quinta-feira, 21 de março de 2013

COMÉRCIO GLOBAL E ORGANISMOS INTERNACIONAIS

  Na segunda metade do século XX, o comércio internacional apresentou um crescimento significativo. Nesse período, instituições de âmbito global, como o Banco Mundial, FMI (Fundo Monetário Internacional) e Gatt (Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio) atuaram no sentido de estruturar as relações financeiras e estimular e estabelecer regras para o comércio mundial. A capacidade de produção continuou a ser ampliada de forma expressiva nos Estados Unidos, no Japão, nos países da Europa Ocidental e naqueles que se industrializaram mais intensamente a partir dos anos 1950/1960 (Brasil, Argentina e México), 1960/1970 (Coreia do Sul, Cingapura, Taiwan e Hong Kong) e 1980/1990 (China). As empresas transnacionais tiveram importante papel nessa ampliação da capacidade de produção.
As empresas transnacionais contribuíram para a ampliação do comércio mundial
  Essa conjuntura, somada à maior facilidade de circulação de mercadorias, levou a atividade comercial a crescer, em âmbito mundial, em ritmo maior do que a própria produção. Se em 1990 o total do comércio internacional correspondia a cerca de 18% do PIB mundial, no ano 2000 as cifras das relações comerciais entre os países do globo perfaziam cerca de 26% do PIB do planeta.
  Na primeira década do século XXI, manteve-se a tendência do ritmo de crescimento do comércio internacional superior ao ritmo de crescimento do PIB. No entanto, os desdobramentos da crise econômica e financeira de 2007/2008 poderiam afetar o crescimento do comércio mundial. Isso porque, com a preocupação dos governos em minimizar os efeitos dessa crise, contendo o aumento do desemprego e estimulando as atividades produtivas e de serviços no âmbito nacional, poderia ocorrer a adoção de práticas protecionistas no comércio. Com menos crédito e a economia dos países em crise, a consequência seria a diminuição das exportações e importações de bens e serviços.
Estande de frutas em um mercado de Paris - França.
  A partir dos anos 1980/1990, no contexto da intensificação do processo de globalização, as propostas neoliberais foram amplamente difundidas na economia global. Alegava-se que os países subdesenvolvidos tinham uma economia "fechada", com tarifas de importação elevadas, restrições ao ingresso de capitais e reserva de mercados, entre outros aspectos.
  Atendendo sobretudo aos interesses das empresas transnacionais, os governos dos países desenvolvidos, em especial os Estados Unidos, passaram a apregoar que a abertura econômica ao capital estrangeiro (especulativo ou produtivo), a redução das barreiras comerciais e as privatizações eram o melhor caminho para superar o endividamento externo e aumentar o crescimento econômico.
Mapa dos principais fluxos comerciais regionais
OS FLUXOS DE MERCADORIAS E SERVIÇOS NO MUNDO ATUAL
  Em 2008, o valor das transações comerciais movimentava cerca de 16 trilhões de dólares, no caso das exportações, e 16,4 trilhões de dólares, aproximadamente, no caso das importações. Os países desenvolvidos, um pouco mais de 20 - foram responsáveis por cerca de 53% das exportações e 58% das importações. Quase a metade desse volume de comércio está concentrada entre os países do G-8 e a China (cerca de 47% das exportações e 48% das importações). Os chineses têm ampliado cada vez mais sua participação no comércio internacional. Atualmente, a China é a segunda maior potência comercial do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos.
Principais fluxos de mercadorias
  Os Estados Unidos são a principal potência comercial do globo. Em 2011, exportaram 1,511 trilhão de dólares e importaram 2,314 trilhões. Esse saldo negativo na balança comercial representava o maior déficit comercial do planeta e equivalia, aproximadamente, ao PIB da Austrália.
  O comércio internacional de serviços perfaz atualmente uma parcela considerável do comércio entre países. Esse comércio é representado por fretes de transportes, turismo global, serviços de informática, atividades culturais e desportivas, prestação de serviços a empresas (telemarketing, call center, contabilidade, consultoria), atividades auxiliares de intermediação financeira, edição e reprodução de gravações, entre outros.
Sala de operações numa central de atendimento - um dos setores que têm apresentado os maiores crescimento no setor de serviços
  Como ocorre com o comércio de mercadorias, o de serviços está concentrado em países desenvolvidos, que abarcam cerca de 75% do total mundial. Os Estados Unidos são os maiores exportadores e importadores mundiais e mantêm superávit nesse setor.
  Internamente, os serviços têm participação importante na composição do PIB dos países desenvolvidos (cerca de 80% do total das riquezas geradas em um ano nesses países). No caso brasileiro, os serviços correspondem a mais de 60% do PIB.
  As facilidades proporcionadas pela telemática, com os avanços nas tecnologias de comunicação e informação, têm propiciado o deslocamento e a terceirização de diversas tarefas não relacionadas diretamente à produção, como atendimento e suporte ao cliente; serviços contábeis e fiscais e venda por telefone ou internet. Essas tarefas passam a ser realizadas em outros países, onde a mão de obra é mais barata.
Saldo do comércio externo em porcentagem do PIB
EM BUSCA DE REGRAS PARA O COMÉRCIO GLOBAL
  A intensificação do processo de globalização, com o aumento das relações comerciais e financeiras em nível global, levou à necessidade de se estabelecerem regras comuns aos países participantes dessa nova conjuntura mundial. Num primeiro momento, ocorreu a Rodada do Uruguai e criou-se a OMC, em substituição ao Gatt.
A RODADA DO URUGUAI E A OMC
  A OMC foi criada em 1995, após a Rodada do Uruguai, que se iniciou em 1986, em Montevidéu, e só foi concluída em 1994, em Marrakesh (Marrocos). Com a Rodada do Uruguai, houve redução tarifária significativa em diversos países do globo. No caso dos latino-americanos, as relações implicaram uma redução de 25% a 35% em tarifas de importação.
Ato comemorativo do 20º aniversário da Rodada do Uruguai do Gatt, em 2006.
  As negociações da Rodada do Uruguai definiram uma reformulação no conjunto de regras para o comércio de mercadorias e um inédito sistema de regras para o comércio de serviços e compras governamentais. Também estabeleceram normas para questões ligadas à propriedade intelectual e patentes e às implicações entre o comércio e o meio ambiente, entre outras. Muitas dessas definições resultam das reuniões entre os representantes dos países integrantes da OMC. Chamadas de Conferências Ministeriais, ocorrem a cada dois anos, podendo haver exceções.
Os países em verde escuro, fazem parte da OMC, em verde claro são os membros da União Europeia e em azul os países observadores
  A Rodada do Uruguai marcou também o retorno das discussões sobre  o comércio agrícola, por causa da pressão de países exportadores de gêneros agrícolas, como Brasil, Argentina e Austrália. Esses países pressionam os governos da Europa, do Japão e também dos Estados Unidos a abrir seus mercados aos produtos estrangeiros e a reduzir os subsídios que concedem a seus agricultores.
  Com a conclusão da Rodada do Uruguai e a criação da OMC, ficou definido também que essa organização seria responsável pela resolução de conflitos ou disputas comerciais entre os países-membros. Para a resolução das divergências, há um conjunto de princípios, normas e procedimentos que envolve os chamados Painés, dos quais participam especialistas nos temas relacionados ao conflito. Além disso, a OMC pode oferecer assistência jurídica nos processos.
Estrutura da OMC
PROTECIONISMO DISFARÇADO
  Para dificultar, ou até mesmo impedir, a entrada de mercadorias de outros países em seu território, os países desenvolvidos criam barreiras não tarifárias. As mais comuns são:
  • defesa comercial, relativa a práticas comerciais que desrespeitam os princípios e as regras estabelecidas, como o dumping, prática internacional em que são comercializadas mercadorias com preços muito baixos, às vezes inferiores ao custo de produção, com o objetivo de eliminar concorrentes e conquistar novos mercados. Há ainda o chamado dumping social, em que os países subdesenvolvidos são acusados de aplicar normas e condições trabalhistas muito precárias, barateando seus produtos e ganhando em competitividade;
  • defesa técnica, nos casos em que o produto não apresenta tecnologia adequada, como um veículo cujo sistema de freios é pouco eficiente, um brinquedo que pode afetar a saúde das crianças etc.;
  • defesa sanitária, que envolve principalmente os produtos agropecuários. A importação de uma mercadoria pode ser impedida quando são detectadas doenças em um rebanho, como febre aftosa ou doença da vaca louca, ou produtos agrícolas que foram cultivados com uso excessivo de agrotóxicos ou de fertilizantes e adubos;
  • Garantia de preços mínimos na compra de safras agrícolas dos produtos nacionais e prioridade para a compra da produção interna.
  As barreiras não tarifárias são utilizadas, sobretudo, pelos países desenvolvidos. Apesar do dicurso pela liberalização comercial, estes protegem amplamente os setores produtivos que podem ser afetados pela concorrência de mercadorias importadas. É o que se chama de protecionismo.
Fazenda de criação de gado bovino nos Estados Unidos
  Em contrapartida, esses países (Estados Unidos, Japão e membros da UE) exigem dos subdesenvolvidos maior abertura econômica, com facilidades para investimentos financeiros de curto prazo, importações e ingresso de empresas comerciais (como redes de hipermercados) e de serviços (sobretudo telecomunicações e energia elétrica).
  Por trás do discurso de abertura econômica dos países desenvolvidos e de organismo internacionais (FMI e Banco Mundial) está, entre outros aspectos, o interesse das multinacionais por mais liberdade de atuação, a fim de ampliar suas margens de lucro, aproveitando-se das chamadas vantagens competitivas.
  Assim, a globalização mostra-se um processo assimétrico, no qual os países subdesenvolvidos obtêm pouca vantagem, e os países desenvolvidos, amplos benefícios.
Milho - os Estados Unidos dão subsídios aos produtores para aumentar a produtividade e diminuir a importação desse produto
O COMÉRCIO INTERNACIONAL APÓS A OMC
  Com a criação da OMC, passou a existir, de certa forma um processo permanente de negociações, nas quais os representantes dos países têm discutido a redução das barreiras tarifárias, a eliminação do protecionismo e as questões relacionadas a patentes e barreiras não tarifárias.
A RODADA DOHA
  Em novembro de 2001, teve início em Doha, capital do Qatar, a Rodada Doha, uma série de negociações da OMC visando reduzir as barreiras do comércio internacional. Prevista inicialmente para terminar em 2005 e, depois, em 2006, a Rodada foi marcada por uma série de desentendimentos entre seus participantes.
Doha - capital do Qatar

  Na Conferência Ministerial da OMC, em Cancún (México), em 2003, a divergência de opiniões em relação a uma série de temas, como serviços, patentes, compras governamentais e a questão agrícola, pendentes da Rodada Doha, opuseram, de modo geral, os países desenvolvidos (EUA, Japão e União Europeia) aos subdesenvolvidos, representados pelo G-20 em desenvolvimento (sobretudo Brasil, Argentina, África do Sul, Índia e China). Esse grupo é bastante heterogêneo, com diferentes interesses. Os pontos coincidentes restringem-se à pressão que recebem dos países desenvolvidos para abrir a economia.
Cancún - México
  Em 2008, numa reunião em Genebra, na Suíça, os países desenvolvidos (EUA e União Europeia) continuavam a pressionar os subdesenvolvidos, particularmente os emergentes, a abrirem suas fronteiras para produtos industrializados. Em contrapartida, acenavam com alguma redução nos subsídios agrícolas e nas tarifas de importação de produtos agropecuários.
  O Brasil, por ser competitivo no setor agropecuário, dispunha-se a fazer concessões em termos de abertura nos setores industrial e de serviços. No entanto, a Índia e a China, países mais populosos do planeta e com grande porcentagem de população rural, não concordavam com a redução nas tarifas de importação de gêneros agrícolas, além de discordarem de uma abertura maior no âmbito dos serviços e dos produtos industriais. Em função disso, durante a reunião de Genebra, o Brasil aproximou-se mais da posição dos Estados Unidos e da União Europeia, o que causou uma divisão no grupo do G-20 dos países em desenvolvimento.
  Países membros do G-20
  Países membros da União Europeia que não são individualmente representados no G-20
  Com a crise mundial de alimentos de 2008, dirigentes da OMC enfatizaram a necessidade de se concluir a Rodada Doha, pois acreditavam que uma redução tarifária ampla no setor agropecuário ampliaria a oferta de gêneros alimentícios no mundo. A empreitada, no entanto, fracassou, devido a novos desentendimentos.
FONTE: Lucci, Elian Alabi. Território e sociedade no mundo globalizado: geografia: ensino médio, volume 2 / Elian Alabi Lucci, Anselmo Lázaro Branco, Cláudio Mendonça. - 1. ed. - São Paulo: Saraiva, 2010.

sábado, 16 de março de 2013

AS FRONTEIRAS SE ABREM: "A FUGA DE CÉREBROS"

  A migração de pessoas sem qualificação profissional foi um elemento importante para o mercado de trabalho de países desenvolvidos cuja população já não admitia desempenhar tarefas consideradas menos nobres, como a construção civil e serviços de limpeza de ruas. Essa mão de obra ainda é importante, e os mercados de trabalho desses países continuam sendo abastecidos pelos migrantes do Sul com pouca ou nenhuma especialização.
  Nas últimas décadas, um novo tipo de movimento populacional tem se destacado: a migração de cérebros, ou seja, a migração de mão de obra qualificada. Embora a grande maioria dos migrantes qualificados parta do Sul, existe também a migração Norte-Norte, bem menos expressiva.
A mão de obra barata e qualificada, facilita a "fuga de cérebros" dos países do Sul para os países do Norte.
  Esse tipo de migração tem um caráter econômico adequado às políticas seletivas introduzidas pelos países receptores. Os primeiros países a adotar essas políticas foram a Austrália e o Canadá, ainda na década de 1980. Na década seguinte, foi a vez dos Estados Unidos e, mais recentemente, dos países europeus.
  A mobilidade internacional dos trabalhadores qualificados pode ser vista de diferentes ângulos. Para o país de origem, a saída dos "cérebros" limita suas possibilidades de desenvolvimento, já que fica desfalcado de trabalhadores especializados. Por outro lado, esses emigrantes geram fundos ao enviarem dinheiro para as famílias que permaneceram no país. Para o país de chegada, os "cérebros" suprem a necessidade de mão de obra qualificada, mas podem também representar prejuízo para a mão de obra local na disputa por postos de trabalho.
Mapa da emigração de pessoas qualificadas profissionalmente
O SUL ABASTECE OS MERCADOS ESPECIALIZADOS DO NORTE
  É inegável o peso quantitativo e qualitativo dos emigrantes asiáticos no deslocamento populacional de trabalhadores especializados. A Índia é um dos países com maior "fuga de cérebros". Anualmente, dos 50 mil especialistas indianos do setor de informática, cerca de 15 mil dirigem-se para o Vale do Silício, na Califórnia (EUA), região que abriga as mais famosas empresas de tecnologia, muitas das quais fundadas por imigrantes vindos da Índia, do Paquistão ou de Hong Kong. Essas empresas, por sua vez, contratam novos imigrantes da Ásia ou da América Latina.
Vale do Silício - um dos locais escolhidos pelos trabalhadores qualificados do Sul.
  A Europa Ocidental vive situação semelhante à dos Estados Unidos. Desde 2000, os países dessa região passaram a receber trabalhadores especializados dos países da Comunidade dos Estados Independentes - CEI (sobretudo da Rússia e da Ucrânia), dos países da Europa Central e Oriental e dos países do Sul, principalmente do Magreb, da África Subsaariana, da Índia, da China e da América Latina.
  Na Europa, somam-se aos trabalhadores especializados nos setores de ponta os trabalhadores do setor de saúde, necessários para cuidar do número crescente de idosos. Assim, para o Reino Unido dirigem-se médicos indianos e, para a França, médicos romenos e búlgaros. Portugal recebe um grande número de dentistas brasileiros, e a Itália, enfermeiras asiáticas, principalmente das Filipinas.
Pessoas que moram no Reino Unido por local de nascimento
IMIGRANTES ESPECIALIZADOS NA UNIÃO EUROPEIA
  Na maior parte dos países-membros da União Europeia, o recrutamento de trabalhadores estrangeiros é feito por iniciativa do empregador e deve obedecer a uma série de princípios estabelecidos pelo bloco.
  Um desses princípios determina que a admissão de um imigrante especializado só poderá ser feita se nenhum  trabalhador de qualquer outro país do bloco estiver disponível. Somente se mesmo após colocar anúncios em jornais ou em agências de emprego - a vaga continuar em aberto será possível a contratação do estrangeiro.
  A Alemanha encontrou uma brecha para atender à necessidade de trabalhadores no setor de informática; o governo alemão fornece uma carta verde para trabalho temporário com prazo máximo de cinco anos.
Percentual de população de imigrantes em cada país

  Mais de 50%
  20% a 30%
  10% a 20%
  4% a 10%
  1% a 4%
  Menos de 1%
  Sem dados

FONTE: Geografia, 2° ano: ensino médio / organizadores Fernando dos Santos Sampaio, Ivone Silveira Sucena. - 1. ed. - São Paulo: Edições SM, 2010. - (Coleção ser protagonista).

sexta-feira, 15 de março de 2013

A BATALHA PELO OURO NEGRO NA ÁFRICA NEGRA

  Existe um grande prejuízo causado ao meio ambiente pelo amplo uso do petróleo, e esse recurso não é renovável, irá se esgotar mais cedo ou mais tarde. Apesar disso, estamos longe de chegar a acordos firmes para reduzir o consumo de petróleo ou de adotar uma fonte energética que realmente o substitua.
  Em 2008, a capacidade de produção de petróleo era apenas 3,1% superior à demanda, o que pareceu pôr um freio ao crescimento do uso desse recurso. Mas já em 2010 o consumo tornou a subir. Em boa parte, esse aumento deve-se ao fortíssimo crescimento econômico chinês.
  Para manter a taxa de crescimento em 9% ao ano, a China precisa de cada vez mais petróleo. Hoje a China é uma grande investidora na África e, em particular nos estados muçulmanos da região, como o Sudão. Em troca, o Sudão envia 60% de seu petróleo para a potência asiática.
Importações de petróleo por país
  Apesar da África não ser tão rica em hidrocarbonetos (tanto gás como petróleo) como os países do Oriente Médio, a produção e as reservas do continente são significativas. Por isso, a África é objeto de grande competição por parte das companhias de petróleo e gás.
  Alguns especialistas pensam que a produção petrolífera africana, em especial ao longo do litoral Atlântico do continente, poderá atrair grandes investimentos, contribuindo com mais de 30% da produção mundial de hidrocarbonetos líquidos nos próximos anos. No final da década de 2000, de cada quatro barris de petróleo descoberto fora da América do Norte, um foi encontrado na África. Imagina-se que até 100 bilhões de barris estejam por ser descobertos - próximo das reservas do Iraque.
Reservas de petróleo em altomar
  O congressista estadunidense William Jefferson anunciou alegremente em 2004: "No ano passado, 8 bilhões de barris de petróleo foram descobertos ao redor do mundo, e sete bilhões deles estão além da costa da África Ocidental". O tesouro está lá e já está em disputa.
  O atentado de 11 de setembro de 2001 (quando foram destruídos os edifícios do World Trade Center, em Nova York) fortaleceu a decisão estadunidense de incluir a África em suas prioridades geopolíticas. Fundado em 2002, o Grupo de Iniciativa Política do Petróleo Africano (Aopig), que conta com representantes do governo estadunidense e de empresas privadas, tem influenciado a política energética dos Estados Unidos.
Exportações de petróleo por país
  No século XX, o norte da África dominava a produção, mas hoje o centro petrolífero se deslocou para o golfo da Guiné, englobando os ricos campos que vão da Nigéria a Angola. Uma vantagem adicional dessa região, do ponto de vista estadunidense, é que suas reservas já estão voltadas para o Atlântico, facilitando o transporte até a costa leste dos Estados Unidos. Atualmente, está em construção o oleoduto Chade-Camarões, pelo qual flui para o litoral atlântico o óleo produzido no interior do continente.
Oleoduto Chade-Camarões
  Atualmente o continente representa por volta de 10% da produção de petróleo mundial e 9,3% das reservas conhecidas. Seus campos são menores e mais profundos do que os do Oriente Médio, o que torna o custo de produção mais alto. Mas o petróleo bruto africano tem geralmente baixo teor de enxofre, e isso é bastante atrativo. A África tem atualmente doze grandes produtores de petróleo, todos membros da Associação Africana de Produtores de Petróleo. Os maiores são Nigéria, Argélia, Líbia e Angola, que respondem por cerca de 75% da produção total.
  Na primeira década do século XXI, as companhias americanas de petróleo investiram mais de 60 bilhões de dólares na África. O investimento petrolífero representa agora mais de 50% de todo o investimento direto estrangeiro no continente. Os interesses estratégicos dos Estados Unidos certamente incluem não só acessar importações petrolíferas de baixo teor de enxofre, baratas e de confiança, como também manter à margem os chineses (por exemplo no Sudão) e os sul-coreanos (na Nigéria, por exemplo) - novos e agressivos atores no negócio do petróleo africano.
Reservas mundiais de petróleo por região
  Um dado extra ajuda a entender o interesse estadunidense e chinês pelo petróleo na África: entre os países africanos ao sul do Saara, apenas a Nigéria e Angola são membros da Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo). Com o fortalecimento da produção africana, o controle do mundo árabe sobre os preços teria uma contrapartida.
  Ao olharmos para a Guiné Equatorial podemos observar um exemplo da ação dos Estados Unidos no continente. Com reservas avaliadas em 2 bilhões de barris de petróleo e um produto interno bruto (PIB) que cresceu 70% em 2001, o país foi apelidado de "Kuwait da África". O governo de George W. Bush (presidente dos Estados Unidos de 2001 a 2009) reabriu seu consulado na capital, Malabo (fechado durante o governo anterior, de Bill Clinton), e excluiu o país da lista de países africanos reprovados por violações de direitos humanos. Dois terços das concessões para prospecção de petróleo na Guiné Equatorial foram concedidas a operadoras estadunidenses ligadas ao governo Bush. A partir de 2004, as manobras militares regulares americanas passaram a incluir a região.
Produção de petróleo na África
  O ouro negro que jorra do subsolo africano colocou a África novamente nos circuitos comerciais ocidentais, mas também no centro da geopolítica energética mundial. Historicamente, a atuação da indústria do petróleo é conhecida por ser invasiva e turbulenta. O impacto de sua ação no continente só poderá ser avaliada nos próximos anos.
FONTE: Geografia, 2° ano: ensino médio / organizadores Fernando dos Santos Sampaio, Ivone Silveira Sucena. - 1. ed. - São Paulo: Edições SM, 2010. - (Coleção ser protagonista).

quinta-feira, 14 de março de 2013

A INDÚSTRIA, A AGROPECUÁRIA E O ESPAÇO AGRÁRIO MUNDIAL

  As atividades agrícolas e pecuárias são desenvolvidas pelos seres humanos há mais de 10 mil anos. Durante esse período, povos de várias partes do mundo aprenderam a cultivar diferentes tipos de plantas, como o trigo, o arroz e a cana-de-açúcar na Ásia; a aveia, o centeio e a beterraba na Europa; o milho, a mandioca e o cacau na América. A domesticação e a criação de animais em rebanhos, por sua vez, também foram fatores importantes para a subsistência de diversos grupos humanos.
  Para que fosse possível desenvolver a agricultura e a pecuária, os seres humanos precisaram criar instrumentos, como arados, enxadas e foices, técnicas de cultivo, como a irrigação e o pousio - que visa interromper o uso de determinada área de plantio durante certo tempo, a fim de recuperar a fertilidade do solo -, além de técnicas de criação, como a transumância - migração periódica dos rebanhos, realizada em diferentes épocas do ano, em busca de melhores pastagens.
Agricultura de pousio - uma das técnicas para aumentar a produtividade no campo
  Esses recursos possibilitaram maior controle sobre os processos naturais. Como resultado, obtiveram-se colheitas mais fartas e rebanhos mais sadios. Além disso, surgiram diferentes formas de organização em torno do trabalho agropecuário, envolvendo, por exemplo, a divisão de tarefas no interior dos grupos sociais, como a preparação da terra, o plantio e a colheita, o que estreitou as relações entre os indivíduos e ampliou ainda mais seus laços culturais.
  Em todos os continentes, áreas florestais e de campos foram desmatadas para dar lugar as plantações, pastagens e áreas de extração vegetal e mineral, processo que transformou antigas paisagens naturais em paisagens rurais. O campo tornou-se então o espaço geográfico da produção agrícola, alimentando e suprindo com matérias-primas os camponeses e a população que vivia nas aldeias e nas cidades.
A agricultura modificou as relações de produção. Na figura, agricultores do Egito Antigo colhendo trigo às margens do rio Nilo.
A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL E AS TRANSFORMAÇÕES NO CAMPO
  Com a consolidação da atividade industrial ocorrida nos últimos dois séculos, houve profundas transformações tanto nas formas de produção agrícola quanto nas relações econômicas entre o campo e a cidade, sobretudo nas nações que foram berço da Revolução Industrial.
  A atividade fabril, sediada preferencialmente nas cidades, subordinou a seus interesses econômicos as atividades agropecuárias e de mineração. Dessa forma, o campo passou a produzir alimentos para a crescente população urbana e matérias-primas (como grãos, fibras, madeiras, resinas, carvão, minérios, etc.) para a indústria em desenvolvimento.
  Para atender a demanda da indústria, o setor agropecuário precisaria produzir em grande quantidade e em um período de tempo menor, o que exigia um aperfeiçoamento das tecnologias empregadas na produção. Essa condição foi alcançada por meio de estudos científicos desenvolvidos na área agronômica e veterinária e pelo desenvolvimento de máquinas e insumos cada vez mais eficazes, fornecidos pela própria indústria. Desse modo, o campo deixou de ser exclusivamente um espaço de produção tornando-se também um importante espaço de consumo de bens industrializados.
Revolução Industrial - aprofundou as relações de trabalho e acelerou o processo de urbanização.
A AGROPECUÁRIA COMERCIAL MODERNA
  A partir do final do século XIX, o consumo de alimentos pela população e de matérias-primas agrícolas pelo setor industrial atingiu patamares sem precedentes na história das sociedades capitalistas.
  Para que fosse possível suprir essa demanda, as empresas ligadas aos setores químico e mecânico e os governos dos países industrializados começaram a investir grandes quantias no desenvolvimento de tecnologias agropecuárias, viabilizando a ampliação das áreas cultivadas e de pastoreio, assim como o aumento da produtividade por área de lavoura e de criação.
Plantio em terraços - técnica muito utilizada em área de relevo íngreme
  Nesse contexto estabeleceu-se a chamada agropecuária comercial moderna, caracterizada pelo uso intensivo de recursos tecnológicos, como máquinas (arados, tratores, semeadeiras, colheitadeiras, ordenhadeiras) e insumos (adubos químicos, pesticidas, sementes geneticamente selecionadas, vacinas).
  Nesse sistema agrícola, a grande parte das propriedades rurais é administrada como uma empresa, e são controlados os custos de produção em todas as etapas, do preparo do solo à colheita. Com a modernização, a agricultura e a pecuária transformaram-se em atividades econômicas geradoras de lucro, fato que marcou, de maneira definitiva, a introdução das relações capitalistas de produção no espaço agrário, tanto dos países desenvolvidos, como Estados Unidos, Canadá, Austrália e países da Europa Ocidental, quanto nos países subdesenvolvidos de industrialização tardia, como Brasil, México, Argentina e África do Sul. A partir de então, a terra e os produtos dela extraídos passaram a ser considerados mercadorias que possibilitam aos donos dos meios de produção acumular cada vez mais riquezas.
Colheitadeira em um campo de cultivo de cereais
  Atualmente, o nível de tecnicismo aplicado na agropecuária comercial moderna exige que a produção seja acompanhada por mão de obra especializada (técnicos, engenheiros agrônomos, veterinários, etc.), mas limita o número de empregados nas propriedades rurais, já que as máquinas substituem grande parte da força de trabalho humana, sobretudo a mão de obra menos qualificada. Com isso, nos últimos sessenta anos, verificou-se o declínio da População Economicamente Ativa (PEA) no setor primário, sobretudo nos países industrializados.
Plantação de batata orgânica
  Em razão do alto custo dos equipamentos e dos insumos, a agropecuária moderna é aplicada somente em médias e grandes propriedades rurais, geralmente com o plantio de uma única espécie vegetal ou a criação de apenas uma espécie animal. É por isso que hoje, grande parte das paisagens rurais é ocupada por lavouras monocultoras e por extensas áreas de criação.
  Essa especialização da produção também decorre da imposição de grandes corporações transnacionais do setor alimentício, as quais têm ditado ao mercado mundial o preço de comercialização dos produtos agropecuários.
Agrofloresta em Banfora - Burkina Fasso
  Entre os produtos agropecuários altamente valorizados no mercado internacional, destacam-se o milho, o trigo, a soja, o gado bovino e suíno e as aves, especialmente frangos e galinhas poedeiras.
OS PROFISSIONAIS DO CAMPO
  O desenvolvimento das atividades agrícolas ocorre com o auxílio de diferentes profissionais, como os agrônomos, que acompanham todo o processo de produção agropecuária, os médicos veterinários e os zootecnólogos, que assistem a criação de animais, os engenheiros agrícolas e florestais, além dos especialistas em viticultura, administração rural, irrigação e drenagem.
Trabalhadores colhendo melão em Mossoró - RN
  Os profissionais que estão ligados  às chamadas Ciências Agrárias buscam o desenvolvimento das práticas agrícolas por meio de inovações tecnológicas, como novas técnicas de produção e aprimoramento genético e da biotecnologia. Eles também orientam os produtores rurais em relação às técnicas de irrigação, utilização de fertilizantes e agrotóxicos, armazenagem e conservação de produtos agrícolas, entre outros.
  Além disso, os profissionais do campo estudam e pesquisam o ambiente e suas características naturais e culturais, a fim de atuar com maior propriedade sobre o espaço rural.
Cultivo hidropônico de morangos
CAMPO: UMA NATUREZA SOCIALMENTE MODIFICADA 
  O processo de subordinação das atividades agrícolas à produção industrial, sobretudo no desenvolvimento da agropecuária comercial moderna, vem alterando substancialmente os elementos presentes nas paisagens rurais em grande parte do planeta. Nessas áreas, o campo apresenta cada vez mais como um espaço impregnado de objetos técnicos, engenhos criados pela sociedade industrial como torres de transmissão de energia, silos e armazéns de grãos, estradas, extensas monoculturas, máquinas agrícolas, entre tantos outros. Além desses engenhos, muitos dos elementos da natureza presentes nesse espaço geográfico também apresentam a sua forma ou suas propriedades alteradas pela tecnologia.
Laranjal em Avaré - SP
  Alguns exemplos de técnicas utilizadas na agricultura são:

  •  Atualmente, boa parte dos solos utilizados para o cultivo agrícola tem sua composição química modificada por meio da aplicação de adubos e fertilizantes industrializados.
  • Em diversas partes do mundo, rios e córregos têm o curso alterado a fim de favorecer a canalização, a ocupação das margens ou, ainda, a utilização de parte de suas águas na irrigação de plantações.
  • Muitas das plantas que observamos nas paisagens culturais têm suas características naturais alteradas pela ação humana. Por exemplo, algumas delas são exóticas ao habitat em que foram plantadas, tendo sido, para tanto, climaticamente adaptadas ou manipuladas geneticamente em laboratório.
Processo de calagem no cerrado para corrigir a acidez do solo.
  Pode-se dizer então, que muitos dos elementos naturais presentes nas paisagens rurais passaram, de alguma forma, pela ação transformadora das mãos humanas. Esses elementos compõem aquilo que chamamos de natureza socialmente modificada.
A IMPORTAÇÃO DE ELEMENTOS NATURAIS
  Nos últimos séculos, grande parte dos elementos naturais inseridos nas diversas paisagens culturais de nosso país é fruto da intervenção do ser humano na natureza. Por exemplo, muitas vezes, quando colocamos comida em nosso prato, não nos damos conta de que o arroz é nativo da Ásia. O mesmo acontece com a cana-de-açúcar, originária da Nova Guiné e introduzida no Brasil há cerca de quinhentos anos, e com o trigo, proveniente da Europa e do Oriente Médio.
Ovelhas pastando - a ovelha foi um dos primeiros animais a ser domesticado
A REVOLUÇÃO VERDE E A MODERNIZAÇÃO AGRÍCOLA NOS PAÍSES SUBDESENVOLVIDOS
  A partir da década de 1950, o processo de modernização da agricultura deu um ousado salto tecnológico com o desenvolvimento de plantas geneticamente modificadas em laboratórios. Genes de diversas espécies agrícolas foram alterados para aumentar a produtividade das lavouras, que passaram a ser cultivadas com a utilização de grande quantidade de defensivos agrícolas (agrotóxicos) e de maquinários.
  Sob o pretexto de que o mundo deveria assegurar uma produção de alimentos suficiente para exterminar a fome, multinacionais detentoras das patentes de insumos agropecuários passaram a vender sementes geneticamente modificadas com um "pacote" de insumos necessários ao seu cultivo para países subdesenvolvidos como Egito, Índia, México e Brasil, onde o problema da fome era mais acentuado.
Soja - um dos produtos geneticamente modificado
  Esse modelo de desenvolvimento agrícola importado dos países desenvolvidos, baseado na mecanização do campo e no uso da biotecnologia e de insumos químicos, ficou conhecido como Revolução Verde. Essa revolução provocou profundas transformações no espaço agrário dos países subdesenvolvidos, alterando as práticas agrícolas e a estrutura fundiária. Isso significa que se modificou a maneira como os camponeses desenvolviam o cultivo de alimentos e a criação de animais, assim como a forma de organização e de distribuição das propriedades rurais, de acordo com sua quantidade e extensão.
Vacas da raça Holstein nos Açores
  A concessão de financiamentos bancários subsidiados pelos governos nacionais e por fundo dos países desenvolvidos, sobretudo os médios e grandes produtores rurais, possibilitou a transformação de muitas áreas antes ocupadas por agricultura de subsistência desenvolvidas de forma artesanal (como arroz na Ásia, feijão e mandioca no Brasil e na África Subsaariana e batata na América Andina) em extensas lavouras monocultoras mecanizadas (sobretudo de soja, milho e trigo), desenvolvidas com tecnologias importada e destinadas ao mercado internacional.
Campo com cultivo de flores
  As monoculturas avançaram também em direção à regiões ambientalmente preservadas dos países subdesenvolvidos, dando origem  às chamadas regiões ou zonas de fronteira agrícola, território de um país onde ocorre o avanço das atividades agropecuárias. Nesses casos, as zonas de fronteira agrícola avançaram sobre florestas, matas e campos naturais, drenaram pântanos e alagadiços, dando lugar a plantações e pastagens. Isso ocorreu no Brasil com o avanço da fronteira agrícola sobre as áreas do Cerrado e da floresta Amazônica, no Centro-Oeste e na região Norte do país.
Cultivo em área desmatada da floresta Amazônica
  A Revolução Verde também acentuou o processo de concentração de terra nos países nos quais foi implantada. Isso ocorreu porque muitos produtores rurais, por não terem atingido os níveis de produtividade esperados em razão de intempéries climáticas ou inadaptação dos produtos plantados às condições ambientais do território (relevo, solo, etc.), acabaram endividados, sendo obrigados, muitas vezes,  a ceder suas terras aos bancos credores para salvar dívidas contraídas na compra de maquinários e insumos ou a vender suas propriedades a fazendeiros eventualmente mais bem-sucedidos. Hoje em dia, calcula-se que os produtores rurais que se valem de recursos da agricultura moderna comprometeram cerca de 55% dos custos da produção na compra de agroquímicos (sementes, fertilizantes e defensivos), fato que os tem tornado "reféns" das multinacionais que fabricam esses insumos e dos bancos que financia esse tipo de produção.
Agricultura orgânica
  Ainda que tenha aumentado consideravelmente a produção agrícola mundial, a Revolução Verde não eliminou o problema da fome, uma vez que os produtos plantados (basicamente cereais) nos países subdesenvolvidos têm se destinado em grande parte ao abastecimento do mercado consumidor dos países ricos industrializados (Estados Unidos, Canadá, União Europeia e Japão). Além disso, o uso de agrotóxicos e de máquinas agrícolas não adaptadas aos tipos de solos tropicais e a substituição de ecossistemas importantes por áreas de monocultura e de pastagem acarretaram uma série de impactos ambientais irreversíveis.
Cultivo hidropônico de alface
FONTE: Boligian, Levon. Geografia espaço e vivência, volume único / Levon Boligian, Andressa Turcatel Alves Boligian. -- 3. ed. -- São Paulo: Atual, 2011.

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