sexta-feira, 12 de agosto de 2011

O PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO DA AMÉRICA LATINA

  O Brasil, o México e a Argentina são as maiores, mais industrializadas e mais diversificadas economias da América Latina.
  Os três se tornaram países independentes no início do século XIX e, no final dele, iniciaram lentamente seus respectivos processos de industrialização, que se intensificaram somente a partir da década de 1930.
  Com a crise de 1929 e a depressão econômica que se seguiu, os países industrializados passaram a comprar menos mercadorias vendidas pelos países exportadores de produtos minerais e agrícolas. Nessa época, o Brasil, o México e a Argentina tiveram seus níveis de exportação drasticamente reduzidos, o que lhes dificultou importar diversos produtos industrializados. Por outro lado, a queda no ingresso de produtos importados acelerou a industrialização voltada a substituir muitos bens de consumo, principalmente da Europa.
Fábrica de tecelagem em São Paulo no início do século XX
  Algumas das primeiras fábricas pertenciam à aristocracia latifundiária, que tinha acumulado capital com as exportações de produtos agropecuários e passou a investi-los na indústria, no comércio e no sistema financeiro. Os estancieros argentinos (donos de estâncias, grandes propriedades rurais), ganharam muito dinheiro exportando carne e trigo; no Brasil, destacavam-se, principalmente, os fazendeiros de café, conhecidos como barões do café; e, no México, os proprietários das haciendas (fazendas). Todos eram grandes latifundiários, com forte influência econômica e política em seus países.
Avenida Paulista no início do século XX - dominado por luxuosas mansões dos barões do café
  No entanto, esse início efetivo do processo de industrialização não foi acompanhado de políticas sociais e econômicas voltadas à distribuição de renda e maior inserção da população pobre no mercado interno de consumo: parte da aristocracia latifundiária gradativamente se transformou em burguesia industrial e financeira e diversificou suas fontes de lucro, o que explica como muitos latifúndios, mesmo improdutivos, continuavam nas mãos de seus antigos proprietários. A inexistência de uma efetiva reforma agrária, como ocorreu nos países desenvolvidos enquanto se industrializavam, é um dos fatores que explicam a urbanização acelerada e desordenada, a acentuada desigualdade social e a consequente fraqueza do mercado interno dos países de industrialização recente da América Latina.
Região central do Rio de Janeiro no início do século XX
  Outro agente importante no início da industrialização foi o Estado, que passou a investir em indústrias de bens intermediários - mineração e siderurgia, petrolífera e petroquímica etc. - e em infraestrutura - transportes, telecomunicações, energia elétrica etc.
  Na América Latina, os maiores símbolos desse modelo foram as estatais petrolíferas: Pemex (Petróleos Mexicanos, fundada em 1934), Petrobras (1954), PDVSA (Petróleos de Venezuela, 1975) e a argentina YPF (Yacimientos Petrolíferos Fiscales, 1922). Com exceção da YPF, comprada em 1999 pela espanhola Repsol, as outras continuam sob o controle total ou parcial do Estado, e em 2008 eram as maiores empresas nos respectivos países e as primeiras colocadas na América Latina na lista Fortune Global 500.
PDVSA - estatal petrolífera da Venezuela
  Após a Segunda Guerra Mundial, o modelo de industrialização por substituição de importações mostrou suas limitações: carência de maiores volumes de capitais que permitissem dar continuidade ao processo, fragilidade de setores industriais importantes, como a indústria de bens de capital, e defasagem tecnológica. Foi nessa época que teve início a entrada de capital estrangeiro, por meio das multinacionais que estavam se expandindo pelo mundo em busca de novos mercados. As filiais de empresas estrangeiras promoveram a expansão de muitos setores industriais nesses países: automobilístico, químico-farmacêutico, eletroeletrônico, de máquinas e equipamentos e outros, que até então tinham uma produção limitada ou inexistente.
Juscelino Kubitschek inaugura a fábrica da Volkswagen em São Bernardo do Campo - SP no dia 18 de novembro de 1959
  Nos setores tradicionais também entraram grandes indústrias multinacionais alimentícias e têxteis, juntando-se às nacionais já existentes e, em muitos casos, incorporando-as. Assim, houve um grande avanço no processo de industrialização do Brasil, México e Argentina, o qual passou a se assentar no tripé de capital estatal, nacional e estrangeiro. A entrada das corporações multinacionais contribuiu para o surgimento de novas empresas nacionais em diversos setores, muitas delas complementares às estrangeiras: por exemplo, a entrada das empresas automobilísticas estimulou o desenvolvimento de muitas indústrias nacionais de autopeças.
Primeira linha de montagem da Volkswagen no Brasil
  Embora apresente menor grau de industrialização, esse modelo vigorou também em outros países latino-americanos, como o Chile, a Colômbia e a Venezuela.
  Com o tempo, a indústria tornou-se um setor muito importante na economia de Brasil, México e Argentina. Os mais importantes complexos industriais estão concentrados nas grandes regiões metropolitanas: no triângulo São Paulo - Rio de Janeiro - Belo Horizonte, no Brasil; no eixo Buenos Aires - Rosário, Argentina; e no eixo Cidade do México - Guadalajara e em Monterrey, no México.
Trecho da rodovia Pan-Americana em Buenos Aires
  O modelo de substituição de importações incentivou a produção interna de muitos bens de consumo, que deixaram de ser comprados no exterior, como roupas, calçados, eletrodomésticos, carros, entre muitos outros. Ao mesmo tempo, requeria a importação de outros bens que não eram produzidos internamente, como máquinas e equipamentos, e exigia a constituição de uma infraestrutura de transportes, energia e comunicações, demandando cada vez mais investimento. Como a poupança interna era limitada, esse modelo de industrialização foi muito dependente de capital estrangeiro e os recursos externos entravam nesses países como investimento produtivo, por meio da instalação de filiais de multinacionais, ou por empréstimos contraídos pelos governos e por empresas privadas nacionais.
A modernização da agricultura promoveu uma grande demanda de máquinas e equipamentos
CRISES FINANCEIRAS E BAIXO CRESCIMENTO ECONÔMICO
  No pós-guerra, o crescimento econômico do Brasil, do México e da Argentina foi bastante elevado, estendendo-se até o início dos anos 1980. O crescimento econômico desses países esteve em grande medida assentado em recursos estrangeiros, que a partir dos anos 1970 passaram a ser disponíveis no mercado financeiro mundial. Nessa época, houve um aumento do crédito porque os bancos dos países desenvolvidos passaram a reciclar os petrodólares, ou seja, a emprestar vultosos recursos depositados pelos países exportadores de petróleo que ganharam muito dinheiro  com a elevação dos preços do barril a partir de 1973. Entre 1974 e 1981, os países da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) acumularam 360 bilhões de dólares com exportações e metade desses recursos foi depositada em bancos dos países desenvolvidos. A grande oferta de dinheiro no mercado financeiro fez as taxas de juros internacionais caírem após 1973, atingindo o ponto mais baixo entre 1975-1977.
Encontro dos representantes dos países membros da OPEP
  A partir desse período, os países em desenvolvimento, especialmente os latino-americanos, endividaram-se pesadamente. O Brasil, segundo o Banco Central, tinha uma dívida de 5,3 bilhões de dólares, em 1970; 12,6 bilhões, em 1973; e 25,9 bilhões em 1976. O problema é que os juros  não foram fixados nesse patamar, as taxas para a amortização futura da dívida eram flutuantes, ou seja, oscilavam em função do mercado internacional. Depois do primeiro aumento das taxas de juros, provocado pela crise do petróleo de 1973, houve uma segunda elevação bem mais forte, com a crise de 1979. No final da década de 1970, em consequência de uma política do governo norte-americano de manutenção de altas taxas de juros para conter a inflação, atrair investimentos e financiar seu déficit orçamentário e comercial, os Estados Unidos converteram-se no principal receptor de dinheiro no mundo. Assim, além de sobrarem poucos recursos para os países em desenvolvimento, ainda houve uma elevação artificial de suas dívidas. Como consequência disto, houve uma explosão do endividamento dos países latino-americanos.
  O primeiro grande sinal da crise foi dado em 1982, quando o México decretou a moratória de sua dívida externa. Daquele momento em diante, aprofundou-se nesses três países a política do "exportar é o que importa", visando a obtenção de moeda forte, sobretudo dólares, para o pagamento dos juros da dívida. No entanto, esse esforço acabou contribuindo para baixar  os preços dos produtos primários, na época majoritários em suas exportações, reduzindo a entrada de receitas em moeda estrangeira.
  Ao mesmo tempo, os governos mantinham uma política de contenção de importações de produtos industrializados. Tal medida provocou o sucateamento dos parques produtivos, dada a dificuldade de comprar máquinas e equipamentos necessários à sua modernização.
Parque Industrial de Cubatão - SP
  A combinação de altas taxas de juros (maior endividamento) com baixos preços de produtos de exportação (menores receitas) só podia resultar, para muitos países, em uma grave crise econômica. A crise da dívida atingiu os países em desenvolvimento  em geral, mas em particular os latino-americanos, os mais endividados. Assim, para esses países, os anos de 1980 ficaram conhecidos como a "década perdida": suas economias sofreram com baixo crescimento e elevada inflação.
Parque Industrial Tecnológico de Guadalajara - México
  Esse modelo econômico provocou forte concentração de renda, sobretudo no Brasil, porque se assentava os baixos salários pagos aos trabalhadores, o que restringiu a expansão do mercado interno e, como consequência, o próprio processo de industrialização. Paradoxalmente, o modelo que visava substituir importações, acabou limitando-o. Os bens de consumo produzidos, notadamente automóveis e produtos eletrônicos, eram voltados apenas para pequena parte da população.
Favelas - o principal fator para a sua proliferação é a concentração de renda
  A década de 1990 foi marcada pela estabilização das economias dos países latino-americanos, paralelamente à implantação de políticas econômicas neoliberais na esteira do processo de globalização. A redução da inflação foi conseguida após a implantação de medidas como o controle dos gastos públicos, a privatização das empresas estatais e a abertura econômica para produtos e capitais, que avançaram em vários países. Essas medidas mudaram a modalidade de endividamento, entretanto, as crises continuaram ocorrendo.
Protestos contra a privatização da Vale do Rio Doce em Campinas - SP (07/09/2007)
  Com os avanços tecnológicos na informática e nas telecomunicações, ampliaram-se as possibilidades de investimentos no mercado mundial. Há diversas modalidades de investimentos de capitais no sistema financeiro globalizado, destacando-se as ações, os títulos da dívida pública e as moedas estrangeiras.
  Além do mercado acionário que cresceu de forma significativa, uma das modalidades de investimento especulativo mais difundida na atual globalização financeira é a compra de títulos da dívida pública. A emissão desses títulos pelos governos é uma forma de os países tomarem dinheiro emprestado. Ao comprá-los, os investidores - em geral bancos ou corretoras que fazem a intermediação entre pessoas e empresas que aplicam no mercado financeiro - emprestam dinheiro ao Estado, que terá de pagar juros pelo empréstimo.
  O problema do capital especulativo é que ele é volátil, ou seja, não cria raízes, transferindo-se rapidamente de um setor, ou mesmo de um país, para outro, e por isso gera poucos empregos. Além disso, tende a fragilizar as economias dos países, em especial dos em desenvolvimento, porque os operadores das empresas financeiras muitas vezes retiram o dinheiro no momento em que elas mais precisam de capital. Essa foi a raiz das crises financeiras de diversos países emergentes ao longo da década de 1990.
FONTE: Sene. Eustáquio de. Geografia geral e do Brasil, volume 2: espaço geográfico e globalização: ensino médio / Eustáquio de Sene, João Carlos Moreira. São Paulo: Scipione, 2010

9 comentários:

Anônimo disse...

é otimo esse conteudo

Mamede disse...

Sucinto, didático e completo. Gostei.

Mamede disse...

Sucinto, didático e completo. Gostei.

Marciano Dantas de Medeiros disse...

Valeu Mamede, obrigado por acessar o meu blog

Anônimo disse...

Adorei, me ajudou bastante.
Brigada

Anônimo disse...

OBRIGADA PROFESSOR!!! ME AJUDOU MUITO... AMANHÃ TENHO PROVA DE GEOGRAFIA, E SUA POSTAGEM ME AJUDOU MUITO!!! OBRIGADA NOVAMENTE...

Anônimo disse...

OBRIGADA PROFESSOR!!! ME AJUDOU MUITO... AMANHÃ TENHO PROVA DE GEOGRAFIA, E SUA POSTAGEM ME AJUDOU MUITO!!! OBRIGADA NOVAMENTE...

Anônimo disse...

OBRIGADA PROFESSOR!!! ESSA SUA POSTAGEM ME AJUDOU MUITO!!!

Cronos_XF disse...

Tô procurando a bibliografia da industrialização América latina vocês podem me informar se tem?

ADSENSE

Pesquisar este blog