domingo, 22 de setembro de 2013

INICIATIVA PARA A INTEGRAÇÃO DA INFRAESTRUTURA REGIONAL SUL-AMERICANA - IIRSA

  A Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana, ou simplesmente IIRSA, é um programa conjunto dos governos dos 12 países da América do Sul que visa promover a interligação sul-americana através da integração física desses países.
  Criada em 2000, a IIRSA tem como meta construir uma infraestrutura  de transportes, energia e comunicações entre os países sul-americanos.
  A IIRSA surgiu por meio de uma proposta apresentada em agosto de 2000 em Brasília, durante a Reunião de Presidentes da América do Sul, onde foi discutido a ideia de coordenar o planejamento para a construção de infraestrutura dos diferentes países do continente sul-americano. Esta iniciativa surgiu a partir de uma proposta brasileira, baseada na experiência de planejamento e em estudos desenvolvidos com o foco na integração da infraestrutura logística do país, financiados pelo BNDES.
Logomarca da IIRSA
  A IIRSA se apresenta como uma iniciativa multinacional, multisetorial e multidisciplinar que contempla mecanismos de coordenação entre governos, instituições financeiras multilaterais e o setor privado. A necessidade da integração da infraestrutura física da América do Sul baseia-se no reconhecimento de que não basta a redução ou o fim das barreiras aduaneiras regionais para integrar um continente ou região, mas é necessário planejar a construção dos meios físicos que permitam o desenvolvimento da livre circulação de produtos, serviços e pessoas. Neste quadro, a IIRSA tem como propósito declarado promover o desenvolvimento com qualidade ambiental e social, a competitividade e a sustentabilidade da economia dos países sul-americanos, favorecendo a integração da infraestrutura e da logística regional, integrando os mercados de logística (transportes, fretes, seguros, armazenamento) e processamento de licenças, inserindo-se na "era do novo regionalismo", destacando-se pelo foco na infraestrutura física da integração regional.
O transporte aéreo é um dos projetos de integração da IIRSA
  A IIRSA envolve, além dos governos e bancos governamentais dos países sul-americanos e de organizações do setor privado destes países, três instituições financeiras multilaterais da região: o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), a Corporação Andina de Fomento (CAF) e o Fundo Financeiro para o Desenvolvimento da Bacia do Prata (FONPLATA).
  Para atingir essa meta, foram definidos 10 Eixos de Integração e Desenvolvimento, que são a base para o desenvolvimento dos projetos. Cada eixo deve envolver mais de um país e contemplar a gestão dos recursos naturais e populacionais da área que abrange.
  Os Eixos são os seguintes:
  • Eixo Andino (Venezuela, Colômbia, Equador, Peru e Bolívia): integração energética, com destaque para a construção de gasodutos.
  • Eixo Interoceânico de Capricórnio (Antofagasta - Chile, Jujuy - Argentina, Assunção - Paraguai e Porto Alegre - Brasil): integração energética, incorporação de novas terras à agricultura de exportação e biocombustíveis.
  • Eixo do Amazonas (Colômbia, Peru, Equador e Brasil): criação de uma rede eficiente de transportes entre a Bacia Amazônica e o litoral do Pacífico, com vista à exportação.
  • Eixo Sul (sul do Chile - Talcahuano e Concepción - e da Argentina - Neuquén e Bahía Blanca): exploração do turismo e dos recursos energéticos (gás e petróleo).
  • Eixo Interoceânico Central (Sudeste brasileiro, Paraguai, Bolívia, norte do Chile e sul do Peru): rede de transportes para a exportação de produtos agrícolas brasileiros e minerais bolivianos pelo Pacífico.
  • Eixo Mercosul-Chile (Brasil, Argentina, Uruguai e Chile): integração energética, com ênfase nos gasodutos e na construção de hidrelétricas.
  • Eixo Peru-Bolívia-Brasil: criação de um eixo de de transportes envolvendo o Brasil, Bolívia e Peru, com a conexão portuária peruana no Pacífico, permitindo a expansão do comércio destes países com a Ásia.
  • Eixo Hidrovia Paraguai-Paraná (sul e sudoeste do Brasil, Uruguai, Argentina e Paraguai): integração dos transportes fluviais e incremento na oferta de energia hidrelétrica.
  • Eixo do Escudo Guiano (Venezuela, Suriname e extremo-norte do Brasil): aperfeiçoamento da rede rodoviária.
  • Eixo Andino do Sul (região andina da fronteira do Chile com a Argentina): turismo e rede de transportes.
Eixos de integração e desenvolvimento da IIRSA
ESTRUTURA
  O trabalho do IIRSA se organiza em três níveis:
  • Comitê de Direção Executiva (CDE): integrados pelos ministros de infraestrutura ou planejamento designados pelos Governos dos países envolvidos, cuja finalidade é definir os lineamentos estratégicos do trabalho e aprovação dos planos de ação.
  • Grupos Técnicos Executivos (GTEs): integrados por funcionários de alto nível e especialistas designados pelos países. Há um GTE para cada Eixo de Integração e Desenvolvimento (EID) e para cada Processo Setorial de Integração (PSI), com o objetivo de analisar temas específicos e realizar ações de âmbito multinacional.
  •  Comitê de Coordenação Técnica (CCT): integrado pelo BID, a CAF e o FONPLATA, que dá apoio técnico e financeiro aos países, atuando como coordenador das atividades conjuntas.
Ponte sobre o rio Tacutu, que liga as cidades de Lethem (Guiana) a Bonfim (Roraima) - faz parte do Eixo do Escudo Guiano
  Em cada país a Iniciativa se estrutura em torno de Coordenadores Nacionais, responsáveis por articular a participação dos diversos Ministérios e órgãos governamentais envolvidos, além de outros setores considerados relevantes (empresas, governos sub-nacionais, academias, ONGs etc.).
VISÕES, POLÊMICAS E CONTROVÉRSIAS
  Na visão política defendida pelo BID, a IIRSA deveria se basear em princípios como: abertura aos mercados mundiais, promoção da iniciativa privada e retirada do Estado da atividade econômica direta.
Estrada do Pacífico, ligando o Brasil ao litoral do Peru no Oceano Pacífico (trecho do Anel Viário de Rio Branco - AC)
  O IIRSA recebe críticas de caráter ambiental e político. Os ambientalistas denunciam que os projetos induzirão ao desmatamento, em especial os do eixo 5, na faixa do Amazonas. O complexo de obras que inclui a hidrovia e as hidrelétricas do Rio Madeira, incluiriam eclusas que permitiriam o transporte hidroviário na região, são consideradas por muitas ONGs ambientalistas como sendo um projeto que supostamente vai causar grande impacto ambiental.
  Este é um dos casos mais controversos, na medida em que estas obras são fundamentais para gerar energia em uma das regiões mais pobres do Sul da Amazônia, possibilitando a oferta de eletricidade para milhares de habitantes da região, que hoje não tem acesso a energia, tanto no território brasileiro quanto no boliviano.
Obras da Usina Hidrelétrica de Santo Antônio, no Rio Madeira, em Porto Velho - RO. No fundo, árvores mortas devido ao alagamento da represa.
  Também alegam que os projetos da Hidrovia Paraguai-Paraná, eixo 4, também gerarão impactos ambientais graves em áreas sensíveis, como o Pantanal.
  Os que defendem a integração, dizem que a construção de eclusas irá facilitar a integração das hidrovias já existentes na Bacia Amazônica e na Bacia Platina (além da Paraguai-Paraná, existe também a Tietê-Paraná), permitindo o transporte hidroviário por todo o interior do continente sul-americano, barateando os custos de transportes e diminuindo a poluição, dinamizando consideravelmente a economia dos países beneficiados e permitindo que regiões isoladas do interior do continente possam se desenvolver e exportar os produtos típicos locais para o mercado internacional a um custo viável.
Hidrovia Paraguai-Paraná
  Considerando que, embora polêmicas, a maioria das hidrovias contribui para o desenvolvimento sustentável, alguns analistas e políticos brasileiros criticam abertamente as ONGs ambientalistas que são contra a construção de hidrovias e outras obras de infraestrutura da IIRSA. Estes críticos defendem que muitos destes grupos recebem dinheiro de governo dos países ricos para defender propostas supostamente ambientalistas, mas visam apenas a dificultar o desenvolvimento regional e a integração sul-americana.
  As críticas políticas referem-se aos beneficiários do IIRSA. Muitos analistas dizem que a infraestrutura para a exploração dos recursos naturais na América do Sul proporcionará mais benefícios para as empresas multinacionais do que para a população residente nessa porção do continente.
Corredor Bioceânico - ligará o Atlântico ao Pacífico
  Independente das críticas, o IIRSA é a maior iniciativa para elaborar e instaurar uma política territorial envolvendo os países da América do Sul.
FONTE: Ribeiro, Wagner Costa. Por dentro da geografia, 8° ano: mundo / Wagner Costa Ribeiro. 1. ed. - São Paulo: Saraiva, 2012.

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

A IMIGRAÇÃO JAPONESA NO BRASIL

  O primeiro grande grupo de japoneses chegou ao Brasil no dia 18 de junho de 1908, desembarcando no porto de Santos à bordo do navio Kasato Maru vindos do porto de Kobe, no Japão. Naquela época, o Japão passava por grandes dificuldades, como a baixa produtividade agrícola e a tradicional carência de recursos naturais. A fome rondava o país porque a agricultura - com métodos e técnicas rudimentares e escassas terras férteis - não conseguia produzir o suficiente para abastecer e alimentar toda a população. Os primeiros imigrantes japoneses que vieram nessa embarcação somavam 781 passageiros, vinculados ao acordo migratório estabelecido entre o Brasil e o Japão, além de 12 passageiros independentes.
Navio Kasato Maru atracado no porto de Santos em 1908
  Recém chegados a um país de idioma, costumes, clima e tradição completamente diferentes, os imigrantes pioneiros trouxeram consigo esperança e sonhos de prosperidade.
PRÉ-IMIGRAÇÃO
  Embora o Japão tenha enviado seus primeiros imigrantes ao Brasil em 1908, os primeiros japoneses a pisar em solo brasileiro foram quatro tripulantes do barco Wakamiya Maru que, em 1803, afundou na costa japonesa. Os náufragos foram salvos por um navio de guerra russo que, mesmo não podendo desviar-se de sua rota, levou-os em sua viagem.
  No retorno, a embarcação aportou, para conserto, em Porto de Desterro, atual Florianópolis (SC), no dia 20 de dezembro, permanecendo até 04 de fevereiro de 1804. Ali, os quatro japoneses fizeram registros importantes da vida da população local e da produção agrícola da época.
  Incidentalmente, outros japoneses estiveram de passagem pelos país, mas a primeira visita oficial para se buscar um acordo diplomático e comercial ocorreu em 1880. No dia 16 de novembro daquele ano, o vice-almirante Artur Silveira da Mota, mais tarde Barão de Jaceguai iniciou, em Tóquio, as conversações para o estabelecimento de um Tratado de Amizade, Comércio e Navegação entre os dois países.   O esforço nesse sentido prosseguiu em 1882, com o ministro plenipotenciário Eduardo Calado, mas o acordo só seria concretizado 13 anos mais tarde. Em 5 de novembro de 1895, em Paris, Brasil e Japão assinaram o Tratado da Amizade, Comércio e Navegação.
Cartaz de propaganda da imigração de japoneses para o Brasil
ABERTURA À IMIGRAÇÃO
  Entre os eventos que antecederam a assinatura do Tratado, destaca-se a abertura brasileira às imigrações japonesas e chinesas, autorizadas pelo Decreto-Lei n° 97, de 5 de outubro de 1892. Com isso, em 1894 o Japão envia o deputado Tadashi Nemoto para uma visita em cujo roteiro foram incluídos os estados da Bahia, Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo.
  Satisfeito com o que viu, Nemoto mandou um relatório ao governo e às empresas de emigração japonesas, recomendando o Brasil como país apto a acolher os imigrantes orientais. A partida da primeira leva de japoneses que deveria vir trabalhar nas lavouras de café em 1897 teve de ser cancelada na véspera do embarque.
  O motivo foi a crise que o preço do produto sofreu em todo o mundo, cuja crise durou até 1906. Em 1907, o governo brasileiro publicou a Lei da Imigração e Colonização, permitindo que cada Estado definisse a forma mais conveniente de receber e instalar imigrantes.
  Em novembro do mesmo ano, Ryu Mizuno, considerado o pai da imigração, fecha acordo com o secretário de Agricultura de São Paulo, Carlos Arruda Botelho, para a introdução de três mil imigrantes japoneses durante um período de três anos. Nessa época, o governador era Jorge Tibiriçá. No dia 28 de abril de 1908, o navio Kasato Maru deixa o Japão com os primeiros imigrantes rumo ao Brasil.
Ryo Mizuno - o pai da imigração japonesa no Brasil
O PERÍODO DA IMIGRAÇÃO
  A maior parte dos imigrantes foram trabalhar na agricultura, concentrando-se em algumas regiões dos estados de São Paulo (como Marília e Bauru) e Paraná (como Londrina e Maringá).
  Os 781 japoneses recém-chegados foram distribuídos em seis fazendas paulistas. Enfrentaram um duro período de adaptação. O grupo contratado pela Companhia Agrícola Fazenda Dumont ficou menos de dois meses. As outras fazendas também foram sendo gradativamente abandonadas.
  Os imigrantes japoneses deram contribuição às atividades agropecuárias no Brasil, desenvolvendo novas técnicas de plantio e produção.
Imigrantes japoneses peneirando café
  No dia 28 de junho de 1910, o navio Ryojun Maru aportava em Santos com 906 trabalhadores japoneses a bordo. Levados para outras fazendas, eles viveriam os mesmos problemas de adaptação dos compatriotas que os antecederam. Aos poucos, os conflitos foram diminuindo e a permanência nos locais de trabalho ficou mais duradoura.
  Os primeiros imigrantes japoneses a se tornarem proprietários de terra foram cinco famílias que adquiriram, em fevereiro de 1911, lotes junto à Estação Cerqueira César, da Estrada de Ferro Sorocabana, dentro do projeto de colonização Monções, criado na época pelo Governo Federal.
Imigrantes japoneses com sua plantação de batatas
  Em março de 1912, na região do Iguape, novas famílias são assentadas em terras doadas pelo governo paulista. Esse assentamento foi fruto de um contrato de colonização firmado entre uma empresa japonesa e o poder público. A maioria dessas famílias vieram de fazendas onde os contratos já haviam sido cumpridos, tornando-se um dos mais bem sucedidos projetos de colonização dessa fase pioneira.
  Nesse mesmo ano, os imigrantes atingiram o Paraná, tendo como pioneiros uma família procedente da província de Fukushima e que se estabeleceu na Fazenda Monte Claro, em Ribeirão Claro, no norte do estado de São Paulo. Em agosto de 1913, um grupo de 107 imigrantes chega ao Brasil para trabalhar em uma mina de ouro no estado de Minas Gerais. Foram os únicos mineiros japoneses na história da imigração.
Imigrantes japoneses cuidando de lavoura de café
  Em 1914, o número de trabalhadores japoneses no estado de São Paulo já estava em torno de 10 mil pessoas. Com uma situação financeira desfavorável, o governo estadual decidiu proibir novas contratações de imigrantes e, em março, avisou à Companhia da Imigração que não mais subsidiaria o pagamento de passagens do Japão para o Brasil.
  Porém, a abertura de novas comunidades rurais que utilizavam a mão de obra existente continuou. Nessa época, ocorreu um dos episódios mais tristes da história da imigração, quando dezenas de pessoas que haviam se instalado na Colônia Hirano, no município de Cafelândia - SP, morreram vítimas de malária, doença então desconhecida para os japoneses.
Família de imigrantes japoneses
DIFICULDADES DOS PRIMEIROS TEMPOS
   Os imigrantes japoneses tiveram muita dificuldade em se adaptar ao Brasil. Idioma, hábitos alimentares, modo de vida e diferenças climáticas acarretaram um forte choque cultural.
  A maior parte dos imigrantes japoneses tinha a pretensão de enriquecer no Brasil e retornar para o Japão após alguns anos. Uma parcela considerável nunca aprendeu a falar o português.
  O enriquecimento rápido em terras brasileiras era um sonho impossível. Submetido a horas exaustivas de trabalho, o imigrante tinha um salário baixíssimo e o preço da passagem era descontado no salário. Tudo o que o imigrante consumia devia ser comprado no armazém do fazendeiro. Em pouco tempo, as dívidas se tornavam enormes.
  Entretanto, através de um sistema de parceria com fazendeiros locais, muitos japoneses conseguiram economizar e comprar seus primeiros pedaços de terra. Com a ascensão social e a vinda de parentes, a maioria dos imigrantes japoneses decidiu-se pela permanência definitiva no Brasil.
Imigrantes japoneses indo para fazenda de café em 1930
  Outro fator que facilitou a permanência definitiva no Brasil foi que os contratos de imigração eram feitos com famílias. Japoneses solteiros não podiam imigrar sozinhos. O padrão comum foi a imigração de famílias de japoneses com filhos pequenos ou de casais de recém-casados.
  A primeira geração nascida no Brasil viveu de forma semelhante a de seus pais imigrantes. Ainda pensando em regressar, os imigrantes educavam os seus filhos em escolas japonesas fundadas pela comunidade. A predominância do meio rural facilitou tal isolamento. Cerca de 90% dos filhos de imigrantes japoneses falavam apenas o idioma japonês em casa.
  A partir de 1912, grupos de japoneses passaram a residir na ladeira Conde de Sarzedas em São Paulo. O local era próximo do centro da cidade e alugar cômodos ou porões de sobrados era o melhor que os imigrantes podiam pagar. Na década de 1920, a rua Conde de Sarzedas já era conhecida como o local preferido de residência dos japoneses que deixavam o campo. Com o crescimento da comunidade, o entorno do bairro da Liberdade tornou-se um bairro japonês com lojas e restaurantes típicos.
Bairro da Liberdade em São Paulo - SP

  A crise da agricultura a partir de 1929, fez com que muitos imigrantes japoneses migrassem para a cidade de São Paulo, onde foram trabalhar no comércio e na indústria. Concentraram-se principalmente no bairro da Liberdade, que se tornou um símbolo da imigração japonesa no Brasil.
  Em 1938, ano antecedente à Segunda Guerra Mundial, o Governo Federal começou a limitar as atividades culturais e educacionais dos imigrantes. Em dezembro decretou o fechamento de todas as escolas estrangeiras, principalmente as de japonês, alemão e italiano.
  As comunidades oriundas dos países integrantes do Eixo Roma-Berlim-Tóquio começaram a sentir os sintomas do conflito iminente. Em 1940, todas as publicações em japonês tiveram a sua circulação proibida.
  No ano seguinte, chegaram as últimas correspondências do Japão. Até o fim da guerra, os japoneses viveram um período de severas restrições, como o confisco de bens.
Um dos últimos desembarques de imigrantes japoneses no Porto de Santos em 1937
  Alguns núcleos de imigrantes japoneses surgiram em vários estados brasileiros. No Pará, fixaram-se na região bragantina (município de Tomé-Açu), onde se dedicaram ao cultivo da pimenta-do reino. No Rio de Janeiro, os japoneses concentram-se na cidade de Niteroi.
Armazém japonês em São Paulo, em 1940
O FENÔMENO DEKASSEGUI
  A ida de milhares de japoneses e descendentes do Brasil para o Japão começou em 1988, atingindo seu auge na década de 1990. A emigração de brasileiros descendentes de japoneses para o Japão, se deve à procura de melhores oportunidades de trabalho. Esses emigrantes brasileiros são conhecidos como dekasseguis, embora a palavra no Japão inclua todos os trabalhadores migrantes, até mesmo japoneses de áreas rurais que vão trabalhar nos grandes centros urbanos.
Praça do Japão em Curitiba - PR
FONTE: Tamdjian, James Onnig. Estudos de geografia: o espaço geográfico do Brasil, 7º ano / James Onnig Tamdjian, Ivan Lazzari Mendes. - São Paulo: FTD, 2012.
Museu Histórico da Imigração Japonesa no Brasil.

terça-feira, 17 de setembro de 2013

A QUESTÃO DA CAXEMIRA

  A civilização hindu é uma das mais antigas do mundo e sua história remonta a mais de 5 mil anos.
  Grande produtora de especiarias nos séculos XV e XVI, a região que hoje compreende o Subcontinente Indiano ou Ásia Meridional, despertava o interesse dos europeus da época. No início do século XVI, comerciantes de Portugal tomaram alguns portos da costa oeste da Índia. Franceses, holandeses e ingleses lutaram contra os portugueses e, depois, entre si para controlar as rotas de comércio.
  Na segunda metade do século XVIII, o imperialismo britânico tomou posse do Estado e buscou integrar a maioria hindu com os muçulmanos, grupo minoritário que já havia se fixado na Índia a partir do século XII.
Impérios coloniais
  No século XIX, ocorreram rebeliões de caráter anticolonialista, mas a Índia só se libertou do domínio britânico em 1947. Com a independência, o território foi dividido em dois para abrigar os interesses de muçulmanos e hinduístas. Os muçulmanos fundaram o Paquistão e os hinduístas permaneceram na Índia. Na época, houve uma grande migração de pessoas de um lado para outro.
  O Estado paquistanês se originou da província de Punjab, situada a oeste da Índia. Com a formação dos dois novos Estados, teve início uma guerra pela posse de uma região localizada ao norte do território: a Caxemira. Com o fim do conflito, em 1948, houve uma divisão das terras: cerca de um terço da região ficou para o Paquistão e o restante para a Índia.
  A Caxemira e uma região do norte do subcontinente indiano, hoje dividida entre a Índia e o Paquistão. Uma parte foi anexada pela China.
  O termo "Caxemira" (significa "terra sem água" ou "terra desidratada" - Ká = água e Shimeera = secar) descrevia historicamente o vale ao sul da parte mais ocidental do Himalaia. Politicamente, o termo "Caxemira" descreve uma área muito maior, que inclui as regiões de Jammu, Caxemira e Ladakh. O nome Caxemira tornou-se sinônimo de tecido de alta qualidade, devido à lã de caxemira produzida a partir das cabras nativas.
Região da Caxemira
DISPUTAS PELO TERRITÓRIO
   A fronteira entre Índia e Paquistão e a linha que limita os territórios dos dois países, estabelecida quando da independência dos dois Estados a partir do Raj Britânico, em 1947. As relações entre os dois estados são muito tensas e a passagem na fronteira de pessoas e bens é estritamente limitada. A principal fonte desta discórdia relaciona-se com a questão da Caxemira: nesta região não há consenso sobre o traçado de fronteira.
  Na Caxemira o traçado da fronteira está por definir. A Índia reclama soberania sobre as províncias de Caxemira Livre e Áreas do Norte, atualmente sob controle paquistanês.  O Paquistão considera-se soberano sobre a zona do Glaciar de Siachen, controlado pela Índia desde o conflito de Siachen, em 1984. A região não tem nenhuma fronteira no sentido internacional, mas apenas uma linha de cessar-fogo, a Line of Control, limite das posições militares quando do fim da Primeira Guerra Indo-Paquistanesa, em 1949. Esta linha de controle está materializada na quase totalidade do seu traçado por uma fileira dupla de arame farpado rodeado por campos minados.
Mapa da fronteira em disputa
RESTO DA FRONTEIRA
  O resto da fronteira, denominada International Border, está fortemente demarcado. Só existe um ponto de passagem terrestre entre os dois países, em Wagah, no caminho entre Amritsar, na Índia, e Lahore, no Paquistão. Neste ponto, exibem-se todos os dias os guardas fronteiriços dos dois países, num ritual que atrai multidões e no qual procedem movimentações coordenadas antes de fechar os portões.
Exibição dos soldados indianos e paquistaneses na Fronteira de Wagah
  Em 1962, a República Popular da China conquistou um trecho de Jammu e Caxemira (Aksai Chin); no ano seguinte, o Paquistão cede aos chineses uma faixa dos Territórios do Norte. Um novo conflito, em 1965, não trouxe modificações territoriais.
  Em 1971, uma guerra entre as duas nações resultou na separação da porção oriental do Paquistão e na formação de um novo país: Bangladesh.
  Nos anos 1980, guerrilheiros separatistas passam a atuar na Caxemira indiana, provocando a morte de mais de 25 mil pessoas. A Índia acusou o governo paquistanês de apoiar os guerrilheiros - favoráveis à unificação com o Paquistão - intensificando a repressão.
  No entanto, o controle da Caxemira continua a ser um problema que coloca em risco a segurança nessa região. As divergências são territoriais e, sobretudo, religiosas. Embora oficialmente a Caxemira pertença à Índia, sua população é majoritariamente islâmica, preferindo fazer parte do Paquistão.
  Quase todo o reduto islâmico da Índia se encontra na Caxemira: cerca de 130 milhões de pessoas. Se dependesse de seus habitantes, a província já seria do Paquistão desde a sua independência da Índia, em 1947.
Territórios disputados na Caxemira
  A região é drenada por vários rios, com destaque para o Indo. Essa característica física explica a vocação agrícola dos caxemirianos, que fazem cultivo de subsistência às margens desses rios. A atividade agrícola ocupa 80% da população da província.
  Economicamente fraca, a Caxemira é compensada por sua importante posição estratégica, o que é motivo de cobiça por parte de vários países. Além de protegida pela Cordilheira do Himalaia, a Caxemira abriga a nascente de quatro dos cinco rios do Paquistão, o que justifica o interesse paquistanês pelo controle da província indiana.
Rio Beas, visto de Van Vihar, Manali, Índia
  Como a maioria da população vive no campo, há poucas zonas urbanas na região. Destacam-se as cidades de Srinagar e Muzafarabad.
  A Caxemira ainda é lembrada como uma das regiões do mundo que mais apresentam conflitos religiosos. São comuns atos de violência entre grupos hindus e muçulmanos no norte da Índia.
  Embora a Índia e o Paquistão apresentem graves problemas sociais e econômicos, seus governantes investem mais em segurança do que em saúde e educação.
  A Índia acusa o Paquistão de enviar dinheiro e armas para os separatistas caxemirianos. O Paquistão, por sua vez, rebate a denúncia afirmando que o exército indiano reprime com violência a população da Caxemira.
Paisagem da Caxemira
FONTE: Perspectiva geografia, 9 / Cláudia Magalhães ... [et al.]. - 2. ed. - São Paulo: Editora do Brasil, 2012. - (Coleção perspectiva)

domingo, 15 de setembro de 2013

A REVOLUÇÃO MEXICANA

  A Revolução Mexicana foi um conflito armado que teve lugar no México, iniciado em 20 de novembro de 1910. Historicamente, costuma ser descrita como o acontecimento político e social mais importante do século XX no México.
CAMPONESES E LATIFUNDIÁRIOS
  Em 1910, o México era um país principalmente agrário. Os mexicanos viviam sob a ditadura de Porfírio Díaz, um general que governava o país havia mais de três décadas. Com o apoio das elites, ele  se mantinha no cargo por causa de eleições presidenciais repletas de irregularidades, que sempre lhe garantiam vitória.
  José de la Cruz Porfírio Díaz Mori (1830-1915), era um militar e político mexicano. Participou da Revolução de Ayutla, que levou os liberais ao poder em 1854, e da guerra contra o imperador Maximiliano I (1864-1867). Governou o México de 1876 a 1880 e de 1884 a 1911.
  Durante o seu longo mandato, Díaz implementou um processo de concentração de terras nas mãos de poucos proprietários, os hacendados. Essas terras foram tomadas de camponeses e indígenas sob a justificativa de que eles não possuíam os documentos de propriedade. Em seguida, foram cedidas ou vendidas a grandes latifundiários mexicanos ou a empresas estrangeiras. No início do século XX, cerca de 840 fazendeiros eram donos de quase todo o território mexicano.
Porfírio Díaz (1830-1915)
  Camponeses e indígenas que se revoltaram contra esse roubo foram perseguidos pela polícia e pela Igreja católica. Expulsos de suas terras, eles se viram obrigados a trabalhar nas propriedades dos hacendados ou das empresas estrangeiras. Em 1910, das 15 milhões de pessoas que viviam no México, cerca de 12 milhões dependiam dos grandes fazendeiros para sobreviver, trabalhando como peões nas fazendas e recebendo salários muito baixos. Alguns eram funcionários de empresas estrangeiras e trabalhavam principalmente nas minas, criações de gado ou plantações de algodão.
A situação de miséria revoltou os camponeses e indígenas mexicanos
 AGITAÇÕES POLÍTICAS NO MÉXICO
  A história política do México foi bastante conturbada durante o século XIX e início do século XX. Ex-colônia espanhola, o país conquistou sua independência em 1821. A partir de então, o poder passou para as mãos de grupos políticos conservadores. Em 1848, o país perdeu cerca de 40% do seu território para os Estados Unidos, enfraquecendo o prestígio desses governos. A perda de grande parte do território mexicano para os Estados Unidos se deu durante a Guerra Mexicano-Americana.
  A Guerra Mexicano-Americana foi o primeiro grande conflito impulsionado pela ideia de Destino Manifesto, a crença de que a América (Estados Unidos) tinha um direito dado por Deus, o destino de expandir as fronteiras do país de "costa a costa", e foi uma guerra entre os Estados Unidos e o México ocorrida entre 1846 e 1848 e que teve enormes consequências para o futuro das nações envolvidas. Como resultado, os Estados Unidos ampliaram o seu território em cerca de um quarto, enquanto o México perdeu aproximadamente metade do seu território. Na época, a guerra foi objeto de grande controvérsia moral dentro dos Estados Unidos.
Territórios perdidos pelo México para os Estados Unidos
  Em 1854, a Revolução de Ayutla instalou no México o primeiro governo liberal, que eliminou alguns privilégios dos militares e dos membros da Igreja Católica e autorizou a venda das terras da Igreja e das comunidades indígenas. Em 1857, o governo liberal concluiu uma nova Constituição.
  Descontentes com as mudanças, os conservadores entraram em guerra civil contra os liberais. Em 1859, os liberais radicalizaram ainda mais seu governo, transferindo para o Estado mexicano todos os bens que pertenciam à Igreja. Também se recusaram a pagar as dívidas assumidas pelos governos anteriores com as nações europeias.
  Por se recusar a pagar suas dívidas, o México foi invadido por tropas espanholas, inglesas e francesas, que destituíram o governo liberal. O poder foi devolvido aos conservadores, que convidaram o nobre austríaco Ferdinand Maximilian a assumir o trono do Império mexicano.
Maximiliano I - Imperador do México
  Maximiliano I (como era chamado pelos conservadores) ou Austríaco (como era chamado pelos liberais) governou o México de 1864 a 1867, quando os liberais retomaram o poder e fuzilaram o imperador.
  A violenta disputa entre conservadores e liberais foi amenizada com o primeiro governo do general Porfírio Díaz (1876-1880), que se reelegeu em 1884 e se manteve na presidência até 1911. Díaz conseguiu apaziguar os ânimos dos grupos rivais, criando um Estado forte que intermediava as divergências políticas internas. Ao mesmo tempo, estimulou a entrada de empresas estrangeiras no México.
Porfírio Díaz com sua esposa Carmen Romero Rubio
ANTECEDENTES ECONÔMICOS E SOCIAIS
  Durante o tempo colonial muitas localidades puderam conservar algumas propriedades comunais, designadas de forma genérica de éjidos. A Lei do Lerdo de 1856 - que tinha como objetivo reativar a economia e sanear as finanças do Estado -, declarou abandonadas as propriedades corporativas, particularmente as da Igreja e das comunidades indígenas. Entre 1889 e 1890, o governo de Díaz dispôs que as terras comunais tornar-se-iam emparceláveis. Os novos proprietários, desacostumados à propriedade privada, foram enganados por particulares ou funcionários. Como resultado, muitos indígenas viram-se desapossados de suas terras, tendo que empregar-se mas fazendas próximas. Outra série de leis de demarcação dos anos 1863, 1883 e 1894, segundo as quais uma parcela de propriedades rurais sem o seu respectivo título poderia considerar-se como terreno baldio, propiciou àqueles que tinham os recursos necessários apossarem-se de grandes porções de terra.
Hacienda no México
  Em 1910, menos de 1% das famílias do México possuíam ou controlavam cerca de 85% das terras cultiváveis. As localidades rurais, que abrigavam 51% da população, contavam apenas com pequenas porções de terra e a maior parte da população dependia das fazendas vizinhas. Além disso, as leis e a situação nacional favoreciam os fazendeiros, pois eles eram os únicos com acesso a créditos e a projetos de irrigação. Por seu lado, as pequenas povoações e os agricultores independentes viam-se obrigados a pagar impostos altíssimos. Essa situação afetou a economia agrícola, pois as fazendas tinham porções por cultivar e eram menos produtivas que as propriedades menores.
  Outra das repercussões da demarcação de terras e do fracionamento das terras comunais indígenas foi que alguns deles rebelaram-se contra o governo. Os conflitos, que tiveram lugar nos finais do século XIX e início do século XX, foram protagonizados por grupos indígenas, como maias, tsotsis, coras, huicholes e rarámuris, entre outros. Os conflitos mais duradouros foram os ocorridos em Yucatán, Quintana Roo e Sonora. Perante tais grupos adotou-se uma política de deportação, sendo Yucatán e Quintana Roo os principais destinos. No norte, o governo Díaz adotou contra os iaquis uma política de repressão violenta e deportação para o sul do país. O momento culminante contra este grupo teve lugar em 1908, momento no qual entre um quarto e metade da sua população havia sido enviada para as plantações de sisal em Yucatán. Mais tarde, estes grupos étnicos colaborariam com as forças revolucionárias.
Índios Yaquis em 1910
  No início do século XX começou a exploração petrolífera no México, ainda que as concessões tenham sido entregues a companhias estrangeiras, como a Standard Oil e a Royal Dutch Shell. Este processo levou o país a uma transformação industrial. Os investidores estrangeiros, protegidos pelo governo, investiram em indústrias e na exploração de matérias-primas, dando impulso à mineração e modernizando a indústria têxtil, permitindo, também, o desenvolvimento do sistema ferroviário.
  No entanto, em 1907 desencadeou-se uma forte crise internacional nos Estados Unidos e na Europa, o que levou a uma diminuição das exportações, o encarecimento das importações e a suspensão do crédito aos industriais. Esta situação criou muito desemprego, além de diminuir os rendimentos da população.
Valle de México - pintura de Velasco em 1885
  Uma seca que ocorreu em 1908 e 1909, afetou a produção agrícola, obrigando o país a importar milho, afetando grande parte da população mexicana, visto que o milho fazia parte da dieta de mais de 85% dos mexicanos. A consequente diminuição da atividade econômica do país reduziu drasticamente as receitas do governo. Tentou-se resolver este problema diminuindo os salários da burocracia e aumentando os impostos e a base fiscal, o que afetou os membros da classe média, tanto urbana como rural, assim como os membros da classe alta que não estavam ligados aos "científicos" - grupo seleto de intelectuais, profissionais e homens de negócios que compartilhavam a crença no positivismo e darwinismo social e que influíam na política do país.
Augusto Comte - um dos idealizadores do positivismo
ANTECEDENTES SOCIAIS
A Greve de Cananea - 1° de julho de 1906 
  Durante o governo de Díaz existiam numerosos latifúndios e 80% da população mexicana dependia do salário rural. Além disso, as tiendas de raya consistiam numa prática comum nestes lugares, onde se pagavam os salários dos trabalhadores em mercadoria. Mediante este sistema, conseguia-se que os trabalhadores alcançassem tal valor de crédito, que ficavam endividados por toda a vida. Este sistema, juntamente com práticas que eram cotidianas, como a contratação por logro ou a adjudicação de uma dívida inexistente, era conhecido como "enganche" - sistema que envolvia elementos coercivos, extra-econômicos e extralegais.
Porfírio Díaz em 1861
  As leis da nação eram raramente aplicadas nas fazendas, onde os trabalhadores eram vistos como escravos ou objetos de propriedade. Além disso, atuava no campo o chamado Cuerpo de Rurales, um grupo policial encarregado de "manter a paz", geralmente recorrendo a métodos brutais. Outra prática deste grupo era a leva, ou recrutamento obrigatório.
  Nas cidades, a partir de 1906, começaram a surgir numerosos movimentos operários, originando grandes greves como as de Cananea e Rio Blanco, que seriam reprimidos pelo governo mediante a força militar.
  A greve de Cananea teve lugar na povoação mineira mexicana de Cananea, Estado de Sonora, em junho de 1906. Nesse ano, a Cananea Consolidated Copper Company, com sede em Nogales, tinha cerca de 5.360 trabalhadores mexicanos nas suas minas de cobre de Cananea, recebendo três pesos e meio por dia, enquanto so 2.200 trabalhadores estadunidenses recebiam 5 pesos pelo mesmo trabalho. As condições em que os trabalhadores mexicanos viviam eram deploráveis. Durante as celebrações do Cinco de Mayo, os empregados mexicanos tornaram públicas as suas queixas ao passo que a autoridade local impôs a lei marcial para evitar a ocorrência de mais conflitos.
Loja da companhia em Cananea
  Em 1° de junho, a maioria dos mineiros mexicanos entraram em greve. Liderados por Juan José Rios, Manuel Macario Diéguez e Esteban Baca Calderón, exigiam a remoção de um encarregado chamado Luis, o pagamento de cinco pesos por oito horas de trabalho, quotas de emprego assegurando 75% dos empregos para mexicanos e 25% para estrangeiros, a colocação de homens responsáveis e respeitosos para a operação das jaulas e que todos os trabalhadores mexicanos fossem elegíveis para promoções, segundo as suas habilidades.
  Os executivos da companhia rejeitaram todas as petições e os trabalhadores decidiram marchar e mobilizar pessoas de outras cidades e municípios. A população apoiou os trabalhadores e a multidão atingiu 3.000 pessoas. Enquanto desfilavam em frente da serração da companhia, os empregados estadunidenses encarregados daquele departamento, os irmãos Metcalf, lançaram água sobre eles e depois dispararam alguns tiros, matando três pessoas. A multidão enraivecida, deteve os irmãos e linchou-os, tocando fogo neles. Quando se aproximaram do edifício governamental do presidente municipal foram recebidos por um destacamento americano de 275 homens liderado por Rangers do Arizona. Outros trabalhadores foram mortos enquanto os líderes grevistas foram colocados na prisão. O jornal norte-americano New York Times, em 3 de junho de 1906, reportou uma matéria em que no dia 1° de junho os grevistas destruíram uma serração e mataram dois irmãos que defendiam a mina. Eram relatadas onze baixas entre os "amotinados" mexicanos.
Grevistas de Cananea confrontam destacamento americano que protegia a loja da companhia
  Respondendo a um apelo telegráfico do coronel William Cornell Greene da Greene Consolited Copper Company, um destacamento de 275 voluntários de Bisbee, Douglas e Naco, Arizona, comandados pelo capitão Thomas H. Rynning dos Rangers do Arizona, entrou no México, contrariando as ordens de Joseph Henry Kibbey, governador do Território do Arizona, e a convite de Rafael Izabal, o governador de Sonora, reforçaram os Rurales de Sonora sob o comando do coronel Emílio Kosterlitsky. Tropas mexicanas encontravam-se a caminho da cidade. Quatro elementos do 5° Regimento de Cavalaria dos Estados Unidos que haviam partido de Fort Huachuca foram detidos em Naco, Arizona, na fronteira México-Estados Unidos por ordem do presidente norte-americano Howard Taft.
Empregados armados em frente à sede da companhia
A QUEDA DE PORFÍRIO
  Desde o princípio do século XX, começou a questionar-se o positivismo, ideologia que mantinha o grupo no poder, o que levou ao descrédito do darwinismo social perpetrado pelos grupos de poder contra a população. Esse fato levou a maioria da população mestiça a reclamar e exigir uma maior participação na tomada de decisões, além de que o grupo dos "científicos" deixou de ser visto como um contingente superior ou como o único capaz de dirigir o governo.
  Em 1910, Porfírio Díaz estava às vésperas de completar 80 anos de idade. Ainda assim, decidiu mais uma vez sair candidato à Presidência. Dessa vez, no entanto, encontrou um adversário que lhe ameaçava o poder: Francisco Madero.
  Francisco Madero (1873-1913), era engenheiro agrônomo formado na França e na Bélgica. Filho de um hacendado, liderou um movimento que culminou na queda de Porfírio Díaz. Governou o México de 1911 a 1913, quando foi fuzilado por um antigo aliado de Díaz.
Francisco Madero
  Durante a campanha, Madero defendeu uma série de reformas para o país, como mudanças na política eleitoral e melhoria nas condições de vida de camponeses e índios. Percebendo a força de seu adversário, Porfírio Díaz mandou prender Madero e se reelegeu mais uma vez presidente da República.
  Madero conseguiu deixar a prisão e exilou-se nos Estados Unidos, onde escreveu um manifesto conhecido como Plano de San Luis Potosí. Escrito em outubro de 1910, esse manifesto convocou os mexicanos para uma revolta armada visando derrubar Porfírio Díaz. Os principais aliados de Francisco Madero eram ricos comerciantes ou hacendados, que desejavam apenas o fim das reeleições de Porfírio Díaz e o sufrágio universal.
Túmulo de Porfírio Díaz no Cemitério do Montparnasse, em Paris - França
  Além desse apoio, Madero também contou com grupos de camponeses e indígenas. Liderados por Pancho Villa, ao norte, e Emiliano Zapata, ao sul, esses grupos reivindicavam uma reforma agrária que lhes garantisse a posse da terra.
  Apesar de não conquistar o poder em todo o país, os grupos de camponeses e indígenas governaram diversas regiões do México durante os dez anos da revolução. Nessas regiões retiraram o poder dos hacendados e da Igreja Católica, realizaram a reforma agrária e construíram vários hospitais e escolas.
  José Doroteo Arango ou
Pancho Villa, como era mais conhecido (1887-1923), aos 17 anos, depois de tentar matar um hacendado para vingar sua família, tornou-se líder de um bando que assaltava trens e fazendas. Em 1910, aderiu à Revolução com seu grupo. Visto com desconfiança pelos revolucionários liberais, foi condenado a fuzilamento e à prisão em 1912, mas conseguiu escapar. Morreu em uma emboscada planejada com o apoio do presidente Álvaro Obregón.
Pancho Villa, em 1918
  Emiliano Zapata Salazar (1879-1919) apoiou Francisco Madero contra Porfírio Díaz, mas se opôs ao governo quando Madero se demonstrou pouco radical. Aliou-se depois às tropas de Venustiano Carranza e Pancho Villa para combater as de Victoriano Huerta. Foi assassinado por um general interessado na recompensa oferecida por Carranza. Inspira o atual movimento zapatista, concentrado no estado mexicano de Chiapas.
Emiliano Zapata
O GOVERNO MADERO
  Ao longo de 1910, irromperam várias revoltas em diferentes regiões do território mexicano. O governo reagiu, mas a população formou guerrilhas que impediam o avanço das tropas federais. Anarquistas também entraram na luta e ocuparam diversas cidades no norte do México.
  A permanência de Porfírio Díaz na Presidência tornou-se insustentável. Em maio de 1911, o ditador renunciou ao poder e embarcou para o exílio na França.
  As renúncias, tanto do presidente como do vice-presidente deram lugar à presidência, ao então secretário de Relações Exteriores, Francisco León de la Barra.
  De la Barra formou um gabinete plural, no qual se incluíam porfiristas, maderistas e independentes, o que ocasionou uma grave crise política, aumentada pela atitude tomada por Madero relativa aos grupos revolucionários, a qual causou fraturas severas.
Francisco León de la Barra (1863-1939)
  De la Barra, convocou eleições presidenciais. A população escolheu Francisco Madero para ocupar a Presidência do México.
A tomada de Ciudad Juárez
  Ciudad Juárez era defendida pelo general Juan Navarro e pelo coronel de infantaria Manuel Tamborell, os quais estavam encarregados das tropas e da guarnição, respectivamente. Os revolucionários, liderados por Pascual Orozco e Pancho Villa, desobedecendo às ordens de Madero, atacaram a guarnição de Ciudad Juárez nos dias 8 e 9 de maio de 1911, conseguindo penetrar nas suas trincheiras. Madero tentou, sem sucesso, deter a investida, porém, mais rebeldes uniram-se paulativamente à transgressão, pelo que finalmente decidiu dar ordem ao resto dos seus homens para prosseguirem o assalto.
  As tropas revolucionárias tomaram a praça no dia 10 de maio, obrigando o general Navarro a assinar a carta de rendição. Então, Madero, de acordo com o Plano de San Luis, foi nomeado presidente provisório e constituiu o seu Conselho de Estado, no qual incluía, entre outros, Venustiano Carranza, o seu irmão Gustavo e José Maria Pino Suárez.
Revolucionários entrando em Ciudad Juárez
  Em 17 de maio, assinou-se um armistício de cinco dias aplicável a toda a República mexicana. No final deste armistício, firmou-se um tratado de paz na referida cidade, o qual pôs fim à revolução madeirista.
  O novo presidente assumiu o poder em novembro de 1911, mas logo despertou a desconfiança de seus eleitores ao nomear cinco ministros ligados ao ex-ditador Porfírio Díaz. Além disso, ao contrário do que esperavam camponeses e indígenas, Madero não promoveu a reforma agrária prometida durante a campanha.
Francisco Madero e líderes revolucionários em 24 de abril de 1911
  Com isso, os zapatistas, como eram conhecidos os seguidores de Emiliano Zapata, continuaram a insurgir no país. Em novembro de 1911 divulgaram o Plano de Ayala, um manifesto exigindo que o governo fizesse, de fato, a reforma agrária e atendesse às reivindicações dos camponeses e das comunidades indígenas mexicanas.
  Militares, também insatisfeitos com o governo de Madero, promoveram alguns levantes que acabaram controlados pelas tropas federais. Entretanto, em fevereiro de 1913, o general Victoriano Huerta, seguidor de Porfírio Díaz, teve melhor êxito: contando com o apoio do governo dos Estados Unidos, liderou um golpe de Estado. O presidente foi fuzilado e Huerta assumiu a Presidência do país.
Victoriano Huerta (1856-1916)
GUERRA CIVIL
  A queda do governo de Francisco Madero deu início a uma guerra civil no México. O governador de um dos Estados mexicanos, Venustiano Carranza (1859-1920), antigo aliado de Madero, formou o chamado Exército Constitucionalista e conclamou a população a pegar em armas para derrubar Victoriano Huerta. Pancho Villa aderiu ao movimento e levou consigo 10 mil soldados.; Zapata também aderiu à luta contra Huerta, liderando as tropas no centro-sul do país.
  Em 1914, o governo dos Estados Unidos enviou soldados para combater o governo Huerta, que estava estabelecendo relações com outras potências, como a Alemanha e a Inglaterra. O governo estadunidense via isso como uma atitude de rebeldia.
  Diante de tantos adversários, Huerta perdeu gradativamente o poder até que, em agosto de 1914, as tropas federais foram definitivamente derrotadas, e Huerta partiu para o exílio.
Forças de Emiliano Zapata, em 1914
CARRANZA NO PODER
  Ao assumir a Presidência em 1914, Carranza procurou assegurar a estabilidade política do país. Ao mesmo tempo que tentava restringir a influência dos militares na vida pública, precisava atender às reivindicações das camadas populares.
  Logo Carranza passou a enfrentar a oposição de antigos aliados, como Pancho Villa e Emiliano Zapata, que discordavam do modo como o presidente pretendia fazer a reforma agrária. Isso deflagrou uma nova guerra, que se estendeu até 1917. O conflito tinha, de um lado, os exércitos populares de Villa e de Zapata, e de outro, as tropas federais, comandadas pelos generais Álvaro Obregón e Plutarco Elias Calles.
Venustiano Carranza (1859-1920)
  Em 1915, o governo Carranza se aliou aos sindicatos operários para derrotar Pancho Villa, o que ocorreu em abril daquele mesmo ano. Enfraquecido, Villa ainda manteve atividades de guerrilha até 1920, quando finalmente se rendeu, recebendo em troca uma fazenda e o direito de manter uma escolta armada.
  Vitorioso na luta contra Pancho Villa, o governo Carranza dissolveu os batalhões formados pelos operários e se recusou a assumir os compromissos firmados com os sindicatos. Os sindicalistas responderam com uma greve duramente reprimida que terminou com a prisão de todos os seus líderes.
Por volta de 1915, Pancho Villa e Emiliano Zapata posam para um foto ao lado de outros revolucionários.
  Emiliano Zapata, por sua vez, foi assassinado em 1919. Até hoje seus objetivos são lembrados pela população mexicana, por meio do movimento denominado de zapatismo.
  O Movimento Zapatista é um movimento surgido em 1994, no estado de Chiapas, que conta com o Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN), liderado pelo subcomandante Marcos, cujo principal é a ampliação dos direitos indígenas e pela valorização de sua cultura no México, além da realização de uma ampla reforma agrária no país.
Subcomandante Marcos (de boné) ao lado do comandante Tacho, em Chiapas
A CONSTITUIÇÃO DE 1917
  Apesar das divergências com os dois principais líderes populares da Revolução Mexicana, o governo de Carranza elaborou em 1917 uma Constituição que trazia grandes avanços políticos e sociais para a época. A Constituição mexicana proibiu que estrangeiros, indústrias e igrejas tivessem posse de terras. Instituiu ainda o ensino obrigatório gratuito e estabeleceu que a exploração dos recursos naturais do país (principalmente o petróleo) ficaria sob a responsabilidade do Estado.
Emiliano Zapata após ter sido assassinado
  A Constituição mexicana de 1917 também limitou o poder da Igreja Católica: proibiu a realização de cultos públicos fora das igrejas, proibiu que os jornais religiosos tratassem de assuntos políticos, negou aos padres e bispos o direito de votar e de fundar e dirigir escolas.
  O México foi o primeiro país a incluir em sua Constituição antigas reivindicações dos operários. A Constituição de 1917 estabeleceu jornada máxima de oito horas de trabalho diárias, fez restrições ao trabalho feminino e infantil, criou o salário mínimo e reconheceu o direito de greve dos trabalhadores.
Carranza ao centro, em 22 de janeiro de 1916
O FIM DA REVOLUÇÃO
  O mandato de Carranza deveria terminar em 1920, quando estavam previstas novas eleições presidenciais. O general Álvaro Obregón desejava ser lançado como o candidato oficial do governo, mas o presidente decidiu apoiar outra pessoa. Rejeitado, o general articulou um golpe para destituir Carranza da Presidência.
  Aliados de Obregón assassinaram Carranza em maio de 1920. Posteriormente, Obregón venceu as eleições e assumiu a Presidência para um mandato de quatro anos. Durante o seu governo, estimulou a criação de sindicatos e centrais operárias, que lhe deram apoio político.
Álvaro Obregón (1880-1928)
  Sucedeu Álvaro Obregón o general Plutarco Elías Calles, que governou de 1924 a 1928. Calle fundou em 1929 o Partido Nacional Revolucionário, que em 1946 passou a se chamar Partido Revolucionário Institucional (PRI). O PRI se manteve na Presidência da República por mais de setenta anos.
Plutarco Elías Calles (1877-1945)
FONTE: Cardoso, Oldimar. Leituras da história, 8º ano / Oldimar Cardoso. -- 1. ed. -- São Paulo: Escala Educacional, 2012. -- (Leituras da história)

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