O Brasil teve sua geografia alterada na última década no sentido de aprofundar o processo de interiorização. Isso se reflete na expansão das cadeias produtivas de carne, grãos e algodão em direção ao Centro-Oeste e ao Norte. Isso tudo é fruto das políticas desenvolvidas pelo governo brasileiro há décadas.
Diversas políticas de interiorização do crescimento desde a década de 1940, atraíam populações para a região central do país, num movimento conhecido como Marcha para o Oeste.
A Marcha para o Oeste foi um projeto dirigido pelo governo Getúlio Vargas no período do Estado Novo, para ocupar e desenvolver o interior do Brasil, principalmente o Centro-Oeste, onde havia muitas terras desocupadas. O objetivo era produzir matérias-primas e gêneros alimentícios a baixo custo para subsidiar a implantação da industrialização no Sudeste, além de diminuir os desequilíbrios existentes entre as diversas regiões do país.
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Cartaz da década de 1930 incentivando a população brasileira a se mudar para a recém-inaugurada capital de Goiás, Goiânia |
A ocupação do Centro-Oeste visava também promover uma etapa preliminar à ocupação da Amazônia.
Os principais objetivos da Marcha para o Oeste eram: criar uma política demográfica de incentivo à migração, criação de colônias agrícolas, construção de estradas, realizar a reforma agrária e incentivar à produção agropecuária de sustentação. Em Goiás foi instalada a primeira
colônia agrícola do país, em 1941, na cidade de Ceres, a Colônia
Agrícola Nacional de Goiás (CANG).
Esse projeto se intensificou anos mais tarde, com a construção de Brasília e sua inauguração, em 1960, durante o governo de Juscelino Kubitschek, transformando-se na nova capital do Brasil.
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Inauguração de Brasília, em 21 de abril de 1960 |
A infraestrutura rodoviária construída para viabilizar a transferência do poder para a nova capital integrou amplas regiões do país. Novas vias de circulação possibilitaram maior mobilidade da população, como a construção das rodovias que interligaram Rio De Janeiro e São Paulo a Brasília e a Rodovia Brasília (concluída em 1974).
A modernização da agricultura na Região Sul, a partir da década de 1970, liberou um excedente de mão de obra que migrou para o Centro-Oeste e para o Norte, fazendo avançar a fronteira agrícola. Tal processo de colonização teve o incentivo governamental e de empresas interessadas em atrair contingentes populacionais para seus empreendimentos, formando as frentes pioneiras, caracterizadas pela presença de capital na produção.
As frentes pioneiras era o deslocamento de várias pessoas para a ocupação de determinado espaço nacional. A princípio, um grupo de pessoas iniciavam a ocupação, vivendo primeiramente da agricultura e depois da mineração. Isso atraía pessoas de vários locais do Brasil, transformando em pouco tempo terras ociosas em produtivas e povoadas.
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Frentes pioneiras no Brasil |
A expansão do povoamento se fez em direção a novos espaços de fronteira econômica, dinamizados pela utilização de formas capitalistas de organização da produção.
A implementação do Plano de Integração Nacional (PIN) na década de 1970 e a consequente construção de diversas rodovias, como a Cuiabá-Santarém (1973), a Manaus-Boa Vista (1976) e a Transamazônica (1972), abriram as portas para os deslocamentos de nordestinos e sulistas para a Região Norte. O PIN foi criado durante o governo militar do General Médici por meio do Decreto-Lei Nº 1.106, de 16 de julho de 1970, objetivando utilizar a mão de obra nordestina, que sofria com as secas de 1969 e 1970, e preencher os vazios demográficos da Amazônia, com os lemas "Integrar para não entregar" e "Uma terra sem homens para homens sem terra".
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Construção da Transamazônica |
Para incentivar a ocupação regional foram criados centros de colonização - as agrovilas - em meio a floresta. Essas agrovilas eram pequenas comunidades localizadas nas margens da Transamazônica.
No papel, cada agrovila teria até 64 famílias, escola, igreja ecumênica, posto médico e pequeno comércio. Umas poucas agrovilas prosperaram e se tornaram cidades, como o caso de Rurópolis e Pacajá, no Pará, atualmente com mais de 40 mil habitantes cada. Porém, a maior parte dessas agrovilas não prosperaram devido a falta de investimentos, por parte do governo, para que os agricultores pudessem desenvolver suas atividades. Sem tecnologia para produzir, a maior parte dos colonos abandonaram as terras, buscando outros espaços ou até mesmo voltando para sua terra natal.
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Pacajá - PA |
Com a participação de empresas transnacionais, incentivos fiscais e investimentos do governo federal, nas décadas de 1970 e 1980, foram implantados no norte do país projetos de mineração, que atraíram muitos garimpeiros para a região. Um exemplo desses projeto foi o Projeto Grande Carajás.
O Projeto Grande Carajás (PGC), é um projeto de exploração mineral, iniciado em 1980, na mais rica área de minério do planeta, pela Vale - antiga Companhia Vale do Rio Doce (CVRD). Estende-se por 900 mil km², numa área que corresponde a um décimo do território brasileiro, sendo cortada pelos rios Xingu, Tocantins e Araguaia e englobando terras do sudeste do Pará, norte do Tocantins e sudoeste do Maranhão. É a maior área de minério de alto teor de ferro do mundo. Além do minério de ferro são explorados nessa área manganês, cobre, níquel, ouro, bauxita e cassiterita. O Japão é o maior parceiro do Brasil, garantindo em Carajás o suprimento de matéria-prima ao parque industrial japonês. A China também é outro importante parceiro do Brasil na exportação dos produtos de Carajás.
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Exploração mineral na Serra do Carajás - PA |
Algumas consequências desses projetos foram os problemas socioambientais decorrentes dessa ocupação. O desmatamento, realizado na maior parte das vezes por madeireiros, de maneira ilegal, empobrece os solos da região, tornando-os muitas vezes inadequados para a agricultura e impedindo a população nativa de obter o seu sustento com o extrativismo.
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O desmatamento e a ampliação das áreas de pecuária são um dos principais problemas da Amazônia |
A violência na região também é um problema. Muitos migrantes instalaram-se como posseiros ou grileiros, causando diversos problemas com as populações nativas e indígenas e, ainda, com os defensores desses povos, como padres e missionários.
Os posseiros são lavradores que juntamente com a família ocupam pequenas áreas de terras devolutas ou improdutivas, ou seja, que não estão sendo utilizadas e que pertencem ao governo. Eles têm a posse da terra, mas não têm um documento oficial que prove que eles são os donos ou proprietários da terra. Já os grileiros são, geralmente, grandes empresas ou fazendeiros que se utilizam da força e da violência para se apropriar de terras devolutas ou terras trabalhadas por posseiros. Contratam jagunços para "limpar" o terreno, expulsam índios e posseiros e conseguem a documentação falsa da terra, transformando a propriedade em objeto de especulação imobiliária ou instrumento de negócios.
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Posseiros são pequenos agricultores que ocupam um pedaço de terra sem o título de propriedade |
Um exemplo do conflito entre posseiros, grileiros, nativos e de missionários que defendem os povos da floresta aconteceu com o assassinato da Irmã Dorothy Stang, que foi assassinada com seis tiros no município de Anapu, no estado do Pará.
Irmã Dorothy estava presente na Amazônia desde a década de 1970 junto aos trabalhadores rurais da região do Xingu, e sua atividade pastoral e missionária buscava a geração de emprego e renda com projetos de reflorestamento em áreas degradadas, focando-se, também, na minimização dos conflitos fundiários na região.
Defensora de uma reforma agrária justa e consequente, Irmã Dorothy mantinha intensa agenda de diálogo com as lideranças camponesas, políticas e religiosas, na busca de soluções duradouras para os conflitos relacionados à posse e à exploração da terra na Amazônia.
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Irmã Dorothy Stang - uma grande defensora dos povos da floresta |
FONTE: Terra, Lygia. Conexões: estudos de geografia do Brasil / Lygia Terra, Regina Araújo, Raul Borges Guimarães. - 1. ed. São Paulo: Moderna, 2009.