domingo, 30 de novembro de 2014

AS ÁGUAS SUBTERRÂNEAS

  Em geologia considera-se água subterrânea toda a água que ocupa os espaços vazios de uma formação geológica, os aquíferos.
  Os depósitos de água subterrânea são formadas pela infiltração das águas das chuvas nas areias e argilas que constituem o solo e nas fendas das rochas existentes no subsolo (percolação). A profundidade em que se situam e seu tamanho dependem das condições do terreno. Solos arenosos são mais permeáveis que os argilosos e permitem que a água penetre mais profundamente. A presença de cobertura vegetal pode tornar permeável mesmo os solos argilosos, pois o húmus formado pela decomposição da matéria vegetal faz com que as partículas de argila se agreguem, dando origem a grãos maiores de terra e com maiores espaços entre eles.
  Nem toda água que está embaixo da terra é considerada como água subterrânea por haver uma distinção daquela que ocupa o lençol freático, que é chamada de água de solo e tem maior interesse para a agronomia e botânica.
  Para que as águas se acumulem e formem os grandes reservatórios, chamados aquíferos, é necessário que as rochas situadas abaixo da superfície tenham fendas para permitir a passagem da água, assim como é preciso que exista um espaço no subsolo capaz de abrigar a água acumulada.
Perfil esquemático de um aquífero
  Quanto mais profundo for o depósito subterrâneo, melhor será a qualidade da água, que terá sido filtrada por várias camadas de solo antes de se acomodar. Calcula-se que os volumes armazenados nos aquíferos são aproximadamente 200 vezes superiores aos disponíveis nos rios e lagos.
  Quando afloram à superfície, essas águas subterrâneas formam nascentes de rios. Muitas vezes, pela pressão das rochas que se situam sobre os aquíferos, a água jorra para a superfície.
  As águas subterrâneas são identificadas de duas formas: a primeira chamada de zona não-saturada onde a água se encontra espalhada entre o ar, o solo e as rochas; a segunda é denominada de zona saturada, onde a água se encontra armazenada em grande quantidade, formando uma espécie de rio subterrâneo.
  Além dessa classificação, existem dois tipos de águas subterrâneas: o freático e o artesiano. O freático está situado na zona não-saturada, ficando nas proximidades da superfície, estando mais propício à contaminação. O artesiano se encontra na zona não-saturada, um pouco afastado da superfície. É nessa área onde são cavados os poços artesianos, objetivando retirar a água desses locais.
Esquema do lençol freático
  Tendo em vista a crescente poluição dos rios e córregos, especialistas em recursos hídricos acreditam que os aquíferos são cada vez mais importantes para a obtenção de água potável. Mas os aquíferos também não estão livres de poluição.
  Nas regiões onde o ar se encontra muito poluído, parte dos poluentes fica retida nas camadas superficiais do solo com a água da chuva, podendo alcançar e contaminar os depósitos subterrâneos. Quando a poluição provém do próprio solo, por exemplo pela utilização de agrotóxicos e de fertilizantes químicos para a agricultura, o problema torna-se ainda mais grave.
Esquema de poluição das águas subterrâneas
  A exploração das águas subterrâneas envolve alguns cuidados técnicos. Quando grandes quantidades de água são retiradas dos aquíferos em pouco tempo, pode haver uma reacomodação das camadas rochosas, ou seja, o terreno pode afundar. Esse fenômeno já aconteceu em algumas grandes cidades do mundo nas quais se utiliza muita água subterrânea para o abastecimento da população. É o que se verifica na Cidade do México, onde as águas subterrâneas são utilizadas há mais de 100 anos, o que provoca o afundamento do solo. Além disso, os reservatórios foram contaminados por vazamentos que ocorreram nas tubulações e por agrotóxicos empregados na agricultura.
Esquema de lençol subterrâneo
  Os aquíferos podem ser:
Aquífero livre ou freático
  É uma formação geológica de característica permeável, praticamente saturada de água. Sua base é formada por uma camada impermeável composta por argila ou outro tipo de rocha sedimentar, ou pode ser semipermeável. Neste aquífero existe uma superfície livre de água que se encontra sob pressão atmosférica (superfície piezométrica). Em aquíferos livres o nível da água varia segundo a quantidade de chuva e é o tipo de aquífero mais comum e mais explorado pelo homem. Porém, são também os aquíferos que apresentam os maiores problemas de contaminação.
Esquema de um aquífero livre

Aquífero confinado ou cartesiano
  Este tipo de aquífero ocorre quando a água subterrânea está confinada sob uma pressão superior à pressão atmosférica devido à existência de uma camada confinante impermeável acima do aquífero. Pelo fato de a água encontrar-se a uma pressão superior à atmosférica, quando se faz um furo para extração, a água sobe até a superfície sob a forma de repuxo, sendo o furo artesiano denominado furo repuxante.
  Quanto ao tipo de rocha armazenadora, os aquíferos podem ser:
  • Aquíferos porosos - esses tipos de aquíferos apresentam espaços vazios de pequenas dimensões (poros), por onde a água circula. Estão associados com rochas do tipo sedimentares consolidadas, solos arenosos e sedimentos inconsolidados. Representam o grupo de aquíferos mais importantes, devido ao grande volume de água que armazenam e também por serem encontrados em muitas áreas.
  • Aquíferos fraturados ou fissurados - são caracterizados por possuírem fraturas abertas que acumulam água. Estas fraturas representam o resultado de alguma deformação sofrida por uma rocha quando esta é submetida a esforços tensionais de natureza diversa. Os aquíferos fraturados estão associados com rochas do tipo ígneas e metamórficas.
  • Aquíferos cársticos - são formados em rochas carbonáticas. As fraturas presentes neste tipo de aquífero podem atingir dimensões maiores, devido à dissolução do carbono pela água. Assim, podem formar grandes rios subterrêneos.
Esquema de um aquífero cárstico
  Os aquíferos desempenham importantes papéis na natureza e cumprem várias funções. Através deles os cursos de águas superficiais são mantidos estáveis e o excesso de água (transbordamento) é evitado através da absorção da água da chuva. Assim, em regiões como a Ásia tropical, caracterizada por uma longa estação quente (nove meses) e marcada por chuvas intensas, os aquíferos são de grande auxílio.
PRINCIPAIS AQUÍFEROS DO MUNDO
Aquífero Guarani
  Um dos maiores aquíferos do mundo está localizado na América do Sul. Trata-se do Aquífero Guarani, que se estende por uma área aproximada de 1.194.000 km², dos quais 71% no Brasil, 19% na Argentina, 6% no Paraguai e 4% no Uruguai. Apesar de os principais usos e estudos dos recursos do Aquífero Guarani estarem concentrados no Brasil, a importância regional do aquífero fica evidenciada quando se verifica que 25% do território uruguaio e 18% do território paraguaio estão sobre esse reservatório. O Aquífero Guarani ocupa o subsolo do nordeste da Argentina, centro-sudoeste do Brasil, noroeste do Uruguai e sudeste do Paraguai.
  Estima-se que 140 km³/ano de água sejam repostos no Aquífero Guarani. Os pesquisadores indicam que, se fossem utilizados até 30% de toda a água reposta, se chegaria a cerca de 40 km³/ano, quantidade suficiente para abastecer uma população de 20 milhões de habitantes.
  As águas do aquífero são, em geral, de boa qualidade, mas ainda é necessário aprofundar o conhecimento de seu funcionamento para garantir a sustentabilidade de seu uso para as gerações presentes e futuras.
  Esse reservatório de proporções gigantescas de água subterrânea é formado por derrames de basalto ocorridos nos Períodos Triássico, Jurássico e Cretáceo Inferior (entre 200e 132 milhões de anos). É constituído pelos sedimentos arenosos da Formação Piramboia na Base (Formação Buena Vista na Argentina e no Uruguai) e arenitos Botucatu no topo (Missiones no Paraguai, Tacuarembó no Uruguai e na Argentina).
Aquífero Guarani no interior de São Paulo
  A espessura total do aquífero varia de valores superiores a 800 metros até a ausência completa de espessura em áreas internas da bacia.
  Além do Aquífero Guarani, sob a superfície de São Paulo, há outro reservatório, chamado Aquífero Bauru, que se formou mais tarde. Ele é muito menor, mas tem capacidade suficiente para suprir as necessidades de fazendas e pequenas cidades.
Infográfico do Aquífero Guarani no Estado de São Paulo
Aquífero Alter do Chão
  O Aquífero Alter do Chão ou Aquífero Grande Amazônia é uma reserva de água subterrânea localizada sob os estados do Pará, Amapá e Amazonas. Abastece a totalidade da cidade paraense de Santarém e quase a totalidade de Manaus através de poços profundos. É considerado o maior aquífero em volume de água doce do planeta.
  Dados iniciais revelam que sua área é de 437,5 mil km² com espessura de 545 metros. De acordo com estudos de pesquisadores das Universidades Federais do Pará e do Ceará, o aquífero pode ser maior do que o calculado. Possui um volume de 86 mil km³ de água, enquanto o Aquífero Guarani possui um volume de 55 mil km³.
  O Aquífero Alter do Chão recebeu esse nome pelo ponto de estudo do mesmo estar situado nas proximidades da cidade paraense de Alter do Chão, uma cidade turística próxima à Santarém, no Pará.
  Além de possuir mais água que o Guarani, o aquífero Alter do Chão tem maior nível de acessibilidade, sendo mais fácil de se extrair a água e de se recarregar na época de chuvas. Isso ocorre pelo fato de o Alter do Chão está sob uma camada arenosa, o que facilita a sua extração, filtragem e recarga, enquanto que o Guarani está sob uma camada rochosa, o que dificulta a sua extração e recarga.
Localização do Aquífero Alter do Chão
Sistema Aquífero do Arenito Núbio
  O sistema Aquífero do Arenito Núbio é o maior aquífero de água fóssil do mundo, isto é, a maior reserva de água subterrânea não reabastecida por outras fontes. Cobre cerca de dois milhões de quilômetros quadrados e está localizado na parte oriental do Deserto do Saara, entre a Líbia, o Chade, o Egito e o Sudão. Estima-se que esse aquífero contenha cerca de 150.000 km² de água. A origem do Sistema Aquífero do Arenito Núbio é anterior à última Era do Gelo, sem reposição atual.
Localização do Aquífero Arenito Núbia
  Na Líbia, o aquífero, historicamente usado em Trípoli, estava contaminado, e seu grau de salinidade estava aumentando. Em 1983, um grande projeto de engenharia, conhecido como Grande Rio Artificial, foi criado para o abastecimento da região costeira do país e para expandir a agricultura através da irrigação, com aproveitamento da água do aquífero.
  O Grande Rio Artificial da Líbia é uma rede de tubagens que distribui a água retirada de aquíferos fósseis pelo deserto do Saara. Cobre aproximadamente dois milhões de km² na parte oriental do deserto e, é considerado por alguns, como um dos maiores projetos de engenharia já realizado.
Grande Rio Artificial da Líbia
Aquífero Digitalwaterway Vecht
  Localizado na Europa, entre o noroeste da Alemanha e o nordeste da Holanda, o aquífero Digitalwaterway Vechte possui uma área de 7,5 mil km². Compreende a bacia do rio Vecht, onde as paisagens de bosques e matas se alternam e o solo é composto principalmente de areia, cascalho, argila e turfa. A paisagem na região holandesa é essencialmente composta por pôlderes (áreas que foram drenadas artificialmente e protegidas contra inundações pela construção de diques), no qual, devido a altitude ser quase bastante baixa, suas águas são um pouco salobras. Na Alemanha, a paisagem é composta por fazendas bastante produtivas, onde as águas do aquífero são utilizadas para a agricultura e para o abastecimento da população.
Paisagem da região onde fica o aquífero Digitalwaterway Vecht
Aquífero Praded
  O aquífero Praded está localizado entre o nordeste da República Tcheca e o sul da Polônia, possuindo uma área de 3,3 mil km², sendo compartilhada por esses dois países. Nessa área encontram-se muitas nascentes de afluentes dos rios Oder e Vístula, na Polônia, e Morava e Desná, na República Tcheca. No rio Desná encontra-se a Central Hidrelétrica Dlouhe Strane, uma grande usina de armazenamento e que possui a maior turbina de água inversão da Europa.
Central Hidrelétrica Dlouhe Strane
Kalahari-Karoo
  Nas regiões áridas da África do Sul e da Namíbia, há uma grande abundância de água subterrânea de elevada qualidade confinada em áreas sustentadas por dolomitos. O aquífero Kalahari-Karoo possui uma área de 135 mil km² e é compartilhado pela Namíbia, África do Sul e Botsuana. A água desse aquífero é encontrada em grandes profundidades, tornando-se ineficiente e caro para a extração. Além de ser encontrada em grandes profundidades, grande parte dessa água é salobra, com grau de salinidade elevado, tornando-se imprópria para o consumo.
  O aquífero é carregado, em sua grande parte, no território da Namíbia, fluindo em direção à leste, para a África do Sul e Botsuana. Devido a intensa exploração do solo, alguns poços perfurados nesse aquífero apresenta elevado teor de nitrato, tornando-se prejudicial para a saúde humana.
  Apesar dos problemas existentes nesse aquífero, ele é bastante utilizado para a irrigação e para o uso doméstico, sendo a principal fonte de abastecimento de muitas cidades da região onde ele se encontra.
Poço em área do aquífero Kalahari-Karoo, na Namíbia
Grande Bacia Artesiana 
  A Grande Bacia Artesiana possui 1,7 milhão de km², sendo um corpo de água do tamanho do mar Mediterrâneo. O território australiano é formado, em quase toda a sua totalidade, por desertos. Por baixo do ressequido território australiano encontram-se 19 grandes bacias de lençóis freáticos e a Grande Bacia Artesiana ocupa cerca de um quinto de toda a área do país, estendendo-se desde a ponta do cabo York, ao norte, até o lago Eyre, ao sul, armazenando cerca de 8.700 km³ de água.
  A água da Grande Bacia Artesiana não está facilmente acessível. Ela penetra na bacia quando a chuva se infiltra no solo e encharca as camadas aquíferas de arenito. Essas camadas se inclinam para o oeste, deixando o arco do lado leste exposto ao longo da Grande Cordilheira Divisória. A chuva que se infiltra por toda a extensão desse arco penetra lentamente em direção a oeste, percorrendo cerca de apenas 5 metros.
Mapa da Austrália destacando a Grande Bacia Artesiana
Bacia Murray
  A Bacia do Rio Murray, junto com o seu principal afluente, o rio Darling, possui cerca de 3.370 quilômetros de comprimento, drena um sétimo das terras australianas e é, atualmente, a mais importante área agrícola da Austrália.
  O rio Murray nasce nos Alpes Australianos e escoa a parte sudeste do país, desaguando no oceano Índico próximo à cidade de Adelaide, após receber as águas de seus dois principais afluentes, os rios Murrumbidgee e Darling. Apesar de sua dimensão, essa bacia apresenta um fluxo de água fraco devido as baixas precipitações que ocorrem na sua área drenada. Porém, essa bacia forma um grande aquífero com cerca de 297 mil km², suficiente para abastecer grande parte do sudeste do país.
Bacia do Rio Murray
FONTE: Araújo, Regina. Observatório de geografia / Regina Araújo, Ângela Corrêa da Silva, Raul Borges Guimarães - 1. ed. - São Paulo: Moderna, 2009.

Nenhum comentário:

Postar um comentário