de seus domínios e de todos os que neles viviam, consolidando as relações de dependência pessoal. Uma das formas de dependência instituída foi a vassalagem de amparo, o dependente, chamado de vassalo, e um senhor, o suserano, geralmente grande proprietário de terras.
Esse acordo de mutualidade era firmado em uma cerimônia marcada por dois momentos especiais: o da homenagem (o juramento pessoal) e o da investidura (o recebimento do bem). O vassalo recebia um benefício - um bem ou direito cedido em troca de fidelidade - e várias obrigações, principalmente militares. Na maioria das vezes, esse benefício - o feudo - compunha um conjunto de terras cedidas por um aristocrata a outro. Os vassalos que recebiam os feudos se tornavam senhores feudais.
Com o tempo, os próprios vassalos passaram a doar benefícios a outros aristocratas e se tornaram suseranos de seus vassalos. Dessa forma, houve um gradual enfraquecimento, mas não o total desaparecimento, da autoridade real, já que muitos homens, especialmente nas regiões do interior do império, não estavam ligados diretamente ao monarca e, por isso, dificilmente respeitavam suas decisões.
Iluminura da obra Roman de Tristan, manuscrito do século XV de narrativas medievais |
A organização e o trabalho nos feudos
No sistema feudal, a base econômica era a agricultura, praticada pelos camponeses, que compunham a maioria da população e trabalhavam nas unidades agrícolas senhoriais, os senhorios, sob o regime de escravidão.
As terras do senhorio eram comumente divididas em três partes. O castelo, que era fortificado, era o centro da propriedade. Nele morava a família senhorial e seus dependentes, como cavaleiros e nobres. As três categorias de terras se distinguiam entre o manso senhorial, onde tudo o que era produzido pertencia ao senhor feudal, o manso servil, no qual os servos podiam cultivar alimentos para a própria subsistência, desde que pagassem taxas ao senhor pelo uso da terra e pela proteção, e as terras comunais, utilizadas para pastagem e extração de madeira para senhores e servos. A prática da caça, no entanto, era exclusividade dos senhores.
No senhorio eram cultivadas leguminosas e produzidos queijos, vinho, manteiga, tecidos e diversos utensílios domésticos, entre outros artigos necessários à subsistência. Cada domínio agrícola buscava essencialmente ser autossustentável: enquanto alguns servos cultivavam a terra e criavam porcos, galinhas e patos, outros produziam tecidos, sapatos, artefatos de madeira e de metal e o que mais fosse preciso. Uma vez que a produção destinava ao consumo interno, sem visar a obtenção de excedentes, a venda de bens agrícolas ou artesanais era bastante restrita. Por isso, o comércio na Europa do período feudal sofreu um grande decréscimo.
Camponeses no trabalho da colheita. Iluminura do Saltério da Rainha Maria, 1553. Os servos, embora exercessem trabalho sob coerção, não eram escravizados e estavam vinculados à terra |
A sociedade feudal
A estrutura social feudal era organizada essencialmente em três ordens, ou estamentos: o clero, a nobreza e o campesinato. Havia uma rigidez na hierarquia social, cujos valores e práticas eram, em grande parte, regulados pela Igreja. Os clérigos legitimavam essa organização afirmando que as pessoas deviam desempenhar suas funções em obediência à vontade de Deus. Assim, a hierarquia era determinada pelo nascimento, e não havia praticamente nenhuma chance de ascensão ou mobilidade social.
No ideário medieval, os clérigos compunham o grupo que cumpria a função de intermediários entre Deus e os seres humanos. Por esse motivo, em um período de grande fragmentação do poder político, a fé cristã era o fator de união entre os europeus. A Igreja Católica exercia grande autoridade não apenas na vida religiosa, mas também nos negócios, na educação, na vida cotidiana e nas atividades econômicas. O batismo era o mecanismo de inserção das pessoas na sociedade.
A nobreza era composta de indivíduos detentores de terras e de poder político e que recebiam sólida educação bélica. Esse grupo se diferenciava pelo título nobiliárquico de cada indivíduo. A alta nobreza era uma camada numericamente reduzida representada por príncipes, arquiduques, duques, marqueses e condes. A pequena nobreza compunha-se de viscondes, barões e cavaleiros, especialistas no uso de armas. Os cavaleiros que possuíam grandes extensões de terras podiam dedicar-se inteiramente ao treinamento e ao serviço militar. E os cavaleiros que não tinham terras viviam dos recursos provenientes do seu suserano.
Pirâmide mostrando como era a sociedade feudal |
A grande maioria da população da Europa medieval vivia no campo, onde existiam basicamente três tipos de trabalhadores: os servos, os vilões e os escravizados.
O trabalho de pessoas escravizadas foi pouco utilizado. Os cativos, frequentemente, realizavam tarefas domésticas. Diferentemente dos escravizados, que podiam ser vendidos e não tinham bens, aos servos era permitido possuir partes de terra.
A nobreza e o clero eram sustentados pelos servos, que viviam sob o regime de servidão de gleba, ou seja, não podiam abandonar o feudo, mesmo que este era passado para outro senhor. Os servos eram obrigados a pagar uma série de tributos, como a corveia (realização de serviços em alguns dias da semana, nas terras senhoriais), a talha (entrega de metade de tudo o que fosse produzido) e as banalidades (encargos pagos ao senhor feudal pelo uso de suas ferramentas e equipamentos de trabalho).
Nessa sociedade, havia também os vilões, que não estavam presos à terra e, por isso, podiam transitar pelos domínios senhoriais em busca de trabalho. Alguns conseguiam adquirir terras ou enriquecer com a atividade comercial.
Figurinha mostrando como era o senhorio medieval |
BLOCH, M. A sociedade feudal. Lisboa: Edições 70, 1987.
FRANCO JÚNIOR, H. A Idade Média: nascimento do Ocidente. São Paulo: Brasiliense, 2006.
LE GOFF, J. A Idade Média explicada aos meus filhos. Rio de Janeiro: Agir, 2007.
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